Título: Fazenda vai permitir negociação de dívida de grandes devedores
Autor: Galvão, Arnaldo
Fonte: Valor Econômico, 21/08/2008, Brasil, p. A2

Antônio Cruz / ABr Guido Mantega, ministro da Fazenda: governo acumula dívida ativa de R$ 1,3 trilhão, praticamente metade do PIB O governo mantém, até agora, a polêmica proposta que autoriza os procuradores da Fazenda Nacional a realizarem, ainda na fase administrativa das cobranças de tributos federais, penhoras de bens dos devedores. Na terça-feira, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, levou aos líderes dos partidos da base aliada uma apresentação com as principais alterações das normas da execução fiscal e parte do Código Tributário Nacional.

Ontem, Mantega reuniu-se com o presidente da Câmara, Arlindo Chinaglia (PT-SP), para colocar-se à disposição dos parlamentares e, dessa maneira, esclarecer dúvidas sobre esse pacote integrado por quatro projetos de lei e uma medida provisória (MP) que vai anistiar, sob algumas condições, débitos de até R$ 10 mil. Ele sabe que a resistência à penhora administrativa, no Congresso, será muito forte.

Durante entrevista depois da reunião com Chinaglia, Mantega procurou ressaltar os principais pontos do pacote, mas não tocou na polêmica penhora administrativa. Disse que pediu apoio do presidente da Câmara para a tramitação e aprovação de três projetos de especial interesse do governo: reforma tributária, criação do fundo soberano e limite de crescimento das despesas de pessoal da União.

No pacote que o Executivo mandará ao Congresso, um dos objetivos é dar mais velocidade às cobranças de tributos e a penhora administrativa contribui para essa maior rapidez. Atualmente, segundo o ministro, a média de duração desses processos na Justiça é de 15 anos porque "há vários instrumentos protelatórios". O governo quer encurtar alguns prazos, mas Mantega reconhece que há grandes contribuintes que têm "dívida de boa fé". Ele garante que os fraudadores continuarão sendo "implacavelmente cobrados" e ninguém pode dizer que a Receita não é bastante severa com isso.

Outro ponto inovador do pacote é a possibilidade de o valor da dívida ser negociado. Mudando a lei para que seja possível a transação, a proposta é criar uma comissão acompanhada por procuradores que vai discutir com o devedor o valor que pode ser pago de acordo com suas condições econômicas. "Ele vai dizer que não pode pagar 30, mas pode pagar 15, 17 e em que condições. Grandes devedores com dívida inscrita poderão pagar essas dívidas. Para nós, não interessa ter dívida inscrita e pendurada. Interessa que o devedor possa pagá-la", afirmou.

Na avaliação do ministro da Fazenda, a anistia não significa prêmio aos inadimplentes. Ele argumenta que o governo federal acumula dívida ativa de R$ 1,3 trilhão, praticamente metade do Produto Interno Bruto (PIB) e admite que boa parte dela é "ilusória", "não existe". "Os pequenos devedores são os que, no passado, deixaram de pagar algum tributo, por razão até justificável, e essa dívida com multa, juros e correção fica impagável", explicou.

A MP, que ainda não foi publicada, vai anistiar esses pequenos devedores, mas estabelece que a dívida tem de estar consolidada há cinco anos. "Não são dívidas prescritas, estão ativas. Queremos limpar essas fichas sujas de modo que o cidadão passe a ter todos seus direitos, como, por exemplo, crédito e atividade econômica", defendeu. O governo calcula que vai beneficiar dois milhões de contribuintes e, nas palavras de Mantega, "não adianta fingir que há um crédito se não vamos recebê-lo".

Além da reforma da lei de execução fiscal, o ministro da Fazenda também defendeu, na Câmara, o projeto que limita o aumento dos gastos da União com pessoal. A tramitação, segundo ele, já dura um ano e meio, mas é de grande importância para o equilíbrio das contas públicas. "Define que o aumento da despesa com pessoal se dará em ritmo menor que o do crescimento do PIB. Isso não significa o fim de aumentos e reajustes", argumentou.

Mantega também negou, timidamente, uma medida de aumento do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) para o leasing. Disse que esse imposto é regulatório e poderá ser aumentado ou diminuído "a qualquer momento". "Assim como aumentamos para o crédito pessoal no início deste ano, quando acreditávamos que ele estava crescendo de forma acelerada, podemos até retirá-lo ou colocá-lo em outros ativos. Neste momento, não há nenhuma medida nesse sentido", comentou.