Título: Em volume, exportação cai para EUA e UE
Autor: Landim, Raquel
Fonte: Valor Econômico, 02/09/2008, Brasil, p. A3

Sediada em Bento Gonçalves (RS), a Móveis Carraro perdeu um importante contrato no mercado externo no mês passado. A empresa planejava incluir seis produtos nos catálogos da Argos, uma das maiores varejistas do Reino Unido. O negócio, que foi alinhavado em março, acabou desfeito depois que a crise afetou o mercado britânico. A competitividade da empresa também foi abalada pela valorização do euro e pela alta do frete.

"Tínhamos sido prejudicados pelo câmbio. O 'subprime' foi a última paulada", disse Ademar de Gasperi, presidente da Móveis Carraro. Ele conta que abandonou o mercado americano ainda em 2007 depois do fortalecimento do real. Na América Latina, as vendas seguem robustas, mas a concorrência recrudesceu. "A China nem olhava para outros mercados. Hoje está mais atenta ao Chile, por exemplo", disse.

A fabricante de móveis é um bom exemplo do que está ocorrendo com as exportações. As vendas para os Estados Unidos, que sofriam com o câmbio, caíram mais depois que o estouro da bolha imobiliária atingiu a economia. As empresas brasileiras agora assistem assustadas a queda dos negócios com a Europa, que foi contaminada no segundo trimestre. São as vendas para os emergentes que ajudam a manter os resultados.

Depois de seis anos de robusta expansão, a economia mundial dá sinais de fraqueza e prejudica as exportações. Em volume, os embarques para os EUA recuaram 12% nos 12 meses até junho, uma queda mais agressiva que os 7% de 2007, conforme dados da Fundação Centro de Estudos do Comércio Exterior (Funcex), elaborados a pedido do Valor. "A desaceleração da economia mundial é hoje o fator primordial que prejudica as exportações", disse Fernando Ribeiro, economista da Funcex.

Para a União Européia, a quantidade exportada ainda cresceu 3% nos 12 meses até junho, mas o ritmo é bem inferior a alta de 14% em 2007. No primeiro semestre em relação a igual período do ano passado, a quantidade exportada para o bloco recuou 4,5%. Ribeiro ressaltou que os dados de volume permitem excluir o efeito da alta das commodities, que infla as exportações. Com o aumento do custo de insumos como o aço, as empresas tiveram mais facilidade para reajustar preços . Em valores, as exportações brasileiras cresceram 14% para os EUA e 26% para a Europa de janeiro a agosto em relação ao mesmo período de 2007.

A crise do mundo rico tornou as exportações brasileiras mais dependentes dos países em desenvolvimento, cujo desempenho continua positivo, mas não se sabe até quando. O país está direcionando vendas de commodities para a China e de manufaturados para a América Latina. A quantidade exportada para os países do Mercosul cresceu 15% nos 12 meses até junho, ritmo similar ao do ano passado. Para a Ásia, o crescimento do volume exportado até acelerou: 10% no acumulado do ano até junho, contra 4% em 2007.

"Mantemos um bom desempenho nas exportações, porque diversificamos os mercados no momento certo", disse Marcus Amato, gerente de exportação da Gyotoku, fabricante de cerâmicas e revestimentos situada em Suzano (SP). As exportações da empresa devem crescer 20% em 2008, impulsionadas pelas vendas para América Latina e Oriente Médio. Os embarques para os EUA recuaram 50% em dois anos. Na Europa, as vendas caíram entre 30% e 40% nos últimos quatro meses. "Tenho contato com uma importante cadeia varejista na Europa, que previu um ano bem difícil", disse Amato.

Desde meados do ano passado, quando começou a crise das hipotecas nos EUA, os países vivem a iminência da desaceleração global. O Produto Interno Bruto (PIB) da maior economia do planeta recuou 0,2% no quarto trimestre de 2007 e subiu 0,9% de janeiro a março deste ano. No segundo trimestre de 2008, avançou 3,3%, conforme revisão divulgada recentemente. A economia americana foi estimulada pelo pacote fiscal do governo George W. Bush, pela queda da taxa de juros e pela expansão das exportações graças ao dólar fraco. Para os economistas do departamento econômico do Bradesco, o efeito dessas medidas está chegando ao fim, o que sinaliza um segundo semestre complicado. Prova disso é a queda de 0,7% na renda real dos americanos em julho em relação a junho na comparação com ajuste sazonal.

A Europa vinha resistindo bem à desaceleração da economia americana até o segundo trimestre. Itália e Espanha já sofriam o impacto desde o início do ano, mas a Alemanha sustentava os resultados. No segundo trimestre em relação ao primeiro, a economia alemã desacelerou 0,5% e arrastou para baixo a zona do euro, que cedeu 0,2%. No Reino Unido, outra economia importante da região e bastante ligada aos EUA, o PIB ficou estável. Segundo o Bradesco, o desempenho dos emergentes é "questão-chave" para a balança comercial brasileira nos próximos meses. A projeção do banco é uma desaceleração moderada, por conta da redução no ritmo de exportações de países como China e Índia para os EUA, mas existe o risco de um impacto mais forte.

"Houve uma redução considerável dos pedidos da Europa em maio e junho. Os varejistas não quiseram formar estoques por conta da crise", disse Nelson Germann, diretor da Scala Serviços de Exportação, agência que intermedia vendas de calçados brasileiros para os Estados Unidos e para a Europa. Nos EUA, o empresário tinha perdido mercado por conta do câmbio e a crise só agravou o problema. Os pedidos se normalizaram recentemente com a troca de estação, mas ele espera um segundo semestre mais fraco que no ano passado.