Título: Indicação à Anatel provoca bate-boca no Senado
Autor: Ulhôa , Raquel
Fonte: Valor Econômico, 14/08/2008, Brasil, p. A5

O presidente do PSDB, senador Sérgio Guerra (PE), ao apresentar ontem relatório sobre a indicação de Emília Maria da Silva Ribeiro para integrar o Conselho Diretor das Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel), atacou o "intervencionismo" do governo Luiz Inácio Lula da Silva no funcionamento das agências reguladoras e a "politização" das nomeações de dirigentes dessas autarquias. Esses cargos, segundo ele, "tornaram-se porto seguro para acomodar apaniguados políticos".

A nomeação de pessoas sem qualificações teria dado início ao processo de desmonte das agências, que, para o tucano, se transformaram em "braço operacional do Executivo" e em "aparelhos políticos, subjugados a interesses privados circunstanciais e sujeitos e ingerências partidárias".

A polêmica gerada pelo tucano na Comissão de Infra-Estrutura levou ao adiamento da argüição de Emília para reunião a ser marcada. Ela esteve presente durante toda a sessão de ontem. Guerra acusou o Senado de "conivência" com a deterioração das agências, por aprovar as indicações sem questionamentos. Defendeu um "basta", com um profundo exame das qualidades de cada indicado a partir de agora. Para ele, a autonomia das agências está sendo "corroída pela asfixia financeira" pelo Executivo, por meio do contingenciamento de recursos.

Guerra criticou especialmente o fato de o Executivo ter "imposto" à Anatel a revisão do Plano Geral de Outorgas (PGO) de telecomunicações, para possibilitar a compra da Brasil Telecom (BrT) pela Oi (ex-Telemar). "Não nos parece compatível com os princípios constitucionais da moralidade e da impessoalidade alterar as regras com o explícito propósito de acomodar uma situação específica que, não obstante o empecilho regulamentar, prosperou sob as bênçãos das autoridades governamentais", disse.

Se for aprovada para integrar a Anatel, Emília vai participar da decisão sobre a alteração do PGO, que terá conseqüência sobre o modelo da operação entre as empresas de telefonia. As qualidades pessoais de Emília foram elogiadas por Guerra, que, no entanto, considerou o currículo da indicada "não convincente" para a função. Mas seu parecer não foi conclusivo. Disse que ela terá oportunidade de mostrar sua qualificação quando for sabatinada.

O ex-presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL) - um dos responsáveis pela indicação de Emília, junto com o senador José Sarney (PMDB-AP) -, partiu em defesa da assessora do Senado e quase bateu boca com Guerra, abandonando o comportamento discreto que vem adotando desde que sofreu processos na Casa por suposta quebra de decoro parlamentar. Ele não é membro da comissão.

"Vimos aqui uma coisa inusitada. Em vez de sabatinarmos a indicada, vamos sabatinar a fusão (BrT e Oi)", disse Renan, que acusou o tucano de "politizar" e "partidarizar" a sabatina. Lamentou a "exposição" de Emília, definida por ele como "qualificada, honrada e competente", lembrando que ela integra o Conselho Consultivo da Anatel. Ele entendeu que Guerra estava cobrando a posição de Emília sobre a operação da BrT e Oi e considerou esta posição um "precedente perigoso".

O presidente do PSDB reagiu dizendo que Renan estava equivocado. Negou que sua intenção fosse discutir a fusão das empresas de telefonia. "Não quero saber se Emília é a favor ou contra. Não quero entrar no mérito da fusão. O que eu disse é que tem um sistema de agências reguladoras que está sendo bombardeado e precisamos começar a analisar com profundidade as indicações", afirmou Guerra.

No começo de sua fala, disse que no início de julho - tão logo recebeu do presidente da comissão, Marconi Perillo (PSDB-GO), a tarefa de relatar a indicação de Emília - foi "constrangido" por setores da Casa a apresentar seu relatório imediatamente. Constatou que a pressa se devia à necessidade de recompor o Conselho Diretor da Anatel para "uma de suas mais importantes decisões em toda sua história": a revisão do PGO.

"Anunciada com grande alarde na imprensa, a operação (fusão da Telemar/Oi e Brasil Telecom) não pode ser concretizada mantidas as regras atuais. A necessidade de dar uma solução rápida para a questão é ainda certamente reforçada pela milionária multa contratual a ser paga por uma das partes à outra, caso o negócio não se concretize dentro do prazo ajustado", afirmou, sem citar valores.

Guerra contou ter se negado a terminar o relatório de forma apressada, por considerar necessário analisar bem a situação das agências reguladoras no país. Afirmou que o PSDB, que deflagrou o processo de privatização das estatais na gestão de Fernando Henrique Cardoso, tem responsabilidade com o fortalecimento das agências, criadas como instrumento de Estado e não de governo, para proteger os interesses da sociedade.

No governo atual, segundo ele, a orientação é minar o sistema de regulação herdado da gestão passada e ressuscitar o modelo intervencionista. A direção de cada uma das dez agências foi sendo instrumentalizadas e elas foram tendo cada vez mais perfil político-partidário.