Título: Congresso dificultaria o plano de energia de Obama
Autor: Balthazar , Ricardo
Fonte: Valor Econômico, 27/08/2008, Internacional, p. A11

O senador Barack Obama apresentou na corrida presidencial americana um plano audacioso para deter o aquecimento global, desenvolver fontes alternativas de energia e reduzir a dependência que a economia americana tem de petróleo importado, mas os últimos meses indicaram que suas propostas tendem a enfrentar muita resistência no Congresso se ele for eleito em novembro.

Os obstáculos que encontrará foram um dos temas dominantes de um debate que reuniu ontem empresários, especialistas e colaboradores da campanha de Obama, às margens da convenção nacional em que o Partido Democrata vai sacramentar sua indicação como candidato à Casa Branca.

"O futuro dessa discussão depende mais do Congresso do que do próximo presidente e ela está empacada agora", disse Paul Cicio, presidente da IECA, uma associação que defende os interesses de indústrias que consomem muita energia para fabricar seus produtos. "As pessoas estão procurando soluções perfeitas que jamais encontrarão."

Obama defende o estabelecimento de um teto para as emissões de gases que contribuem com o aquecimento global e propõe a criação de um sistema em que as indústrias teriam que pagar pelo direito de poluir. Elas teriam que comprar licenças em leilões organizados pelo governo e poderiam negociá-las no mercado para reduzir os custos da adaptação ao novo modelo.

Um plano semelhante apresentado no ano passado por um grupo de senadores dos dois partidos que dominam a política americana naufragou em junho no Senado, por causa de resistências localizadas nas duas legendas e da preocupação de indústrias de vários setores com o impacto que a iniciativa teria sobre a economia americana e o aumento dos custos da energia.

"As empresas continuarão criando obstáculos para iniciativas nessa área enquanto essa questão não for resolvida", disse Frances Beinecke, presidente do Conselho de Defesa dos Recursos Nacionais, um grupo ambientalista que participou do debate de ontem.

O candidato do Partido Republicano à Casa Branca, senador John McCain, defende um plano parecido com o de Obama, mas ele sugere que boa parte das licenças sejam entregues de graça para as empresas em vez de leiloadas pelo governo, o que poderia tornar mais suave e menos custosa a transição das empresas para o novo modelo energético.

Obama espera arrecadar US$ 100 bilhões por ano com os leilões previstos no seu plano e promete usar a maior parte do dinheiro para desenvolver fontes alternativas de energia, tornar viáveis biocombustíveis de nova geração e carros movidos a eletricidade, e ampliar o uso de turbinas de energia eólica e painéis que captam energia solar.

O governo americano distribui atualmente US$ 1,7 bilhão por ano em subsídios para difundir a geração de energia eólica e solar, mas a legislação que regulamenta esses incentivos precisa ser renovada todo ano pelo Congresso e neste ano virou objeto de picuinha entre democratas e republicanos, gerando incertezas para as empresas que contavam com o dinheiro para fazer novos investimentos.

O plano energético de Obama é uma peça-chave da sua plataforma de campanha, onde ele figura como uma resposta para a aflição do eleitorado com os preços na bomba de gasolina e também como um meio de revigorar a economia americana. "É preciso investir nessa área para fortalecer a economia e fazê-la se mover novamente", disse John Podesta, presidente do Centro para o Progresso Americano, um instituto de pesquisas influente entre os democratas.

Obama defende também a criação de um novo fórum internacional para discutir o combate ao aquecimento global, em que haveria espaço para países emergentes como o Brasil e a China. Mas ele já indicou que, se ele for eleito, os EUA continuarão pressionando as nações em desenvolvimento a aceitar obrigações e limites para suas emissões, um ponto particularmente sensível que tem atravancado as discussões sobre esse assunto.

Seja quem for o próximo presidente americano, é certo que o debate sobre o problema vai ganhar outra dimensão, depois de quase uma década relegado a segundo plano pelo presidente George W. Bush. Vários Estados americanos têm adotado leis para limitar emissões e ampliar o uso de fontes de energia alternativa, gerando pressões para que Washington faça alguma coisa.

Muitas indústrias temem a criação de uma colcha de retalhos com a proliferação de iniciativas regionais e por isso grandes corporações começaram a pressionar o governo para que um modelo mais uniforme seja posto em pé. "Sem liderança no nível federal, fica difícil fazer qualquer coisa nessa área", disse Jeff Kenna, presidente da Camco International, uma consultoria.