Título: R$ 1,67 bi para mortos
Autor: Jeronimo, Josie
Fonte: Correio Braziliense, 04/03/2011, Política, p. 3

Segundo o TCU, esse foi o prejuízo da Previdência em 2010 com benefícios pagos a pessoas já falecidas. Para mudar o cenário, governo exigirá recadastramento de 28 milhões

O imenso vazamento de recursos públicos para fins indevidos tem ¿goteiras¿ significativas no grande contingente de aposentados e pensionistas do país. Um levantamento realizado pelo Tribunal de Contas da União (TCU) identificou que, ano passado, o Ministério da Previdência depositou R$ 1,67 bilhão em contas bancárias de pessoas já falecidas.

O próprio governo reconhece o problema. Na tentativa de evitar que o prejuízo bilionário se repita indefinidamente, a pasta publicou ontem resolução que regulamenta o processo de validação das contas bancárias em que o Instituto Nacional de Seguro Social (INSS) paga aposentadorias e pensões. A partir da data de publicação da resolução (ontem), as instituições bancárias terão seis meses para iniciar mutirão de recadastramento de senha e comprovação de vida de 28 milhões de beneficiários do INSS.

A resolução determina que os beneficiários renovem a senha e sejam atendidos presencialmente por funcionários do banco onde recebem para que a conta seja validada. Mas, para não repetir a polêmica de 2003, quando o Ministério da Previdência condicionou o pagamento dos benefícios de pessoas com mais de 90 anos ao recadastramento presencial, procuradores legais dos idosos que alegarem impossibilidade física de comparecer às agências poderão agendar visita domiciliar de funcionário do INSS. Se o instituto não tiver pessoal suficiente ou demorar para atender o aposentado com problemas de deslocamento, o benefício será mantido até a visita de servidor do instituto.

O presidente da Confederação Brasileira de Aposentados e Pensionistas (Cobap), Warley Martins, reclama da resolução e afirma que, do montante de 28 milhões de beneficiados que deverão passar pelo recadastramento, 2% passaram dos 85 anos. Assim, na prática, muitos idosos terão de sofrer o desconforto de enfrentar filas de banco para continuar recebendo o benefício. ¿É igual ao que o Ricardo Berzoini quis fazer¿, afirmou o presidente da Cobap. ¿Tudo o que é de ruim acontece com os aposentados. Ainda vem mais essa de querer que o aposentado vá ao banco se recadastrar. Nem todo mundo tem procuração para receber para os pais. Já que o INSS quer fazer recadastramento, porque eles não vão à casa dos aposentados?¿, questiona.

Cruzamento O diretor adjunto de serviços da Federação Brasileira de Bancos (Febraban), Walter Tadeu Pinto de Faria, explica que as instituições bancárias terão 180 dias para se adequar às normas editadas pela resolução da Previdência. De acordo com o diretor, atualmente os bancos realizam processo de recadastramento de senha de 15 milhões de aposentados e pensionistas que utilizam cartão magnético para sacar o benefício. A validação da senha, no entanto, ainda é feita pelos caixas eletrônicos. Agora, os bancos terão de fazer a verificação presencial ou por métodos biométricos. Treze milhões de beneficiários recebem por crédito em conta e não são correntistas. ¿Os bancos vão ter que ter alguém para atender essas pessoas e fazer a validação da conta. Isso está previsto em cláusula contratual com o INSS. Os bancos terão 180 dias para se adaptar¿, disse Faria.

A medida do INSS responsabiliza os bancos por pagamentos irregulares. De acordo com a assessoria do Ministério da Previdência, o banco terá que repassar os dados dos beneficiários recadastrados para que o instituto cruze informações com sistemas que registram falecimentos. Se o INSS pagar indevidamente benefícios a pessoas mortas, o banco terá que ressarcir a Previdência. Os aposentados e pensionistas deverão fazer o recadastramento uma vez por ano.

Corrida às agências Em 2003, o Ministério da Previdência levou milhares de aposentados às filas das agências do Instituto Nacional de Seguro Social (INSS). Ricardo Berzoini, comandante da pasta à época, determinou a atualização presencial dos dados dos aposentados com mais de 90 anos que recebiam o benefício há mais de 30 anos. Após o bloqueio das contas de 105 mil contribuintes, os idosos promoveram corrida às agências e formaram longas filas para o recadastramento.

Viagens a preços inflados Edson Luiz Um estudo feito pelo governo no ano passado mostrou que o Executivo poderia reduzir substancialmente os gastos com passagens aéreas sem a necessidade de fazer cortes extremos na quantidade de viagens. A pesquisa demonstra que alguns órgãos da administração pública chegaram a gastar até R$ 500 a mais por bilhete por não adotar medidas simples, como marcar voos com antecedência ou escolher horários com tarifas mais baratas.

O estudo do governo foi feito a partir de dados de 16 órgãos públicos cadastrados no Sistema de Concessão de Diárias e Passagens (SCDP) da Controladoria-Geral da União (CGU). Foram escolhidos para a análise os trechos Brasília-Rio de Janeiro e Brasília-São Paulo, os mais usados por servidores que viajam a trabalho. Na primeira rota, o valor médio nacional das tarifas é de R$ 309, mas os preços pagos por alguns ministérios foram bem acima do normal. Um deles ¿ não identificado pela CGU ¿ realizou 124 viagens ao custo de R$ 464,27, ou R$ 155 a mais que a quantia média paga por um embarque feito às 19h30 no Aeroporto do Distrito Federal.

No levantamento, outro órgão do governo federal pesquisado realizou 614 viagens a valores menores, mas ainda assim R$ 60 acima da média nacional. No ranking, os valores oscilaram, mas nunca chegaram aos R$ 309 que um passageiro comum costuma pagar quando faz as reservas com antecedência. O estudo também mostrou que é possível gastar menos para viajar de Brasília para o Rio de Janeiro, como fizeram vários órgãos cadastrados no sistema, que chegaram a economizar até R$ 200 em relação aos valores mais altos.

Bilhetes No trecho Brasília-São Paulo, o sistema observou que no primeiro semestre do ano passado, um órgão do governo realizou 109 viagens e gastou R$ 39,2 mil. Em alguns casos, o bilhete mais caro chegou a custar R$ 627, enquanto o mais barato ficou em R$ 159, média de R$ 359. Mesmo assim, as passagens tiveram média 14,5% maior que a média nacional, que é de R$ 314. Caso fossem adotadas medidas de controle e gestão e não houvesse a variação nos preços, a União economizaria R$ 5 mil no mesmo período. Segundo o ministro-chefe da CGU, Jorge Hage, as distorções aparecem nos cruzamentos feitos pelo Observatório das Despesas Públicas.