Título: Má vontade política
Autor: TAHAN, LILIAN; ABREU, DIEGO
Fonte: Correio Braziliense, 06/03/2011, Cidades, p. 23

CAIXA DE PANDORA Colegas de Jaqueline Roriz não demonstram intenção de cobrar explicações sobre o vídeo em que ela aparece recebendo maço de dinheiro

Despreocupados com o desgaste da imagem e fechados no corporativismo que tomou conta do Congresso Nacional desde o escândalo do mensalão, deputados federais demonstram má vontade em avançar num eventual processo de quebra de decoro contra Jaqueline Roriz (PMN). A tese levantada pelos colegas da parlamentar baseia-se no fato de o vídeo em que ela e o marido, Manoel Neto, aparecem recebendo dinheiro de Durval Barbosa ser de 2006, anterior, portanto, ao atual mandato. E a depender do presidente da Comissão de Reforma Política, Almeida Lima (PMDB-SE), a filha do ex-governador Joaquim Roriz continuará participando das discussões sobre qual a melhor forma de financiar uma campanha política.

O líder do DEM na Câmara, Antônio Carlos Magalhães Neto (BA), ex-corregedor da Casa, defendeu a apuração do vídeo, mas afirmou que fatos praticados antes do mandato não configuram quebra de decoro. ¿O ideal é que a Corregedoria possa apurar. A se afirmar que existe jurisprudência determinando que os fatos realizados anteriormente ao mandato não podem ser objetos de quebra de decoro¿, afirma o parlamentar baiano. Políticos ouvidos pelo Correio usam termos fortes para falar da gravação, mas acabam ponderando que, politicamente, a parlamentar está livre. ¿A situação é grave, mas há um aspecto de ordem legal porque ocorreu antes da diplomação. Pode-se fazer um julgamento moral e ético, mas não de ordem legal¿, cita o deputado Luciano Castro (PR-RR). Jovair Arantes (PTB-GO) faz a mesma avaliação. ¿Ela responde no Conselho de Ética por algum ilícito praticado no período em que é deputada.¿

O ministro do Supremo Tribunal Federal Marco Aurélio Mello reforça a tese dos parlamentares. ¿A quebra de decoro é a prática de ato no curso em si do mandato¿, afirma. ¿As consequências podem vir do campo penal. A situação não pode ser jogada para debaixo do tapete. Vamos esperar que as instituições cumpram os seus papéis¿, emenda Mello.

O deputado Almeida Lima disse que não cabe a ele excluir a deputada da Comissão de Reforma Política. ¿Não vou tomar atitude nenhuma. Não sou do Conselho de Ética nem da Mesa Diretora. Quem tem que tomar a decisão é o presidente da Câmara, Marco Maia (PT-RS)¿, destaca o peemedebista. O deputado Ricardo Berzoini (SP), integrante da comissão, foi além e disse que discutir o caso de Jaqueline dentro do colegiado pode atravancar os trabalhos. ¿Já está em curso uma investigação. Se o delito foi praticado no mandato, a Câmara trata. Fora do mandato, há instâncias competentes¿, afirma o petista.

Os seguidos escândalos que afetaram o Congresso desde 2005 ¿ quando o PT foi acusado de comprar parlamentares para garantir a aprovação de projetos de interesse do governo ¿ consolidaram a imagem de que deputados e senadores não cassam seus pares. No mensalão, apenas José Dirceu (PT-SP), Roberto Jefferson (PTB-RJ) e Pedro Correa (PP-PE) tiveram os mandatos anulados. Desde então, o conselho instituiu que a quebra de decoro só pode ser aplicada para fatos ocorridos no mandato em curso.