Título: BC nega haver risco em déficits
Autor: Ribeiro , Alex
Fonte: Valor Econômico, 13/08/2008, Finanças, p. C8

Criticado por assistir inerte à volta dos déficits em conta corrente, o Banco Central divulgou ontem uma edição especial do relatório Focus na qual sustenta que a situação não preocupa. O déficit em conta corrente, afirma a autoridade monetária, está dentro da média histórica brasileira, encontra-se abaixo do apresentado por economias com classificação semelhante de risco pelas agências de "rating" e ajuda a bancar investimentos produtivos, não consumo.

O resultado em conta corrente teve uma virada de US$ 19,810 bilhões entre o primeiro semestre de 2007 e de 2008, passando de um superávit de US$ 2,413 bilhões para um déficit de US$ 17,402 bilhões. A projeção oficial do BC para 2008 é de déficit de US$ 21 bilhões - o primeiro desde 2002-, ou 1,49% do Produto Interno Bruto (PIB). O mercado financeiro projeta déficit de US$ 25 bilhões em 2008 e de US$ 33 bilhões em 2009.

Apesar da volta do déficit em conta corrente, diz o BC, os indicadores de vulnerabilidade externa melhoraram no primeiro semestre, em virtude do aumento das exportações, da redução das amortizações da dívida externa, da estabilidade da despesa com juros, do acúmulo de reservas internacionais e do crescimento da economia. A relação entre o serviço da dívida e as exportações, por exemplo, caiu de 32,4% para 22,5% entre dezembro de 2007 e junho de 2008. No mesmo período, a relação entre serviços da dívida e o PIB caiu de 4% para 2,9%; e a relação entre os juros da dívida passou de 9,5% para 8,7%. A razão entre as reserva internacionais e os serviços da dívida saltou de 3,5 para 5.

O déficit em conta corrente de US$ 21 bilhões projetado pelo BC, que equivale a 1,49% do PIB, está abaixo da média dos resultados entre 1947 a 2007, que é de 1,75% do PIB, algo como US$ 25 bilhões, tomando como base o PIB atual.

O BC argumenta ainda que, comparativamente a economias com classificação de risco semelhante, o déficit em conta corrente é relativamente moderado. No relatório, são listados nove países emergentes com classificação pela Standard & Poor's igual ou pouco superior a do Brasil, que tem nota BBB-. Cinco apresentam déficits em conta corrente igual ou superior ao do Brasil: África do Sul (déficit de 8,8% do PIB), Croácia (-8,6%), Romênia (-8,5%), Hungria (-3,5%), Índia (-1,5%). Quatro têm resultados mais favoráveis: Peru (-1,1%) México (-0,1%), Tailândia (+3,6%) e Rússia (5,9%), este último ajudado por exportações de petróleo.

O relatório também defende a tese de que, hoje, o déficit em conta corrente é sustentável porque financia investimentos. Segundo o BC, a poupança nacional bruta manteve em 17,5%, no período de um ano encerrado no primeiro trimestre. O percentual não é muito diferente do observado em períodos imediatamente anteriores e está dentro da média entre 1947 e 1994 (17,8%) e acima da média de 1995 e 2008 (16,2%).

"Se déficits são acompanhados de redução na poupança nacional bruta, pode-se avaliar que o quadro é de maior dificuldade, pois esses déficits estariam financiando, em especial, o consumo, com custos elevados para o futuro", afirma o relatório. Foi o que ocorreu até 2002, segundo o BC. "De acordo com as estatísticas, o ritmo de crescimento da renda vem sendo semelhante ao do crescimento do consumo, e a expansão do investimento para o crescimento sustentado é financiada principalmente pelo resto do mundo, por meio dos déficits em conta corrente", diz o BC.

O relatório também argumenta que, ao contrário do passado, quando o déficit em conta corrente era financiado por empréstimos, hoje são investimentos diretos e em ações que ajudam a fechar as contas externas. A dívida externa respondia por 61,4% do passivo externo em 2002, percentual que caiu para 20,6% em 2007.