Título: Gestão de empresas, tecnologia e produtividade
Autor:
Fonte: Valor Econômico, 05/09/2008, Opinião, p. A13

Sabemos que o crescimento da economia brasileira no longo prazo depende do crescimento da produtividade das nossas empresas, e que isto depende em grande parte da utilização de novas tecnologias. Mas uma questão ainda pouco estudada no mundo acadêmico, apesar de vivenciada no dia-a-dia das firmas e empresas de consultoria, diz respeito às modernas formas de gestão empresarial. Um estudo mais aprofundado desse tema levanta algumas questões importantes para a formulação de políticas públicas. Será que a adoção das melhores práticas varia muito entre as firmas de um mesmo país e entre firmas de diferentes países? Qual o seu impacto sobre a produtividade? Por que algumas firmas adotam uma gestão moderna, enquanto outras não? Qual o impacto da gestão na adoção de novas tecnologias e na produtividade? Como estão as firmas brasileiras na foto?

Estas questões estão sendo estudadas em uma série de pesquisas acadêmicas desenvolvidas recentemente por economistas como Nick Bloom (Stanford) e John van Reenen (London School Economics). Esses autores desenvolveram uma pesquisa de práticas gerenciais e entrevistaram firmas de vários países do mundo para identificar os determinantes e as conseqüências da boa gestão empresarial. A pesquisa identificou as melhores práticas em quatro áreas: operações, monitoramento, metas e incentivos. Cada firma foi então classificada de acordo com suas práticas de gestão e diversos controles foram feitos para diminuir os erros de mensuração inerentes a pesquisas desse tipo.

Quais foram os principais resultados? Em primeiro lugar, percebeu-se que as práticas gerenciais estão efetivamente associadas a medidas mais objetivas de desempenho, como produtividade, lucratividade, crescimento de vendas e sobrevivência. Além disto, há uma dispersão muito grande de práticas gerenciais dentro de um mesmo país. Uma parcela significante das firmas americanas e européias, por exemplo, adota práticas bastante primitivas, com pouco monitoramento de processos ou de pessoas, metas inapropriadas ou ineficazes e poucos incentivos para seus empregados. Comparando as firmas dos diversos países, entretanto, as americanas são as que adotam as melhores práticas em média. Isso fez com que a introdução de novas tecnologias tenha sido particularmente bem-sucedida nessas firmas. Num segundo bloco estão as firmas alemãs, suecas e japonesas, seguidas das britânicas, francesas e italianas. Por último estão as empresas polonesas, portuguesas e gregas.

-------------------------------------------------------------------------------- Se o Brasil quiser aumentar a produtividade de suas firmas, terá que melhorar sua gestão, abrir mais a economia e estimular a concorrência --------------------------------------------------------------------------------

Mas, se as melhores práticas trazem aumento de produtividade, por que nem todas as firmas as adotam? Uma das razões tem a ver com os custos envolvidos na mudança de métodos, que muitas vezes podem não compensar os ganhos de produtividade. Além disto, o esforço dos gestores aumenta muito quando novas práticas são introduzidas, o que faz com que muitos deles se acomodem. Por fim, a eficiência da adoção dessas práticas varia muito com as características de cada firma e ramo de atividade. Mas existem alguns determinantes universais. Os mais importantes, segundo os autores, são a competição no mercado de produção e a estrutura familiar da empresa. A maior concorrência internacional e um mercado mais competitivo eliminam as empresas mais ineficientes e aumentam o esforço dos gestores para introduzir novas práticas. Isto mostra, mais uma vez, que abertura comercial e concorrência aumentam a produtividade. Em uma grande parte das empresas pesquisadas, principalmente as britânicas e francesas, a maior parte das ações está com membros da família. Em muitos casos, o filho primogênito é o principal gestor da firma (3% das firmas americanas e alemãs e 15% das firmas francesas e britânicas). Essas firmas tendem a ser as mais atrasadas em termos de práticas gerenciais.

Como estão os BRICs? Em média, as firmas indianas e chinesas adotam práticas significativamente mais atrasadas do que as européias e americanas. Isto ocorre devido à alta concentração de empresas públicas e familiares, principalmente na Índia. Entretanto, há nesses países uma franja de empresas com práticas gerenciais avançadas. Na verdade, cerca de 15% das firmas americanas tem gerenciamento pior que a média das empresas chinesas e indianas. As reformas que estão sendo feitas no sistema de propriedade de empresas desses países podem provocar um choque de produtividade, por meio de formas modernas de gestão, que pode compensar o aumento do custo do trabalho e das matérias-primas.

As firmas brasileiras não foram incluídas (até agora) no survey conduzido pelos ingleses, mas fizemos uma pesquisa comparando métodos de gerenciamento em uma amostra de mil firmas brasileiras e indianas em seis setores da indústria. Quando perguntadas o que acontece quando problemas aparecem na produção, 17% das firmas brasileiras respondem que os processos de melhoramentos são feitos com demora, 40% que eles são feitos rapidamente e 43% afirmam que relatar problemas é parte integrante da responsabilidade dos trabalhadores. No caso das firmas indianas, essas porcentagens são de 17%, 46% e 37%, indicando grande similaridade entre as firmas dos dois países.

Quando perguntadas como é feita a promoção de seus empregados, 8% das empresas brasileiras afirmam que é baseada no tempo de serviço, 24% que há a possibilidade de promoção com base em desempenho e 68% que a promoção é baseada somente no desempenho e habilidade. Nas firmas indianas, esses percentuais são de 22%, 33% e 45%, respectivamente, indicando que as firmas brasileiras estão bem mais avançadas neste quesito. Por fim, quando perguntadas se a remuneração dos trabalhadores está ligada ao seu desempenho, 15% das firmas brasileiras responderam que não, 44% em alguma medida e 40% que isto ocorre na maioria dos casos. Nas firmas indianas essas porcentagens são de 5%, 53% e 42%, o que mostra que as firmas indianas estão mais avançadas que as brasileiras neste quesito. Assim, se o Brasil quiser melhorar a produtividade de suas firmas, terá que melhorar suas práticas gerenciais. Isto pode ser conseguido aumentando a abertura da economia, estimulando a concorrência nos diversos mercados e profissionalizando a gestão de suas empresas.