Título: Mercado terá novo Plano Diretor
Autor: Valenti, Graziella
Fonte: Valor Econômico, 21/08/2008, Eu & Investimento, p. D1

No próximo dia 19 de setembro, deverá ser aprovada a nova versão do Plano Diretor para o mercado de capitais brasileiro. O projeto de atualização do plano, desenvolvido pela primeira vez em 2002, vem sendo feito desde o fim de junho deste ano. A compilação das propostas discutidas será apresenta ao Comitê Executivo, colegiado que reúne as 18 entidades que trabalham na formulação das propostas para o futuro do mercado nacional.

"No começo do ano, constatamos que o plano anterior já havia atingido boa parte de seus objetivos e que era necessário atualizar a discussão", contou Carlos Rocca, coordenador do Comitê Técnico do Plano Diretor e dos trabalhos de revisão.

Como na versão anterior, há oito temas centrais de debate, sobre os quais serão calcadas as propostas de ação. Os assuntos vão de questões relativas ao ambiente macroeconômico a temas mais pontuais, específicos do mercado de capitais.

O primeiro item diz respeito à governança e à proteção dos investidores. A pauta atualizada visa buscar meios de acelerar a migração das companhias já listadas na Bovespa para o Novo Mercado. "A sustentabilidade do avanço nesse assunto passa por isso. O que se percebe é que as maiores e mais significativas empresas da economia ainda não aderiram", enfatizou Rocca.

Quando foi criado a primeira versão do Plano Diretor, o mercado nacional era incipiente e o país enfrentava um acúmulo de fechamentos de capital e baixíssima liquidez no pregão.

Passados seis anos, não se questiona o sucesso do Novo Mercado. Mas, apesar da melhoria incontestável, é fato que a adesão das grandes companhias nacionais foi pequena. Atualmente, o espaço tido como de excelência em governança no país conta com 103 empresas. Dessas, apenas 19 já eram abertas e decidiram aderir às chamadas "melhores práticas". Todas as demais são companhias que abriram capital recentemente, já no segmento especial.

O Índice Bovespa, principal indicador do mercado acionário e referência para boa parte da indústria de fundos, tem 16 empresas do Novo Mercado, de um total de 57, cujas ações têm peso 15,5% da composição total. Das 15 maiores companhias abertas em valor de mercado, apenas duas pertencem ao espaço diferenciado da Bovespa - Banco do Brasil e Redecard.

Alexandre Di Miceli, professor da Faculdade de Economia e Administração da Universidade de São Paulo (FEA-USP) e coordenador do Centro de Estudos em Governança Corporativa (CEG) disse que o debate sobre o novo plano carece de diretrizes específicas sobre as ações a serem tomadas. "Há muitas idéias, mas poucas medidas concretas previstas." Por isso, para a versão definitiva, defende a clareza e objetividade dos propósitos.

Para ele, que participa das discussão de revisão, para que haja incentivo à migração das companhias ao Novo Mercado é preciso estabelecer vantagens efetivas. Ele defende a adoção iniciativas práticas como taxas de juros mais atrativas praticas pelos bancos públicos para as empresas que aderirem às boas práticas, aplicação das diretrizes dos fundos de pensão de focar a aplicação em renda variável em empresas do Novo Mercado e do Nível 2 e uso de parâmetros de governança pelos analistas para as recomendações de investimento.

Gilberto Mifano, presidente do conselho de administração da BM&F Bovespa, acredita que no futuro as grandes companhias virão. Para ele, é natural a demora. "Elas têm sua própria grife."

Quando foi criada a primeira versão do Plano Diretor, o país ainda debatia sua situação macroeconômica. Apesar da estabilidade conquista, o Brasil ainda estava distante da obtenção do grau de investimento. Por isso, a elevada taxa de juros da época era um dos temas da versão anterior, junto com a reforma tributária e incidência da extinta CPMF sobre os negócios com ações. O crescimento econômico e o diagnóstico dos problemas do mercado local eram dois outros itens. Com as evoluções, questões como a mobilização de novos recursos para ações deixaram de ser centrais, especialmente após a nota de risco obtida pelo Brasil em maio deste ano.

"O Plano Diretor foi muito importante naquele momento para organizar as discussões e as reivindicações da iniciativa privada para o mercado, especialmente, aquelas que envolviam governo", destaca Mifano, da BM&F Bovespa.

Alguns assuntos, porém, permanecem entre as preocupações das entidades privadas como o desenvolvimento de novos produtos e a liquidez do mercado secundário, especialmente de títulos de dívida e de securitização. Nesse item, o debate sobre securitização de recebíveis imobiliários e o setor de habitação terão destaque especial.

"Temos lições a tirar do que aconteceu nos Estados Unidos e muito a crescer nesse tema", afirmou Rocca, referindo-se à crise dos títulos hipotecários de maior risco.

Na atualização das discussões, ganhou relevância o incentivo ao crescimento e atuação dos fundos de investimento em participações . "O empreendedorismo deve ser a atividade prioritária deste país", defende Thomas Tosta de Sá, coordenador do Comitê Executivo. A expansão da atividade desses fundos resulta, no futuro, em aumento da quantidade e variedade de companhias listadas na bolsa.

Mais um tema adicionado à pauta do plano é auto-regulação. De acordo com Rocca, o objetivo é deixar claro o papel dos reguladores e dos auto-reguladores, para que o avanço seja constante. O debate é oportuno pela extensão de seu desenvolvimento nos últimos anos. A Comissão de Valores Mobiliários (CVM) assinou ontem um convênio com a Associação Nacional dos Bancos de Investimentos (Anbid) para que a associação agilize a avaliação dos registros de ofertas de valores mobiliários.