Título: Indústria produz mais e breca alta das importações
Autor: Landim, Raquel; Bouças, Cibelle
Fonte: Valor Econômico, 22/08/2008, Brasil, p. A3
A indústria brasileira incrementou sua capacidade de atender à expansão da demanda doméstica e permitiu uma estabilização no ritmo de crescimento das importações. Os analistas avaliam que a maturação de investimentos é uma das explicações para essa mudança. Com a alta da inflação e da taxa de juros, a tendência agora é de acomodação das compras externas e da produção industrial.
No último ano, o ritmo da produção da indústria da transformação acelerou significativamente, de 3,9% no acumulado de 12 meses até junho de 2007 para 6,7% em comparação aos 12 meses acumulados até junho deste ano, conforme o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). No mesmo período, a alta da quantidade importada de bens intermediários oscilou próxima a 20%, de acordo com dados da Fundação Centro de Estudos de Comércio Exterior (Funcex).
A necessidade adicional das empresas por insumos e matérias-primas foi suprida pela produção nacional de bens intermediários, cujo crescimento subiu de 3,3% no acumulado de 12 meses até junho de 2007 para 5,4% na mesma comparação até junho de 2008. "A retomada do investimento em anos recentes contribui de forma significativa para a expansão da produção", disse David Kupfer, coordenador do Grupo de Indústria e Competitividade do Instituto de Economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Um dos indicativos de que houve maturação dos investimentos foi a melhora no nível de utilização da capacidade instalada para níveis mais "comportados".
Para Fernando Ribeiro, economista da Funcex, as importações reagiram mais rapidamente que a produção em meados de 2007, quando a demanda voltou a crescer com vigor. Na época, o ritmo de expansão das compras externas superava em até cinco vezes a produção industrial . "As empresas recorreram à importação para responder a um problema imediato", disse, ressaltando que o câmbio valorizado ajudou. Ele acredita que o "descolamento" chegou ao fim e as importações voltaram a aumentar de três a quatro vezes mais que a produção nacional - o que é o padrão brasileiro na última década.
Os economistas do departamento econômico do Bradesco ressaltaram que o ritmo de crescimento das importações voltou a se estabilizar nos últimos meses, após um pequeno "susto" no início deste ano, quando chegou a subir quase 24% em fevereiro por fatores pontuais, como importação de óleo diesel para as usinas termelétricas e antecipação de compra de fertilizantes pelos agricultores. Em junho e julho, a quantidade total importada pelo país cresceu 22,8%. Para o Bradesco, é um sinal de que a atividade econômica segue forte, mas parou de acelerar.
Lia Valls, coordenadora de projetos do Centro de Estudos do Setor Externo da Fundação Getúlio Vargas (Cesex-Ibre/FGV), também considera a acomodação das importações um dos sinais de que a economia brasileira vai crescer a ritmo menos intenso daqui para frente. "O cenário internacional é incerto, os empresários estão mais cautelosos em investir, em fazer abertura de capital na bolsa e também em importar", afirma.
De acordo com a economista, o real forte e a expressiva alta nos preços das commodities no segundo trimestre do ano contribuíram para tornar os importados menos atrativos enquanto substitutos da produção doméstica. "O câmbio continua valorizado, mas as expectativas futuras de que haverá alguma depreciação do real frente ao dólar desestimulam uma aceleração da taxa de crescimento das importações", concordou Kupfer.
O professor da Escola de Economia de São Paulo da Fundação Getúlio Vargas (EESP) Rogério Mori, considera que a economia brasileira está se estabilizando em um ritmo de expansão ainda relativamente forte, traduzido pelas expectativas para o ano de crescimento na produção industrial e no varejo em um patamar pouco inferior ao alcançado em 2007, de 6% e 9,9%, respectivamente. "Não há um quadro tão conclusivo de acomodação econômica", disse.
De acordo com o IBGE, a produção industrial no segundo trimestre teve crescimento de 1,3% sobre os primeiros três meses do ano, na série com ajuste sazonal. O ganho marginal foi inferior ao obtido no primeiro trimestre, de 3,1%. O mesmo ocorreu na indústria de bens intermediários, que registrou incrementos de 0,6% no segundo trimestre e 1,4% no primeiro, utilizando a mesma base de comparação.
Os economistas chamam a atenção para o fato de que a explosão no valor das importações brasileiras é resultado da evolução dos preços dos produtos e não das quantidades. "O que está surpreendendo nas importações é o preço", ressaltou Ribeiro, da Funcex. No acumulado de 12 meses até julho de 2007, os preços dos produtos importados pelo país subiam 5,1%. Em julho deste ano, o ritmo mais do que triplicou e chegou a 18,6%. Essa evolução foi provocada pela alta das commodities, que também atinge as importações.
É a alta dos preços que justifica o forte crescimento no valor das importações, que quase duplicou. No acumulado de 12 meses até julho, a receita gasta com importações crescia 26,8%. Na mesma comparação em julho deste ano, esse percentual chegou a 46%. A taxa de expansão da quantidade importada oscilou entre 20,6% e 22,8% no período.
Para Mori, a queda recente nos preços de petróleo e fertilizantes pode trazer melhora aos resultados da balança comercial brasileira. "Se essa dinâmica perseverar, o país pode ter também um resultado de contas externas melhor do que o esperado, podendo superar as previsões do Banco Central", afirmou o economista.