Título: Parte do pré-sal já licitado pode compor capital da Petrobras
Autor: Schüffner, Cláudia
Fonte: Valor Econômico, 14/08/2008, Brasil, p. A14

Antes de tomar uma decisão sobre o modelo de exploração das reservas de petróleo e gás no pré-sal ainda não concedido ou de decidir pela criação de uma nova estatal ou não, o governo terá que tomar posição sobre o bilionário programa de investimentos necessário para desenvolver a produção nas grandes áreas já licitadas do pré-sal na bacia de Santos.

Nas áreas conhecidas como Pão de Açúcar e Tupi existem, na verdade, oito campos descobertos em cinco ou seis blocos leiloados na segunda e terceira rodadas da Agência Nacional do Petróleo (ANP). Dessas áreas participam oito empresas diferentes, sendo que uma parte expressiva ainda está sob domínio da União.

Os blocos foram concedidos sob as regras da Lei do Petróleo (9.478/97) e, ao que tudo indica, existe um único megarreservatório embaixo dessas concessões. Se confirmada a interligação, ela exigira um projeto negociado de exploração (a chamada unitização) entre as empresas com participação acionária nos projetos, com presença importante da União.

Uma alternativa em discussão para não atrasar os investimentos privados na área é integralizar as reservas da União - apenas as que estão nessa parte do pré-sal de Santos - ao capital da Petrobras, aumentando a participação do governo na estatal, que assumiria os investimentos. As reservas fora destas áreas já licitadas e seus anexos (que ainda pertencem à União) seriam exploradas dentro das novas regras que estão em discussão no governo.

Hoje a União tem 32,2% do capital total da companhia mas controla a companhia por meio de 55,7% das ações ordinárias. O BNDESPar, braço do BNDES para o mercado de capitais, tem outros 7,6%, estando o restante pulverizado entre estrangeiros detentores de ADRs na Bolsa de Nova York e outros acionistas privados, incluindo cotistas do FGTS.

No pré-sal brasileiro a discussão da unitização, que já não é fácil, se complica. Além das discussões técnicas inerentes a um ativo estratégico que exige investimentos bilionários, o governo quer mudar o atual regime de concessão para outro, que ora pende para o modelo de partilha da produção, ora parece tender para a prestação de serviços.

A idéia de criação de outra estatal para representar a União no pré-sal, que o mercado apelidou de "PetroSal", já foi lançada. Mas ainda não se sabe quem vai representar a União na discussão da unitização do pólo de Tupi. A simples avaliação dessas reservas - dada a extensão - pode exigir a perfuração de 40 poços a um custo médio de US$ 100 milhões cada.

Como novo "sócio", o governo terá que aportar uma soma bilionária para desenvolver a produção ali. Mas de onde virá o dinheiro? Do Tesouro Nacional? O presidente do (BNDES, Luciano Coutinho, disse recentemente em evento, em São Paulo, que uma das possibilidades de levantar recursos para a exploração do pré-sal é através da da securitização dessas reservas. Para uma fonte ouvida pelo Valor, isso implicaria a assunção de dívidas pelo Tesouro e o conseqüente aumento da dívida pública. E ao bancar investimentos desse calibre, seja por meio do BNDES ou por meio de uma securitização, a União poderia se ver diante de um cenário indesejável.

Além da dívida futura, esses papéis devem ser comprados com "desconto", considerando que ainda não são conhecidas variáveis importantes, como o tamanho das reservas na área, o montante dos investimentos necessários para que os campos entrem em produção e nem o preço futuro do óleo. Hoje, embaixo da terra, cada barril de petróleo abrigado no pré-sal custa entre US$ 5 e US$ 15, segundo cálculos de especialistas.

A definição de como as áreas já licitadas, e que compartilham a mesma reserva, serão exploradas requer pressa, porque os sócios têm prazos a cumprir junto à ANP, que por sua vez tem a prerrogativa de suspender qualquer plano de produção. Alguns desses blocos foram adquiridos em 2000 e outros em 2001, com prazo exploratório de oito anos, o que significa que entre 2008 e 2009 as empresas terão que apresentar a Declaração de Comercialidade ou um plano de avaliação da área, o que implica uma previsão de investimentos aprovados pela ANP. Parte desse prazo foi estendido devido à dificuldade de as empresas alugarem sondas de perfuração, como é o caso da Exxon, mas de qualquer modo, o prazo está se esgotando.

Juntos, esses blocos têm como sócios a Petrobras, BG, Shell, Repsol, Exxon, Hess, Galp (que controla a Petrogal) e a Partex, da Fundação Calouste Gulbenkian, de Portugal. Elas têm participação acionárias diferentes nos blocos onde foram encontrados os prospectos Caramba, Carioca, Bem-te-vi e Guará, e mais além, de Tupi e Iara (a leste de Tupi), ambos encontrados no antigo bloco BM-S-11.

As negociações para individualização da produção na área do pré-sal, que já está em mãos da Petrobras e de empresas privadas estrangeiras, serão arbitradas pela ANP. Qualquer que seja o modelo de produção e a origem dos recursos estatais para que essa riqueza saia debaixo da terra, exigirá um esforço tremendo da indústria de equipamentos, que terá que produzir aços especiais para construção de tubulações e dutos especiais. Uma estimativa do UBS, a única conhecida até agora, é de que serão necessários investimentos de US$ 600 bilhões para produzir petróleo na bacia de Santos ao longo de 30 anos.