Título: Câmara promete apuração
Autor: Tahan, Lilian
Fonte: Correio Braziliense, 10/03/2011, Cidades, p. 29

Presidente da Casa, Marco Maia garante que os parlamentares vão apurar denúncia contra Jaqueline Roriz e encaminha ao Ministério Público Federal pedido de informações sobre gravação em que a deputada aparece recebendo dinheiro de Durval Barbosa

O presidente da Câmara dos Deputados, Marco Maia (PT-RS), considerou fortes as imagens que mostram a deputada federal Jaqueline Roriz (PMN-DF) recebendo dinheiro de Durval Barbosa. Segundo o petista, o Conselho de Ética e Decoro Parlamentar da Casa terá de reavaliar as regras que tratam de punição para atos cometidos antes do mandato. ¿As imagens dão conta de uma situação ruim, em que uma figura pública aparece recebendo dinheiro de forma, até ali, ilícita. O ato precisa ser investigado pela Justiça e pelo Ministério Público e terá o tratamento adequado na Câmara dos Deputados¿, afirmou na tarde de ontem.

O Conselho de Ética será instaurado na próxima quarta-feira. Maia solicitou aos partidos que indiquem os 15 membros para dar início aos trabalhos. Depois de eleger o novo presidente do grupo, os deputados passarão a reavaliar o regimento interno e os trâmites adotados para a apuração de processos por quebra de decoro (veja quadro). A ideia é dar mais rapidez e efetividade à tramitação das representações. Segundo o deputado, o novo conselho poderá rever o entendimento de legislaturas anteriores e cassar os colegas que tenham cometido delitos mesmo antes de terem sido eleitos.

A reavaliação vai ao encontro do projeto de resolução que o deputado federal José Antônio Reguffe (PDT-DF) apresentará hoje. Ele pretende incluir no Código de Ética da Câmara artigo que determina como objeto de investigação atos de ilicitude cometidos, inclusive, para a obtenção do mandato. O objetivo é reverter precedente aberto, em 2007, com parecer do deputado federal e atual ministro da Justiça, José Eduardo Cardoso (PT-SP). Na ocasião, ele determinou que o Conselho de Ética só abriria processo para apurar fatos suspeitos ocorridos após a posse na Casa.

Maia julgou adequada a renúncia de Jaqueline da Comissão Especial de Reforma Política. ¿Ela tem se dedicar à sua defesa, a dar explicações perante a sociedade e a Câmara dos Deputados¿, disse. No entanto, ele refutou a ideia de corporativismo entre os deputados para beneficiar a colega. Segundo o parlamentar, a Casa precisa de regras claras para serem aplicadas em todos os casos, sem discriminação ou avaliação diferenciada para cada situação.

Munição Ontem, o presidente da Câmara encaminhou ao Ministério Público Federal um pedido de informações. Segundo Maia, é preciso conhecer melhor quais são as acusações contra Jaqueline Roriz e saber se existem mais dados. O material servirá para municiar o corregedor, Eduardo da Fonte (PP-PE), e o Conselho de Ética. ¿O simples fato de pedir informações já é um processo de investigação¿, destacou Maia.

Depois de receber a resposta, o presidente encaminhará o caso para o corregedor, que promoverá as investigações antes da abertura do processo. Só após a aprovação do parecer pela Mesa Diretora, o caso pode ser enviado ao Conselho de Ética. Mas esse caminho deverá ser encurtado com a representação do PSol. Hoje, o deputado Chico Alencar (PSol-RJ) pedirá a abertura de investigação à Corregedoria, mas, na próxima semana, o partido irá requerer a instauração de processo de cassação diretamente no Conselho ¿ ato permitido apenas à Mesa e às legendas.

Durante a tramitação do processo, a deputada terá a oportunidade de apresentar a defesa e indicar testemunhas. Com a aprovação da Lei da Ficha Limpa, o recurso da renúncia para fugir da cassação deixou de ser tão interessante, visto que a nova norma deixa o político, nessa situação, inelegível por oito anos. A solução é enfrentar o julgamento dos colegas, que podem puni-la com: censura, verbal ou escrita; suspensão de prerrogativas regimentais; suspensão temporária do exercício parlamentar; ou perda do mandato.

No caso de o Conselho de Ética decidir pela suspensão temporária ou cassação, o processo deverá ser encaminhado para apreciação do plenário ¿ composto por 513 deputados. Para confirmar a perda de mandato, são necessários, pelo menos, 257 votos favoráveis. Se o quorum for inferior, a deputada é inocentada. ¿Pode acontecer de tudo. Ela pode ser cassada, pode ser punida. Vamos tomar todas as medidas possíveis para garantir que o Conselho de Ética e a Corregedoria da Casa tenham todas as informações necessárias para atuar¿, concluiu Maia.

OAB-DF COBRA APURAÇÃO » O presidente da seccional do Distrito Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-DF), Francisco Caputo, se reunirá hoje, às 12h, com o presidente da Câmara dos Deputados, Marco Maia (PT-RS). Segundo o advogado, o fato de o vídeo conter imagens de fatos ocorridos no passado não impossibilita a abertura de investigações na Casa. Caputo acredita que, se as cenas tivessem sido divulgadas antes das eleições do ano passado, em 3 de outubro, a deputada não teria ¿merecido¿ os votos que recebeu. O presidente da OAB-DF diz que a entidade vai cobrar ¿posturas enérgicas¿ contra políticos que cometeram delitos. O encontro ocorrerá no gabinete da Presidência da Câmara.

Passo a passo

Veja quais são as fases para a análise de quebra de decoro na Câmara dos Deputados:

» Qualquer pessoa pode representar contra um parlamentar diretamente na Mesa Diretora.

» O presidente da Câmara encaminha a denúncia à Corregedoria da Casa, que é formada por quatro membros da Mesa e presidida pelo 2º vice-presidente (corregedor).

» O corregedor tem o prazo de 20 sessões plenárias para investigar o processo, apurando fatos e ouvindo testemunhas. Depois, ele apresenta parecer à Mesa Diretora, que decide sobre a abertura ou não do processo no Conselho de Ética e Decoro Parlamentar.

» Além da Mesa, somente os partidos podem enviar representação diretamente ao Conselho de Ética ¿ que é formado por 15 deputados. Depois de instaurado, o processo é designado ao relator e o acusado é notificado.

» O deputado investigado tem prazo de cinco sessões para apresentar a defesa. As evidências são avaliadas pelo relator. Caso seja necessário, ele pode requerer a quebra dos sigilos bancário, fiscal e telefônico do investigado.

» O Conselho de Ética pode aplicar punições em diversos níveis: censura verbal, suspensão do mandato e expulsão. Nos dois últimos casos, o processo deve ser votado em plenário. Para cassar o parlamentar, são necessários 257 votos. Caso contrário, o deputado é absolvido.

ENTENDA O CASO Novo escândalo

Na última sexta-feira, foi divulgado um vídeo gravado pelo ex-secretário de Relações Institucionais do GDF Durval Barbosa mostra o momento em que ele um pacote de dinheiro (avaliado em R$ 50 mil) à deputada federal Jaqueline Roriz (PMN) e ao marido da parlamentar, Manoel Neto. A gravação seria de 2006, quando a filha do meio do ex-governador Joaquim Roriz (PSC) concorria a uma vaga na Câmara Legislativa. Além do montante recebido, a então candidata pede ¿cargos¿ para a estrutura de campanha, mas recebe a promessa de mais verba de Durval.

A deputada aparece em cenas similares às que tiraram o mandato de três distritais na Câmara Legislativa. Leonardo Prudente e Júnior Brunelli (ambos sem partido) renunciaram para fugir do julgamento dos colegas. Prudente foi filmado escondendo dinheiro nas meias e protagonizou, com o colega, a conhecida oração da propina. Eurides Brito (PMDB) guardou os maços na bolsa e acabou cassada. Como o vídeo de Jaqueline foi divulgado somente na última semana, ela não sofreu qualquer sanção.

O PSol anunciou que pedirá a cassação de Jaqueline no Conselho de Ética da Câmara dos Deputados. Por sua vez, o procurador-geral da República, Roberto Gurgel, informa que entrará com pedido de investigação no Supremo Tribunal Federal para investigar o caso, considerado por ele como ¿extremamente grave¿. O Ministério Público local também avalia a possibilidade de apresentar ação de improbidade administrativa contra a deputada. Se condenada, além da possibilidade de perda do mandato e dos direitos políticos, ela pode ser obrigada a devolver dinheiro aos cofres públicos.