Título: Elite parlamentar tropeça nos municípios
Autor: Costa, Raymundo
Fonte: Valor Econômico, 02/09/2008, Especial, p. A12
Dos 82 congressistas que disputam uma cadeira de prefeito em outubro, apenas 14 fazem parte do seleto grupo de 100 parlamentares mais influentes da Câmara e do Senado, de acordo com a 15ª edição de "Os Cabeças do Congresso", uma pesquisa do Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (Diap) a ser divulgada nos próximos dias, a que o Valor teve acesso com exclusividade. Dos 14, só uma é senadora - Patrícia Saboya (PDT-CE).
Fazer parte da "lista do Diap" é sinônimo de status no Congresso e em geral vira material de propaganda eleitoral. Mas dos 14 que disputam a atual eleição, apenas dois aparecem com algum favoritismo para outubro. Um deles é ACM Neto (DEM), que está empatado tecnicamente com Antonio Imbassahy (PSDB), que já foi prefeito da cidade.
O outro nome bem posicionado é o do líder do PR na Câmara, Luciano Castro, candidato em Boa Vista, a capital de Roraima: ele está em segundo lugar, mas muito distante (mais de 20 pontos) do atual prefeito, Iradilson Sampaio, do PSB. Os votos de ACM Neto e de Luciano Castro parecem não pesar na situação eleitoral de cada um.
Em apenas duas de dez votações de projetos pesquisadas pelo Diap Neto e Castro votaram da mesma maneira: a proposta que tornava facultativa a cobrança da contribuição sindical (os dois votaram sim, mas o Congresso aprovou a contribuição compulsória) e uma outra que regulamentavam o trabalho no comércio aos domingos: ambos votaram não. Estiveram em posições diametralmente opostas nas outras oito votações.
Seguindo orientação de seu partido, ACM Neto votou duas vezes contra a prorrogação da CPMF, contra o aumento da Contribuição Social sobre o Lucro Líquído (CSLL) para os bancos e contra a Contribuição Social para a Saúde (CSS), a recriação envergonhada do imposto do cheque. Candidato ao mesmo posto, o deputado petista Walter Pinheiro votou de maneira diferente de ACM Neto em todos os quatro projetos.
No fim de semana, o petista estava em quarto lugar numa pesquisa Datafolha. No meio da semana já aparecia em terceiro, em outros levantamento e não será surpresa para ninguém, em Salvador, se estiver no segundo turno contra ACM Neto ou Imbassahy. A conclusão lógica dos analistas é que outros fatores terão concorrido para a mudança, inclusive o fato de a população baiana há dois anos ter se bandeado majoritariamente para o PT nas eleições presidenciais e para o governo.
A relação dos que estão perdidos na marca de um dígito inclui nomes que surgiram como novidades no início do ano, caso do deputado Fernando Gabeira no Rio (PV), bem atrás de Jandira Feghali (PCdoB), que não consta entre os "100". Mesmo caso de Onix Lorenzoni (DEM), perdido num quinto lugar de pesquisa numa cidade onde outras duas colegas deputadas que não figuram entre as mais influentes - Maria do Rosário (PT) e Manuela D'Ávila (PCdoB) - despontam à sua frente.
"O fato é que as eleições municipais têm características muito próprias", diz o coordenador-geral e de análise da pesquisa, Antônio Augusto Queiroz. "Normalmente é bem avaliado quem já teve experiência administrativa, por exemplo", diz. A influência maior da lista se daria no processo da reeleição do parlamentar. "A experiência é um requisito importante para ingresso no restrito grupo de parlamentares que lideram a tomada de decisão no Congresso", diz a publicação.
Prova disso é que dos 100 parlamentares identificados na 15ª edição, 28 são de primeiro mandato, sendo 19 senadores e apenas nove deputados. Dos 19 senadores em primeiro mandato, apenas três estão na primeira das duas legislaturas que compõem o mandato de senador.
"Deste modo, se somarmos os nove deputados e os três senadores em início de legislatura, vamos perceber que efetivamente novos são apenas 12 parlamentares e, mesmo assim, todos os três senadores em início de legislatura já foram deputados em legislaturas passadas".
A eleição de Londrina, no Paraná, é um exemplo de que nem sempre um deputado atuante e influente, na visão dos colegas e de formadores de opinião (critério usado pelo Diap para a escolha dos 100 cabeças do Congresso) é um passaporte seguro para uma eleição de prefeito. Em Londrina, quem lidera a pesquisa é um ex-prefeito (Antonio Belinati, do PP), seguido de um deputado do baixo clero do Congresso, Barbosa Neto (PDT). Só em terceiro aparece o deputado Luiz Carlos Hauly, um dos "cabeças" - e ele já foi candidato a prefeito outras vezes e perdeu.
Aparentemente, quem votou contra os bancos não se beneficiou disso (7 deputados, a maioria petista, mas com um tucano a bordo - Luiz Carlos Hauly), mas os que votaram contra a prorrogação da CPMF e estão contra a criação da CSS - seu sucedâneo - estão melhor do que quem votou a favor. O Diap fez o levantamento dos votos dos deputados em 10 votações de interesse dos trabalhadores.
Entre os 100 parlamentares que comandam o processo decisório no Congresso, 71 são deputados e 29 são senadores. Proporcionalmente, o Senado encontra-se hiper-representado. Enquanto a representação dos senadores na composição do Congresso é de 13,64%, na elite ele participa com 29%. Já a Câmara, com 86,36% da composição do Poder Legislativo, participa da elite com 71%. Para figurar entre os 100 mais influentes do Congresso o parlamentar precisa atender a uma série de critérios, como a participação em comissões, projetos aprovados, entre outros.
Nesses 15 anos, a publicação "Os Cabeças do Congresso", do Diap, transformou-se em leitura obrigatória entre parlamentares, autoridades do Poder Executivo, dirigentes partidários, sindicais e empresariais, estudiosos, formadores de opinião e demais interessados no processo decisório no Poder Legislativo. "Trata-se de um estudo da elite parlamentar - com uma metodologia que combina variados aspectos da tomada de decisão no processo político - não é uma exclusividade do Diap", explica Queiroz.
O passo seguinte do Diap é ranquear os dez parlamentares mais influentes do Congresso, que são eleitos pelos "100 Cabeças". O Diap ainda não concluiu a votação, mas desta vez ela incluirá um novo presidenciável - Ciro Gomes (PSB). Desde que é editada a publicação "Os Cabeças do Congresso", em 1995, nem Fernando Henrique Cardoso nem Luiz Inácio Lula da Silva estavam no Congresso. José Sarney, que foi presidente de 1985 a 1990, esteve em praticamente todas.