Título: Brasil pede à UE 'transferência' de cota Hilton
Autor: Zanatta , Mauro ; Moreira , Assis
Fonte: Valor Econômico, 13/08/2008, Agronegócios, p. B13

O governo brasileiro solicitou à Comissão Européia, braço executivo do bloco comercial de 27 países do continente, a transferência da cota de exportação de carne bovina de alto valor agregado e tarifa menor não utilizada ao longo do ano fiscal europeu 2007/2008, encerrado em 30 de junho passado.

Os frigoríficos nacionais deixaram de exportar no período 2.519 toneladas de cortes nobres pela chamada "Cota Hilton" ao mercado europeu, segundo o Ministério do Desenvolvimento. A cota permite a venda de 5 mil toneladas a preços maiores e com impostos mais baixos. As empresas não conseguiram cumprir a cota em decorrência de restrições impostas pela própria União Européia à carne brasileira.

Dentro da cota Hilton, a carne bovina paga tarifa de apenas 20%. No extra-cota, são 12,8% e outros 3.041 euros por tonelada. Estima-se, no mercado, que os cortes intra-cota obtenham um prêmio de US$ 3 mil por tonelada sobre o produto extra-cota.

Porta-voz da área agrícola da UE disse que o bloco ainda não recebeu pedido formal do Brasil para agregar o que restou da cota 2007/2008 ao atual ano fiscal, mas afirmou que a resposta deve ser negativa, pois a regulamentação européia não prevê essa possibilidade. Autoridades de Brasília chegaram a sondar os europeus, mas foram informadas de que não havia precedente de "carry over" e que a cota só valia para cada ano.

Além disso, a UE rejeitou recentemente uma demanda semelhante da Argentina. O país vizinho tem uma cota Hilton de 28 mil toneladas, mas deixou de exportar 1,8 mil toneladas porque o governo freou as vendas para garantir o abastecimento interno e controlar a inflação. Contudo, a UE já permitiu a prorrogação da cota ao atender, em 2002, justamente um pedido da Argentina depois que os frigoríficos locais foram proibidos de exportar carne para a UE por causa de focos de febre aftosa no país.

Os exportadores do Paraguai, cuja cota soma 1 mil toneladas, também ficaram impedidos de exportar carne bovina por razões sanitárias, mas não tentaram a extensão. O país só conseguiu agora o sinal verde para retomar as vendas ao mercado comunitário.

A cota Hilton é importante para os exportadores de carne bovina porque assegura renda adicional de vários milhões de dólares. As empresas brasileiras deixaram de preencher a cota de cortes nobres por causa das restrições impostas pela UE alegando problemas na rastreabilidade do gado bovino.

O bloco limitou a importação de carne a frigoríficos que comprovassem a aquisição de gado para abate de fazendas auditadas dentro dos padrões de rastreamento adotado pelos europeus. Hoje, apenas 123 propriedades estão autorizadas a fornecer matéria-prima aos frigoríficos que exportam carne bovina à UE.

Nos anos anteriores, o Brasil havia preenchido inteiramente a "Cota Hilton". Nesse último período de 12 meses, entretanto, os exportadores brasileiros utilizaram somente 49,62% da cota, ou 2.481 toneladas, informou o governo. Do total de 27 exportadores com direito a parcelas específicas de embarques à UE, apenas 22 fecharam negócios.

Nenhum deles, porém, usou 100% da cota a que teria direito, afirmou o Ministério do Desenvolvimento. Entre as empresas, houve as que utilizaram 95% de sua cota e frigoríficos que sequer atenderam a 3% da quantidade permitida pela cota.

O atual cenário prejudica todas as empresas exportadoras de carne bovina à UE. Isso porque os frigoríficos habilitados têm inicialmente direito a vender 24 toneladas dentro da cota, mas podem aumentá-la de acordo com a elevação do volume e da performance industriais. Para piorar o quadro, diz fonte de frigorífico, a nova cota do ano fiscal 2008/09, que começou em 1º de julho, ainda não foi liberada.

Criada nos anos 50 em razão da demanda da rede americana de hotéis homônima, a cota beneficia empresas de outros sete países, como Austrália, Nova Zelândia, Argentina, Estados Unidos, Canadá e Uruguai. Os volumes de cada país foram negociados no início dos anos 80 durante a Rodada Uruguai do extinto GATT - hoje Organização Mundial do Comércio (OMC) - sob forma de compensar antigos fornecedores da UE. (Colaborou Alda do Amaral Rocha, de São Paulo)