Título: Editoras de obras técnicas disputam universidades
Autor:
Fonte: Valor Econômico, 25/08/2008, Empresas, p. B1

Apesar de ser disparado o maior comprador de livros no Brasil, o governo não é mais o único a despertar a atenção das editoras. As três maiores universidades privadas do país - Anhanguera, Estácio de Sá e Universidade Paulista (Unip), com destaque para as que abriram capital e estão em processo de aquisição de outras faculdades - também estão comprando pilhas de livros e se tornando um filão para as casas editoriais de títulos técnico-científicos.

Apenas a Anhanguera e a Estácio adquiriram juntas, nos dois últimos anos, cerca de 1 milhão de exemplares, revendidos depois para os seus alunos. Essas compras têm contribuído para o desempenho do segmento de livros conhecido como CTP (Científico, Técnico e Profissional) e que comemora o maior crescimento do mercado editorial privado (sem incluir as compras de didáticos do governo). Em 2006, as vendas das obras técnico-científicas somaram R$ 384,7 milhões, um salto de 8,8% - enquanto o mercado privado editorial cresceu apenas 1,16% em relação a 2005, segundo a Câmara Brasileira do Livro (CBL).

Com 150 mil alunos matriculados, a Anhanguera Educacional é atualmente a instituição de ensino que mais adquire livros diretamente das editoras. Em 2007, foram 340 mil exemplares e neste ano mais 574 mil exemplares, totalizando uma compra de R$ 8 milhões. Para 2009, a meta é mais que dobrar esse volume: 1,2 milhão de exemplares e investimento de R$ 14 milhões. "Queremos ser o PNLD (Programa Nacional Livro Didático) do ensino superior. Acho que é possível atingir esses números devido ao crescimento orgânico do nosso projeto e às aquisições que a Anhanguera vem fazendo", afirma Adauto Damásio, responsável pelo Programa Livro-Texto (PLT) da Anhanguera, que já amealhou 27 faculdades.

A Estácio de Sá, outra instituição de ensino que captou recursos na bolsa e teve recentemente 20% de seu capital vendido para o GP Investimentos, possui uma iniciativa semelhante. Em março, lançou, em parceria com o GEN (Grupo Editorial Nacional) , um site para venda de livros técnico-científicos para seus alunos. A meta é vender 70 mil unidades em 2008 por esse canal.

A estratégia das instituições de ensino - que costumam ficar com 5% a 10% da receita das vendas - para ter a adesão dos estudantes é produzir livros customizados. Trocando em miúdos: a faculdade seleciona os capítulos de determinada obra que serão estudados pelos alunos no período letivo e encomenda para a editora a produção de um volume apenas com essas páginas. Essa redução de conteúdo, aliada a uma grande tiragem, reduz o preço em até 80%.

Apesar da drástica diminuição no valor final, o negócio é interessante para as editoras. "As universidades pedem uma tiragem alta e a venda é garantida", explica Guy Gerlach, presidente da Pearson Education, que este ano produziu para a Anhanguera 100 mil exemplares. Segundo ele, a tiragem padrão de um livro universitário distribuído em livrarias é de 3 mil exemplares. "Já uma faculdade encomenda, por exemplo, 10 mil unidades de um só título", diz.

Com seis editoras de livros técnicos, a holding GEN (Grupo Editorial Nacional) é atualmente a companhia com o maior contrato com as universidades. O GEN vendeu neste ano mais de 140 mil livros para a Anhanguera. Para a Estácio, entregou outros 60 mil e desenvolveu um site para revenda dos livros aos alunos. O grupo investiu R$ 200 mil no projeto. Nesse caso, a universidade continua encomendando as obras, mas todo o gerenciamento da venda pela internet é feita pelo GEN. "Hoje 90% dos livros vendidos pelo portal são nossos. Mas a idéia é que haja também títulos de outras editoras. A Pearson, por exemplo, já vende conosco", diz Mauro Koogan Lorch, presidente do grupo GEN. Ele acredita que com a adesão de outras casas editoriais, o site passará a ser gerenciado por uma empresa independente para que não haja conflito de interesses.

Líder no ranking do último programa do governo voltado ao ensino médio, a editora Saraiva fechou com a Anhanguera mais de 100 mil exemplares. "A tiragem de um único título chegou a 33 mil unidades", conta Flavia Alvin Bravin, diretora editorial de livros universitários e de negócios da Saraiva. Hoje, essa divisão movimenta R$ 90 milhões por ano.

As editoras menores também estão se beneficiando. Mais de 15 empresas têm algum tipo de parceria com as faculdades. Há três meses, a Atlas negociou com a gigante Unip, que possui 46 unidades e atende 190 mil alunos. A editora fechou uma compra de 12,5 mil livros no valor de R$ 500 mil para as bibliotecas da instituição. Nesse caso foram vendidas obras completas e não as customizadas.

Prática comum nos Estados Unidos e na Europa, a compra de livros por faculdades ainda têm uma representatividade pequena no faturamento das editoras no Brasil. Porém, com a tendência de consolidação no mercado de ensino superior, as casas editoriais cada vez mais vislumbram novas oportunidades daqui para frente. "Hoje as vendas para universidades representam apenas 2% para o GEN, mas acho que em cinco anos a receita pode aumentar em até 15 vezes", diz Lorch. "Trabalhamos com a Anhanguera e Ibmec há um ano e meio e fizemos para eles 17 mil livros. Esse volume representa somente cerca de 5% do nosso faturamento, mas acredito que existe um grande mercado", complementa Eduardo Monaco, gerente de marketing da Cengage, ex-Thomsom.

Segundo Ryon Braga, sócio da consultoria especializada na área educacional Hoper, a venda de livros técnico-científicos pode quintuplicar se for mantido o ritmo de fusões no setor. Além disso, esse modelo, que barateia o preço do livro, traz ao mercado consumidores que até então só tiravam cópias de capítulos. Apenas 5% a 10% dos estudantes de faculdades voltadas para as classes C e D compram livros no formato tradicional.