Título: Recuperação extrajudicial só atinge três empresas no país
Autor: Baeta, Zínia
Fonte: Valor Econômico, 15/09/2008, Legislação & Tributos, p. E1

Recuperação extrajudicial só atinge três empresas no país

Desde que entrou em vigor, em junho de 2005, a nova Lei de Falências é considerada um sucesso por ter possibilitado a sobrevivência de empresas como a Parmalat e a Varig por meio de recuperações judiciais. A mesma avaliação, no entanto, não se aplica à recuperação extrajudicial. Em mais de três anos de vigência da nova legislação, apenas 12 empresas em todo o país pediram à Justiça a aprovação planos de recuperação extrajudicial, conforme um levantamento feito pela Serasa até agosto deste ano. Ainda assim, apenas três planos foram aceitos pelo Poder Judiciário até hoje. O último deles é o da Moura Schwark Construções, homologado pela Justiça de São Paulo no início deste mês. O instrumento, considerado um avanço em relação à lei anterior e uma alternativa à recuperação judicial - por ser menos burocrático, mais barato e célere - não despertou o interesse dos empresários, principalmente se observados o número de pedidos e homologações de planos de recuperação judicial no país. Foram 543 pedidos, sendo que 363 foram aceitos pela Justiça até agosto deste ano, conforme a Serasa.

A explicação de boa parte dos advogados e profissionais que atuam na restruturação de empresas para a baixa adesão à recuperação extrajudicial seria o fato de que o mecanismo não se aplicaria a qualquer empresa em dificuldade, mas apenas a situações muito específicas. Isso porque é necessário encontrar uma composição de credores - três quintos ou 60% - que aprovem a recuperação extrajudicial. Se isso ocorrer, o plano pode ser imposto aos discordantes.

"É necessário encontrar uma composição de credores que force os demais a aceitarem a recuperação", afirma Gilberto Deon Correa Júnior, sócio do escritório Veirano Advogados e advogado da Drogaria Proença, a primeira empresas do país a obter uma recuperação extrajudicial no país. O advogado afirma que a empresa já pagou 18 parcelas de um débito de R$ 300 mil negociados com os credores - bancos e fornecedores - em um prazo de seis anos e meio. Correa Júnior diz que a recuperação tem permitido que a pequena empresa - fundada em 1889 no município gaúcho de Quaraí - dê continuidade aos negócios. O pedido de recuperação extrajudicial ocorreu em dezembro de 2006 e a homologação saiu em março de 2007.

No caso da Moura Schwark Construções, além de uma composição favorável de credores, o que pesou na opção da empresa por uma recuperação extrajudicial foi o fato de esse mecanismo oferecer ao mercado uma segurança maior. Segundo o advogado que representa a empresa, Carlos Mazzuco, sócio do escritório MHMK, na recuperação judicial não se tem a segurança de que o plano vai ser aprovado. Na extrajudicial, o plano encaminhado ao Judiciário já está pré-aprovado. "A Moura é uma empresa de serviços, precisa de credibilidade e o comprador precisa saber se ele vai ou não ter a obra entregue", afirma. Além do fator imagem e credibilidade, o advogado afirma que a celeridade e o custo do instrumento foram considerados. Segundo ele, foram três meses para a homologação do plano pela Justiça. Uma recuperação judicial levaria muito mais tempo e gastos maiores com os editais, já que há a necessidade de realização de assembléias.

Apesar de ser mais barata, rápida e menos burocrática, a recuperação judicial tem ao menos três atrativos que uma recuperação extrajudicial não possui. O primeiro deles é o fato de a extrajudicial não blindar a empresa no período em que o plano é avaliado pelo juiz. Na judicial, há uma blindagem de 180 dias, período durante o qual não pode ocorrer execuções ou pedidos de falências. A Moura sofreu com cerca de 40 pedidos de execução e falência durante os três meses de espera pela homologação do plano - que estabelece um ano de carência e cinco anos para o pagamento dos credores quirografários (bancos e fornecedores), de uma dívida de R$ 20 milhões. Além disso, Mazzuco lembra que na recuperação extrajudicial quem compra ativos da empresa em dificuldade não está protegido da sucessão trabalhista e fiscal, como ocorre na judicial. "Se estivéssemos na lei anterior, provavelmente estaríamos em uma concordata, situação mais difícil. Hoje estamos operando normalmente", diz o presidente da construtora, Martin Schwark. Outro fator seria o fato de o crédito trabalhista não entrar na extrajudicial.

Outra empresa que está em recuperação extrajudicial, desde o ano passado, é o Frigocharque Paulista, localizado em Cajamar, no interior de São Paulo. Segundo o advogado que participou do processo, Luiz Fernando Paiva Valente, do Pinheiro Neto Advogados, o débito negociado na época foi de R$ 24 milhões para o pagamento em 36 meses sem correção ou em 72 meses para quem preferisse o pagamento com juros e correção.

Para Salvatore Milanese, sócio da área de reestruturação de empresas da KPMG - que participou do plano da Moura -, a recuperação extrajudicial só abrange empresas que conseguem fazer um trabalho preventivo e que não chegam a uma situação extrema em que precisem da blindagem oferecida pela recuperação judicial.