Título: Democratas pedem diálogo com emergentes
Autor: Balthazar , Ricardo
Fonte: Valor Econômico, 26/08/2008, Internacional, p. A11
Os delegados que participam da convenção nacional do Partido Democrata ratificaram ontem uma nova plataforma política, em que o partido admite a existência de limites para a atuação dos Estados Unidos no palco internacional e ao mesmo tempo reconhece a necessidade de estabelecer novos canais de diálogo com países emergentes como a China, a Índia e o Brasil.
O documento diz que os EUA precisam "aprofundar seus laços com poderes emergentes" e menciona China, Índia, Rússia, Brasil, Nigéria e África do Sul, nessa ordem, como países que poderiam ser chamados a assumir um papel mais ativo nas discussões de problemas globais.
"É do interesse dos Estados Unidos que todos esses poderes emergentes e outros assumam um papel maior na promoção da paz internacional, e do respeito aos direitos humanos, inclusive através de uma participação mais construtiva em instituições internacionais chave", diz o texto aprovado pela convenção.
Como qualquer documento dessa natureza, a plataforma dos democratas é pouca coisa além de um catálogo de boas intenções decoradas com confetes para agradar as bases partidárias. Mas existem diferenças importantes entre o texto e as plataformas que o partido apresentou em outras campanhas eleitorais.
O reconhecimento da importância crescente dos emergentes é um exemplo. Na plataforma aprovada pelos democratas para a eleição presidencial de 2004, a China foi mencionada apenas duas vezes, a Índia aparecia outras duas e o Brasil sequer era citado. Desta vez China e Brasil são citados quatro vezes cada um.
Ainda é cedo para saber no que as boas intenções irão resultar se o candidato dos democratas à Casa Branca, o senador Barack Obama, vencer a eleição presidencial de novembro. Muitas políticas que ele tem defendido na campanha contrariam interesses importantes dos países que ele promete procurar em seu esforço para restaurar a reputação internacional dos EUA.
Os democratas defendem a inclusão dos países emergentes num novo fórum internacional que seria criado para combater o aquecimento global, mas Obama quer que eles aceitem obrigações que países como a China e o Brasil têm rejeitado sistematicamente. Os democratas também querem impor leis trabalhistas e ambientais mais rigorosas aos parceiros comerciais que desejarem ampliar seu acesso ao mercado consumidor americano.
Obama gera desconforto no México e no Canadá sempre que defende a renegociação do Nafta, o tratado que reduziu as barreiras comerciais entre os três países em 1994. Ele é contra um acordo semelhante assinado com a Colômbia, país que recebeu dos EUA bilhões de dólares em ajuda para combater o tráfico de drogas nos últimos anos.
Obama defende uma reforma ambiciosa nas políticas de imigração dos EUA e promete regularizar a situação dos imigrantes que hoje vivem e trabalham no país mesmo sem documentação legal, mas no Senado votou a favor de um projeto que autoriza a construção de um muro na fronteira com o México para impedir a entrada de imigrantes ilegais.
Como o recente giro internacional de Obama tornou evidente, sua ascensão tem sido acompanhada com interesse no mundo inteiro. Mas o fosso que separa o discurso conciliador de Obama e as políticas que ele defende gera dúvidas sobre sua capacidade de atender às enormes expectativas que tem alimentado.
Numa entrevista concedida a jornalistas estrangeiros que acompanham a convenção em Denver, um assessor de Obama disse ontem que não vê nenhum problema nessa contradição. "Os outros países estão ansiosos para trabalhar com os EUA", disse Gregory Craig, assessor de Obama para política externa e um importante arrecadador de fundos para a sua campanha.
"Como presidente, Obama não precisará oferecer incentivos para atrair outros países, porque estão todos ansiosos pelo tipo de liderança que ele vai oferecer", afirmou Craig. "É por isso que 200 mil pessoas apareceram [para vê-lo] em Berlim."