Título: Um ano positivo para a geração de empregos
Autor: Ricardo Berzoini
Fonte: Valor Econômico, 21/02/2005, Opinião, p. A8
Em artigo publicado neste jornal, em abril de 2004, procurei traçar um panorama do mercado de trabalho daquele momento, identificando as razões da aparente contradição entre os dados do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged), do Ministério do Trabalho e Emprego, e as taxas de desemprego apontadas pela Pesquisa Mensal de Emprego, do IBGE, e pela Pesquisa de Emprego e Desemprego, do Dieese e da Fundação Seade. Analisando os dados indicados pelo cadastro e pelas pesquisas, explicitei as razões da disparidade momentânea e projetei que "as medidas macro e microeconômicas já tomadas pelo nosso governo, que visam assegurar estabilidade econômica, com inflação baixa e juros progressivamente mais baixos, a ampliação da oferta de crédito em vários segmentos, a gestão do FGTS e FAT com foco no emprego, o crescimento das exportações e da demanda interna, deverão sustentar a geração de empregos em patamar capaz de reverter o crescimento do desemprego e gerar um novo ambiente no mercado de trabalho brasileiro". É necessário atualizar a análise, a partir das perspectivas da economia brasileira no início de 2005. Alcançamos o objetivo de geração de empregos em velocidade superior ao crescimento da população economicamente ativa (PEA). Chegamos, segundo o IBGE, a uma taxa de desemprego inferior a 10%, mais exatamente 9,6%, melhor marca desde a mudança de metodologia ocorrida em 2002. A geração de 1,5 milhão de empregos formais foi razoavelmente bem distribuída pelo território nacional. No segundo semestre, a geração de empregos cresceu fortemente nas regiões metropolitanas, que encerraram o ano com 5,58% de crescimento do estoque de empregos, contra 6,55% da média geral do país. Importante destacar que, nos 12 meses de 2004, a indústria cresceu bem mais que o setor agrícola, 9,36% ante 6,34%. Alguns segmentos, em especial calçados (19%), material de transporte (14,3%) e material elétrico (13,1%) destacaram-se, combinando crescimento no mercado interno com exportações em franco desenvolvimento. O dinamismo do campo, de papel fundamental para o crescimento interiorizado e para as contas externas, além do abastecimento interno, não gera ainda empregos duradouros em proporção ao seu crescimento, pois muitas atividades carregam a marca da sazonalidade, gerando importantes ocupações, mas que duram por alguns meses. Em dezembro, o emprego rural perdeu 125 mil postos, perdendo sua condição de líder desde janeiro da retomada do emprego, mas por uma característica sazonal. O ano de 2005 promete ser positivo para o emprego. Há incertezas, é claro: a dinâmica do câmbio neste início de ano pode afetar a ímpeto das exportações, embora os números da balança comercial prossigam positivos e os preços dos minérios e do café prometam compensações em relação à perda de valor da soja no mercado externo. Ademais, diversos segmentos que ganharam mercados em 2004 podem perder rentabilidade, mas não vão desperdiçar contratos duramente disputados. A balança comercial de janeiro aponta crescimento de 28,3% nas exportações e de 24,8% nas importações em relação a janeiro de 2004. Apesar do câmbio, o crescimento é vigoroso. Outra preocupação, os juros internos dependem essencialmente da realidade da inflação, e podem retomar a queda, convergindo novamente para taxas reais inferiores a 10%.
Chegamos a uma taxa de desemprego de 9,6%, melhor marca desde a mudança de metodologia, em 2002
O fato é que temos um mercado interno fortalecido, com mais de 2,2 milhões de trabalhadores formais em relação a 2002, a renda recupera-se gradualmente, com as negociações coletivas incluindo aumento real de salário, pois as empresas conseguem absorvê-lo. O crédito consignado permitiu melhores opções para os assalariados e aposentados. O programa Bolsa-Família já atinge 6 milhões de famílias, reforçando o consumo de baixo para cima. O salário mínimo, pela primeira vez, foi definido em dezembro, em R$ 300, com 9,3% de aumento real, o que permite à economia o planejamento desse impacto nas despesas e nas receitas decorrentes. O FGTS e o FAT projetam forte crescimento no crédito direcionado e os bancos públicos operam para acelerar a concessão de créditos para investimento. O FGTS, comparando 2004 e 2002, aplicou 73,7% mais recursos em saneamento, habitação e infra-estrutura urbana. O orçamento para 2005 é 49,3% maior. O BNDES planeja aplicar 50% mais em 2005 em relação ao executado no ano passado. Neste primeiro semestre, o Ministério do Trabalho e Emprego iniciará a operação do Programa Nacional do Microcrédito Produtivo Orientado, que disponibilizará até R$ 500 milhões para as entidades do segmento. Ou seja, as condições para o crescimento do emprego estão sendo implementadas. Cabe, portanto, ao governo e à sociedade aproveitar esses bons indicadores para reforçar nosso entusiasmo, sem descuidar dos problemas estruturais que permanecem: a renda média do trabalhador brasileiro ainda é baixa e temos de encontrar os caminhos da agregação de valor aos produtos e da produtividade para elevar esse vetor fundamental para o desenvolvimento do mercado interno. A participação da renda do trabalho na renda nacional perdeu 9% do PIB no governo passado. Nosso desafio é recuperar gradualmente essa perda, sem prejuízo para a competitividade interna e externa do país. O desemprego, que mudou, para pior entre 1995 e 2002, recupera a perspectiva de ficar em percentuais mais civilizados, mas ainda é muito alto. Muitos outros desafios remanescem. Mesmo assim, podemos afirmar, confiantes, que 2005 se inicia com outros ares para os trabalhadores em busca de emprego e renda dignos. O governo federal tem consciência de que o caminho é árduo, mas é possível desbravá-lo.