Título: Companhias encaram o desafio digital
Autor: Bispo, Tainã
Fonte: Valor Econômico, 05/09/2008, Tecnologia & Telecomunicações, p. B2

Esperar o lançamento de um CD ou a estréia de um filme tornaram-se situações obsoletas no dia-a-dia dos consumidores. Tudo está à disposição na web, à distância de um clique. Essa mudança de hábito de consumo, no entanto, foi rápida e intensa demais. As empresas provedoras de conteúdo levaram um susto. O sobressalto, porém, parece ter ficado para trás. Hoje, a maior parte das companhias - 63% delas - afirma não pensar numa estratégia de distribuição de conteúdo sem incluir mídias como a internet e o celular.

Agora, a pergunta é outra: como lucrar com essa nova realidade? Ainda não há uma resposta definitiva para tal dúvida. Mas experiências não faltam para descobri-la. Há, até, um certo otimismo em relação a essas novas mídias: mais de um terço das companhias esperam ter, em três anos, um faturamento significativo de conteúdo gerado pelo próprio usuário e das novas mídias, segundo uma pesquisa realizada pela consultoria americana Accenture.

O estudo afirma que 2008 poderá ser considerado como o ano "em que a mídia digital deixou de ser um mercado de nicho nos olhos dos nossos entrevistados para um mercado mais estável". Alguns grupos como a Disney e a NBC, por exemplo, projetam faturar, cada uma, US$ 1 bilhão em conteúdo digital para este ano.

O tema tem sido tão debatido nos últimos anos que a Accenture dedicou sua pesquisa deste ano às "perspectivas de futuro para o provedores de conteúdo". Foram entrevistados mais de 100 executivos, majoritariamente dos EUA e Europa, das indústrias de mídia, TV, video game, música, cinema, rádio, entretenimento e publicidade.

Segundo Petronio Nogueira, líder da prática de mídia e telecomunicações da Accenture, os países que compõem os Bric (Brasil, Rússia, Índia e China) também tiveram alguns representantes, devido ao crescimento econômico desse grupo.

A pesquisa afirma que a indústria de mídia e entretenimento está enfrentando, neste momento, sua maior transformação. Além disso, toda essa mudança é muito recente. O estudo revelou que 59% dos entrevistados dizem estar a menos da metade desse novo "caminho". As empresas ainda estão movimentando-se num terreno de certa forma desconhecido. "Criar conteúdo para mídias específicas ou levar o conteúdo existente para outras mídias? Qual a linguagem adequada? Como monetizar a distribuição em várias plataformas?", diz Nogueira.

O formato de patrocínio e publicidade tem se mostrado uma tendência forte nesse novo cenário - já que os usuários demonstram uma certa falta de interesse em pagar por conteúdo. Numa estimativa feita pela empresa de pesquisa ZentihOptimedia, a publicidade on-line deverá movimentar US$ 41,6 bilhões neste ano.

O celular tem sido o aparelho que mais chama a atenção do grupo de entrevistados: 84% acreditam que o aparelho móvel vai tornar-se uma mídia de massa e representar maior oportunidade de crescimento.

A própria Accenture tem mostrado seu interesse nessas novas formas de entregar conteúdo. Em abril de 2007, anunciou a compra da francesa Digiplug, uma empresa de tecnologia que oferece infra-estrutura entre a negociação de gravadoras e operadoras de celulares na venda de música. A americana Origin Digital, adquirida neste mês, oferece um serviço semelhante ao da Digiplug, mas para vídeos - um movimento iniciado pelos grupos de tecnologia. O Google comprou o YouTube enquanto a News Corp. adquiriu o MySpace.

"É um momento de oportunidade e de ameaça. Depende de como [esse novo modelo] irá se configurar", explica Nogueira.

Os executivos entrevistados, no entanto, acreditam ter um desafio complexo para enfrentar. "Os consumidores querem ter acesso ao conteúdo 24 horas por dia, sete dias por semana. Tudo sob demanda", afirma Nogueira.

Ao contrário do início desta década, as empresas têm se mostrado dispostas a encarar tal cenário. Tanto é que 71% dos entrevistados disseram não ver risco em associar suas marcas a uma das novas mídias. Até a indústria fonográfica, provavelmente o setor que mais sofreu com a aparição dos sites de compartilhamento, mostra ter mudado de opinião. Cantores e bandas famosos entre os jovens hoje, Lily Allen e Artic Monkeys foram descobertos numa rede social.