Título: Pedido de cassação a caminho
Autor: Tahan, Lilian ; Taffner, Ricardo
Fonte: Correio Braziliense, 05/03/2011, Cidades, p. 23

A deputada federal Jaqueline Roriz (PMN) enfrentará dificuldades para permanecer no cargo. Depois do carnaval, o PSol ingressará no Conselho de Ética da Câmara dos Deputados com denúncia de quebra de decoro contra ela. Além de requerer a abertura do processo de cassação, a legenda pedirá o afastamento imediato da parlamentar da comissão da reforma política. O partido da deputada também se reunirá na próxima semana a fim de definir as medidas cabíveis para o caso.

O presidente regional do PSol, Antônio Carlos de Andrade, o Toninho, considera as imagens gravíssimas e suficientes para a cassação. Para ter validade legal, o processo será assinado pelo deputado Chico Alencar (PSol). No entanto, ele terá de esperar pela formação do Conselho de Ética. Nem todos os partidos indicaram os membros, o que impossibilita o início dos trabalhos. O atual presidente do Conselho, deputado José Carlos Araújo (PDT-BA), acredita que isso pode acontecer na semana seguinte à do carnaval. ¿Queremos reformular o Conselho para que tenhamos novas regras¿, afirma.

Um dos debates sobre a possibilidade de cassação se deve à data da gravação. Jaqueline recebeu o dinheiro de Durval Barbosa na campanha de 2006, quando concorria a uma vaga de deputada distrital, ou seja, quatro anos antes de se lançar à Câmara dos Deputados. ¿Ninguém pode dizer que pode ou não (abrir o processo) antes de analisarmos os fatos e verificarmos como isso se encaixa no regimento interno¿, pondera Araújo. Nesse sentido, o presidente da Casa, deputado Marco Maia (PT-RS), disse que vai pedir as informações sobre as denúncias ao Ministério Público.

Para Toninho do PSol, Jaqueline iniciava a vida política na época do ocorrido e, por isso, deve responder por quebra de decoro. ¿Não sou jurista, mas do ponto de vista político não existe temporalidade para questões éticas. Pouco interessa se foi há seis meses ou há 10 anos, o que não pode é existir uma parlamentar nessa situação¿, diz o ex-candidato ao Governo do DF. A opinião é reforçada pela deputada Erika Kokay (PT-DF). Para a petista, a conquista do mandato na Câmara dos Deputados teve como variável a atuação de Jaqueline como distrital. ¿Existe sustentação para apontar a condição fraudulenta. Agora, cabe a nós analisar os instrumentos para fazer essa investigação¿, afirma.

Por sua vez, o deputado federal Augusto Carvalho (PPS) acredita que o caso merece uma avaliação mais detalhada. ¿Como o fato é pregresso, não sei se ele pode repercutir no atual mandato¿, questiona. Segundo ele, a novidade se deve ao fato de ser a primeira vez que aparece vídeo de alguém ligado ao ex-governador Joaquim Roriz (PSC).

Na avaliação de Erika, a demora na exibição das imagens beneficiou a deputada, uma vez que os outros distritais denunciados tiveram de deixar a carreira política devido às denúncias, por meio de renúncia de mandato ou por cassação. ¿Ela iria sofrer o mesmo que os outros, porque estava na mesma condição. Agora, de forma injustificada, foi poupada de um processo por algum motivo que ainda não foi dito¿, critica Erika Kokay.

Partido Segundo o vice-presidente regional do PMN, Cléber Pires, a legenda não irá compactuar ou encobrir os atos da filiada. O partido ainda não se reuniu para definir o caminho que será dado ao caso de Jaqueline, mas ele acredita que isso deverá acontecer até quinta-feira. ¿A informação é grave e vamos tomar as providências cabíveis para dar uma resposta à sociedade¿, afirma. Ele lembra, ainda, que na campanha de 2006 a filha de Roriz representava a legenda tucana. ¿Todos esses fatos são lamentáveis, mas esperamos que a deputada venha a público para apresentar a explicação¿, comenta Márcio Machado, presidente do PSDB-DF.

Machado afirma que o partido nunca teve conhecimento do repasse de dinheiro e que a saída de Jaqueline do PSDB não teve relação com nenhum caso de irregularidade. Segundo o tucano, a deputada deixou a legenda no início de 2009 a fim de ampliar a base política do pai. Já a distrital Liliane Roriz (PRTB), irmã mais nova de Jaqueline, responsabiliza o cunhado, Manoel Neto, pela negociação com Durval. ¿Tem de perguntar tudo para ele, que levou ela (Jaqueline) lá, pegou o dinheiro e guardou na mochila¿, diz.

Outros representantes do DF no Congresso Nacional lamentam o surgimento do novo vídeo e pedem pelo aprofundamento das investigações. ¿Pensei que essa novela estava no capítulo final. Isso é muito ruim para Brasília¿, diz o deputado Izalci Lucas (PR). ¿Fica claro que ainda não veio tudo à tona. É importante que o Ministério Público e a Polícia Federal finalizem logo toda a apuração¿, afirma o senador Rodrigo Rollemberg (PSB). Para o senador Cristovam Buarque (PDT), até que o processo seja encerrado, os políticos que tiveram algum tipo de contato com Durval viverão sob pressão. ¿Enquanto não se obrigar Durval a mostrar tudo o que tem, muita gente não conseguirá dormir tranquila.¿

Outras ações O PSol é autor de importantes representações contra a família Roriz. Em 2007, o partido entrou com processo por quebra de decoro contra o então senador Joaquim Roriz, que se envolveu no escândalo conhecido como ¿Bezerra de Ouro¿. Na eleição do ano passado, Toninho pediu a impugnação da candidatura do ex-governador para o Palácio do Buriti com base na Lei da Ficha Limpa. Roriz mais uma vez fugiu da disputa e trocou de lugar com a mulher, Weslian Roriz (PSC), derrotada no pleito.

Deputados dos vídeos Leonardo Prudente (sem partido), Eurides Brito (PMDB) e Júnior Brunelli (sem partido) protagonizaram cenas que potencializaram o escândalo de corrupção no DF. Os três saíram da Câmara Legislativa. Prudente e Brunelli renunciaram para escapar do processo de cassação de mandato e Eurides foi cassada.

Eurides Brito (PMDB) » Ficou conhecida como a deputada da bolsa, em alusão ao vídeo gravado por Durval na campanha de 2006, no qual a deputada pega maços de dinheiro e os guarda no acessório. ¿Na minha vida, na minha bolsa, nunca entrou nenhum dinheiro ilegal¿, defendeu-se. Em 22 de junho de 2010, os deputados distritais cassaram, por 16 votos a três, o mandato da colega.

» O então presidente da Câmara Legislativa ficou nacionalmente conhecido com a divulgação de um vídeo em que ele aparecia recebendo e colocando, nas meias, maços de dinheiro de suposta propina paga pelo ex-secretário de Relações Institucionais do GDF.

Júnior Brunelli (sem partido) » Também foi flagrado recebendo dinheiro das mãos de Durval Barbosa. Em um dos vídeos, Brunelli aparece ao lado do ex-presidente da Câmara Legislativa Leonardo Prudente, orando pela vida do ex-secretário e pelo dinheiro entregue por ele. ¿Somos gratos pela vida do Durval, por ter sido instrumento de bênção para nossas vidas, para nossa cidade¿, disse Brunelli.

Distritais poupados » Rôney Nemer (PMDB), Benício Tavares (PMDB), Benedito Domingos (PP), Aylton Gomes (PR) e Rogério Ulysses (PRTB) se livraram de processo por quebra de decoro. Em novembro do ano passado, integrantes da Comissão de Ética da Câmara Legislativa arquivaram as ações contra os parlamentares citados no Inquérito nº 650, que investiga o esquema de corrupção revelado pela Operação da Caixa de Pandora. Com exceção de Rogério Ulysses, que foi expulso do PSB, os outros distritais acusados por Durval de participar dos esquemas ilegais foram reeleitos. Benedito e Rogério respondem à ação de improbidade administrativa e também tiveram os bens bloqueados.

Escândalo nacional Em 27 de novembro de 2009, a Polícia Federal deflagrou a Operação Caixa de Pandora para investigar denúncias de distribuição ilegal de recursos públicos a deputados distritais da base governista. O suposto esquema foi delatado por Durval Barbosa, então secretário de Relações Institucionais do GDF. Ele entregou 30 vídeos com imagens de supostas negociações para recebimento de dinheiro de empresários e posterior pagamento de propina a parlamentares.

As investigações policiais indicaram que o governo tinha uma despesa mensal de R$ 600 mil com repasses aos aliados. De acordo com relatório da PF, divulgado em agosto de 2010, em situações especiais, a quantia seria mais alta. Para votar a favor do Plano Diretor de Ordenamento Territorial (PDOT), por exemplo, os distritais teriam recebido R$ 420 mil. Em um capítulo especial, são mencionados nomes de 10 deputados.

As cenas gravadas por Durval resultaram no afastamento de três parlamentares. O ex-governador José Roberto Arruda (sem partido) e outras quatro pessoas foram presas por tentativa de suborno a um jornalista ligado ao delator. O então governador acabou expulso do partido e cassado do cargo, enquanto o vice, Paulo Octávio (DEM), renunciou ao mandato.

O presidente da Câmara Legislativa à época, Leonardo Prudente (sem partido), foi flagrado colocando maços de dinheiro nos bolsos e nas meias. O colega Júnior Brunelli (sem partido) também apareceu recebendo as notas de Durval.

Por sua vez, Eurides Brito (PMDB) resolveu enfrentar o julgamento dos seus pares. Em vídeo, ela aparece guardando as notas recebidas na bolsa. Ex-secretária de Educação do governo de Joaquim Roriz, Eurides chegou a dizer que teria pego o dinheiro com Durval a mando do ex-governador para pagar dívidas de campanha. No plenário da Câmara Legislativa, Jaqueline Roriz saiu em defesa do pai, chamou a colega de ¿grande cara de pau¿ e disse que a acusação mostrava a falta de caráter da distrital. Eurides acabou cassada, em 22 de junho de 2010. (RT)