Título: Elogios na posse de Luiz Fux
Autor: Mariz, Renata , Abreu, Diego
Fonte: Correio Braziliense, 04/03/2011, Política, p. 6

Autoridades e demais ministros do Supremo destacam as qualidades técnicas do novo magistrado da mais alta Corte do país

Em uma solenidade que durou menos de 15 minutos, prestigiada por convidados que lotaram o plenário e os salões do Supremo Tribunal Federal (STF), Luiz Fux, 57 anos, tomou posse ontem à tarde no cargo de ministro da mais importante Corte do país. Escolhido pela presidente Dilma Rousseff, Fux assumiu a cadeira deixada em agosto por Eros Grau, que se aposentou. Magistrado de carreira, o carioca Luiz Fux disse estar ¿tranquilo e pronto para decidir¿ casos polêmicos, depois de perguntado se sente alguma pressão por ter a missão de desempatar os processos que tratam da validade da Lei da Ficha Limpa para as eleições do ano passado.

¿Para mim, não tem problema nenhum. Trabalho há 35 anos nessa atividade de julgar¿, disse o novo ministro. Em ocasiões anteriores, Fux já havia falado sobre a lei, classificando-a como ¿um avanço em prol da moralidade¿. Ele, porém, disse que estudaria cada aspecto da norma antes de tomar uma posição quanto a sua validade.

Por volta das 16h30, Fux foi conduzido ao plenário pelos ministros Dias Toffoli, até então o mais recente do Supremo, e Celso de Mello, o decano, e recebeu muitos aplausos antes de prestar o compromisso. Depois, passou mais de uma hora recebendo os cumprimentos dos convidados, durante o coquetel oferecido por entidades jurídicas no edifício-sede do STF.

Alguns convidados repetiram a rapidez da cerimônia na hora de cumprimentar o novo ministro. Uma das primeiras autoridades a sair do evento, Marco Maia (PT-RS), presidente da Câmara dos Deputados, ressaltou como ¿um dos temas mais importantes na pauta do Supremo¿ o processo que definirá de quem é o direito à vaga dos parlamentares licenciados ¿ se do suplente do partido ou da coligação. ¿É um assunto que tem impacto direto na Câmara¿, afirmou. Quanto ao novo ministro, Maia desejou boas-vindas. ¿Espero que ele tenha um mandato de êxito e que possa contribuir para o crescimento e o desenvolvimento do país.¿

O ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, mencionou as qualidades técnicas de Fux, a quem chamou de ¿grande juiz¿. ¿Acho que ele é o ministro que, com os demais, exercerá o papel que esperamos do Judiciário¿, afirmou. Apesar de esbanjar nos elogios, Cardozo foi econômico ao responder como espera que o novo ministro julgue o processo de extradição do ex-ativista italiano Cesare Battisti ¿ um dos assuntos mais espinhosos enfrentados por sua pasta nos últimos tempos. ¿Vamos aguardar o julgamento¿, limitou-se a responder Cardozo.

Especialista Filho de um romeno naturalizado brasileiro, Luiz Fux é um dos grandes especialistas em processo civil do país e autor de 20 obras. Judeu, casado e pai de dois filhos, ele iniciou a carreira em 1976, como advogado da Shell Brasil, no mesmo ano em que se graduou em direito pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), onde atualmente é professor. Fux foi promotor de Justiça no Rio, magistrado da Justiça fluminense e ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ).

EROS GRAU SE DESPEDE DOS EX-FUNCIONÁRIOS O ministro Eros Grau, que se aposentou em agosto abrindo a vaga para a qual Luiz Fux foi indicado, fez questão de cumprimentar, do lado de fora do cercado reservado a convidados da cerimônia de posse, os antigos funcionários de seu gabinete. Ele abraçou cada um dos cerca de 20 servidores que o acompanharam ao longo dos últimos seis anos. Em tom de brincadeira, chamou um deles de ¿grande cafajeste¿, arrancando risos dos demais. Insistiu para que não perdessem o contato e cogitou levar alguns deles para seu escritório, em São Paulo. ¿É bom ver vocês, todo mundo com a cara boa¿, disse, rodeado pelos ex-subordinados. Ao voltar para a área reservada do coquetel da posse, Eros estava visivelmente emocionado. (DA)

Polêmicas históricas Marcelo da Fonseca Na história do STF há várias decisões polêmicas, que chamaram atenção da sociedade brasileira e até da comunidade internacional. O fim do banimento da família real portuguesa do território nacional, determinado pela Constituição de 1889, por exemplo, foi julgado pela Casa em 1903, assim como a extradição de Olga Benário para a Alemanha nazista, em 1936.

Até mesmo questões relacionadas à Segunda Guerra Mundial chegaram ao principal órgão do Judiciário brasileiro. Em 1967, os ministros do STF decidiram o futuro de Franz Paul Stangl, servidor da Polícia Judiciária alemã e integrante do Partido Nazista, que se mudou para São Paulo após o fim do conflito. O alemão tinha o nome na lista internacional dos criminosos de guerra e foi acusado de delitos nos campos de concentração da Áustria e da Polônia. O pedido de extradição foi enviado ao Supremo pela Polônia, que reivindicava ao governo brasileiro a extradição de Franz. Mas o pedido foi indeferido e o acusado foi entregue à Alemanha.

Em decisões mais recentes, coube também ao STF decidir temas controversos, como o pedido do ex-presidente Fernando Collor de Mello para anular a resolução do Senado que o considerou inabilitado para exercer função política por oito anos. A defesa de Collor alegou que, como ele tinha renunciado à Presidência, o processo de impeachment deveria ser extinto. Por maioria de votos, o pedido foi negado e o ex-presidente só conseguiu voltar à vida pública há quatro anos, e hoje é senador.

O Supremo foi criado em 1828, depois que a Constituição de 1824 determinou a formação de um órgão, então chamado Supremo Tribunal de Justiça, que seria composto por juízes letrados para atuar em território nacional nas questões de caráter judiciário. A Casa começou a funcionar em 9 de janeiro de 1829, com 17 integrantes no quadro oficial. O nome atual só foi adotado em 1891. O número de ministros foi reduzido para 15. Em 1930, a Corte chegou à formatação atual, com 11 ministros.

Fichas sujas ansiosos com julgamento Ivan Iunes

A posse de Luiz Fux no STF foi acompanhada de perto por 12 políticos em especial. Eles têm o futuro atrelado diretamente ao voto decisivo do magistrado no julgamento que definirá o início da validade da Lei da Ficha Limpa. Seis deles perderam o mandato de senador ou deputado federal conquistado nas urnas por conta da legislação. Os demais herdaram esses postos e aguardam o posicionamento do novo ministro para saberem se permanecem ou não no Congresso. Os parlamentares afastados representam 3,4 milhões de votos nas últimas eleições, que acabaram invalidados pela regra.

Desde que foi escolhido pela presidente Dilma Rousseff para suceder Eros Grau, aposentado em meados do ano passado, Fux jamais se pronunciou oficialmente sobre qual posicionamento tomará no caso. Nos bastidores, ele teria indicado a juízes próximos que a Lei da Ficha Limpa não seria retroativa e só poderia valer para as eleições municipais de 2012. Caso o entendimento seja confirmado, a decisão custaria os mandatos dos senadores Wilson Santiago (PMDB-PB), Marinor Britto (PSol-PA), Vicentinho Alves (PR-TO) e Gilvam Borges (PMDB-AP), além dos deputados federais Odacir Zonta (PP-SC) e Professora Marcivânia (PT-AP).

No Senado, as vagas ficariam com Jader Barbalho (PMDB-PA), Cássio Cunha Lima (PSDB-PB), Marcelo Miranda (PMDB-TO) e João Capiberibe (PSB-AP). Na Câmara, Janete Capiberibe (PSB-AP) e João Pizzolatti (PP-SC) garantiriam assento. Todos foram declarados inelegíveis em 2010 devido à renúncia ao mandato ou por terem sido condenados por órgão colegiado.

No julgamento sobre a aplicabilidade da Lei da Ficha Limpa às vésperas da eleição de outubro passado, os 10 ministros do STF se dividiram em relação à validade imediata da lei. A solução para o caso sairá, provavelmente, no julgamento de Janete Capiberibe, o primeiro na fila de 14 processos sobre o tema. ¿Eu me chamo João Capiberibe e quem está ocupando minha vaga no Senado é um cidadão chamado Gilvam Borges. A Constituição não permite que uma lei seja promulgada e entre em vigor no mesmo ano¿, defende Capiberibe. Ele e a mulher, Janete, foram considerados inelegíveis por terem sido cassados por compra de votos nas eleições de 2002, mas alegam terem provas de que testemunhas do caso foram subornadas por Gilvam Borges.

Para o Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral (MCCE), responsável por reunir a assinatura de 1,6 milhão de eleitores a favor da aprovação da Lei da Ficha Limpa, a posse de Fux permitirá à Justiça dar fim à insegurança jurídica que pautou as eleições de 2010. ¿Esperamos que Fux não frustre toda a esperança colocada pela sociedade no projeto da Ficha Limpa¿, diz a diretora da entidade, Jovita Rosa.

Impasse A Lei da Ficha Limpa foi sancionada em 4 de junho de 2010. A proposta tornou inelegíveis por oito anos pessoas condenadas por órgão colegiado em crimes graves ou que renunciaram a cargos eletivos para escapar de processos de cassação. O impasse jurídico, no entanto, ocorreu em outubro, na definição do início da validade da norma. Cinco ministros entenderam que a lei deveria entrar em vigor em 2010 (Carlos Ayres Britto, Joaquim Barbosa, Ricardo Lewandowski, Cármen Lúcia e Ellen Gracie), enquanto os demais definiram o pleito de 2012 como início da aplicabilidade da regra (Gilmar Mendes, Dias Toffoli, Cezar Peluso, Celso de Mello e Marco Aurélio Mello).