Título: Empresas do Brasil e dos EUA pedem mais proteção contra têxteis da China
Autor: Landim, Raquel
Fonte: Valor Econômico, 01/09/2008, Brasil, p. A2

O aumento de um crédito tributário para produtos têxteis e vestuário na China, que é considerado subsídio à exportação pelos empresários de Brasil e Estados Unidos, gerou uma reação protecionista nos dois países. Os setores privados estão pressionando seus respectivos governos a reagir, com a adoção de uma sobretaxa de importação e/ou a renegociação dos acordos de restrição das exportações.

A decisão de Pequim inflamou os ânimos dos empresários brasileiros e americanos, que já estavam temerosos de uma invasão de confecções "made in China" no fim do ano, quando expira os acordos bilaterais que possuem com o país e o prazo permitido pela Organização Mundial de Comércio (OMC) para aplicar salvaguardas contra têxteis chineses. O limite foi estabelecido em 2001, quando a China ingressou na entidade.

No início do mês passado, o gigante asiático elevou de 11% para 13% do valor do produto o crédito tributário que concede para as empresas locais na hora de exportar produtos têxteis e de vestuário. O país também anunciou recentemente que prepara medidas adicionais como redução das taxas de juros para empréstimos ao setor e mais recursos para novos equipamentos e modernização.

Com essas iniciativas, o governo chinês atende às reivindicações dos fabricantes locais, que reclamam da desaceleração da economia mundial, do aumento dos custos da mão-de-obra e outros insumos, como energia. A medida, no entanto, é uma guinada na posição do país, que vinha reduzindo os créditos tributários, que chegaram a ser de 17%, em uma tentativa de desacelerar as exportações e acalmar a pressão internacional.

"Solicitamos ao governo uma medida compensatória desse subsídio", disse Fernando Pimentel, diretor-executivo da Associação Brasileira da Indústria Têxtil (Abit). O Ministério do Desenvolvimento informou que ainda não recebeu um pedido oficial. Para obter uma medida compensatória, é preciso comprovar a existência de subsídio e pedir a abertura de uma investigação. O setor têxtil também pediu recentemente a troca da tarifa "ad valorem", em percentagem, para uma tarifa "ad rem", em reais por peso, em alguns produtos. Essa discussão está mais avançada, já virou lei no Congresso e o governo agora avalia apenas a maneira de implementá-la.

As importações brasileiras de produtos têxteis chineses saíram de apenas US$ 61 milhões em 2000 para US$ 992 milhões no ano passado. Apesar do acordo de restrição de exportações em vigor há três anos, os chineses incrementaram suas vendas para o Brasil em 43% em 2005, 69% em 2006 e 63% em 2007. Pimentel argumenta que, com a desaceleração nos mercados dos países ricos, a China está desviando produtos para o Brasil.

Os diretores da Abit estão conversando por telefone e trocando e-mails com sua contraparte americana, o Conselho Nacional das Organizações Têxteis (NCTO). No combate às importações de produtos chineses, a NCTO conta com o apoio da Coalizão de Ações do Comércio da Indústria Americana (Amtac). Esses lobbies conseguiram que os deputados apresentassem um projeto de lei no Congresso dos EUA, que, entre outros temas, ajudaria a resolver o problema do setor têxtil, mas até agora não obtiveram sucesso. De acordo com Augustin Tantillo, diretor-executivo da Amtac, o presidente George W. Bush não está empenhado em resolver o assunto, que deixou para a próxima administração.

O crédito concedido pela China para as exportações de têxteis não pode ser questionado na OMC. Pequim dá o benefício como compensação para o Imposto sobre Valor Agregado (IVA), uma exceção permitida pelo extinto Gatt desde a década de 40. Com exceção dos americanos, quase todos os membros da OMC possuem algum tipo de sistema de ressarcimento de tributos na exportação, inclusive o Brasil, que concede crédito ao exportador pelo ICMS pago. "O problema é que a China, ao contrário de outros países, manipula o sistema para estimular as exportações", disse Tantillo.

O subsídio à exportação é a ponta do iceberg de problemas que a China promete para os fabricantes de têxteis ao redor do mundo a partir de 2009, quando termina o prazo para que os países estabeleçam cotas para a importação de têxteis chineses. Esse setor é um dos mais protegidos do mundo, por conta do potencial de geração de emprego. O Acordo de Têxteis e Vestuários (ATV) regulou o comércio internacional durante 50 anos e só deixou de existir no fim de 2004.

Em 2005, as exportações chinesas do setor têxtil para Estados Unidos e União Européia avançaram 84% e 57%, respectivamente. A movimentação assustou os dois gigantes mundiais, que aplicaram salvaguardas contra as importações chinesas e pressionaram o país a fechar acordos de restrição de exportações. O Brasil foi o único país que também conseguiu esse tipo de benefício. A renovação desses acordos é polêmica. Enquanto os fabricantes argumentam que é legítimo se os países chegarem a um acordo voluntário com a China, os varejistas argumentam que as regras da OMC dizem que não.

O setor privado brasileiro está tentando renovar o seu acordo com a China sem sucesso até agora. A idéia é estender o prazo até 2013 e trocar os produtos sujeitos a cota. Segundo a Abit, os produtos incluídos no acordo representam hoje 20% do comércio. Quando o acerto foi fixado, esse percentual chegava a 70%. Os negociadores brasileiros estiveram em Pequim duas vezes, em setembro de 2007 e em julho deste ano. As negociações, no entanto, não avançaram. Os chineses também marcaram reuniões no Brasil, mas não vieram. "O aumento dos subsídios à exportação demonstra que os chineses não querem discutir essa questão seriamente", reclamou Pimentel.