Título: Bancos suspendem empréstimos
Autor: Lucchesi, Cristiane Perini
Fonte: Valor Econômico, 17/09/2008, Finanças, p. C1

O agravamento da crise de liquidez e solvência no sistema financeiro internacional fez bancos estrangeiros suspenderem temporariamente operações de empréstimo sindicalizado (com a participação de vários bancos). Entre as que estavam abertas, há mais de US$ 12 bilhões em andamento.

Há bancos líderes nas transações que acionaram a cláusula de "mudanças materiais adversas", conhecida como "mac" (do inglês "material adverse change"), e retiraram garantias firmes de que iriam entregar um determinado crédito por um determinado prazo em uma determinada faixa de preço. A razão: o custo de captação dos bancos explodiu, chegando a 14% ao ano ontem. Depois da injeção de liquidez dos bancos centrais na Europa, Inglaterra, Estados Unidos, Japão e Austrália, que chegou a US$ 210 bilhões, os custos caíram para níveis em torno de 7% para os bancos menos afetados pela crise de hipotecas americanas.

A preocupação maior do mercado ontem era com a AIG. Pela manhã, o simples rebaixamento da nota de risco de crédito da seguradora pelas três agências de rating elevou a necessidade de capital dos bancos comerciais no mundo todo que usam o seguro da AIG nos seus portfólios de crédito, provocando uma redução de alavancagem e maior aperto de crédito.

A seguradora foi socorrida pelo Fed, banco central americano, pois do contrário haveria sério risco sistêmico. Até ontem, o Fed não podia emprestar diretamente para seguradoras, mas as linhas repassadas aos bancos não chegavam à AIG, que agora conseguiu US$ 85 bilhões em troca do controle acionário, que passou para o Tesouro. Os mercados devem reagir bem à novidade hoje.

Os rumores sobre o socorro à AIG e a decisão do Fed, de manter os juros básicos americanos estáveis em 2% ao ano, já ajudaram a tranqüilizar os investidores. A Bolsa de Valores de São Paulo subiu 1,68% e o índice Dow Jones, das ações mais negociadas em Nova York, subiu 1,30%. O dólar terminou com alta de 0,88%, a R$ 1,8240. Os juros caíram no mercado futuro brasileiro. O risco-Brasil medido pelo "swap" de crédito de vencimento em cinco anos chegou a 256 pontos básicos, alta de 33% ontem e de 65% na semana.

Inúmeros bancos estrangeiros querem esperar a poeira baixar antes de se comprometer com as empresas nos novos empréstimos. A situação é mais desconfortável para as companhias de capital nacional que ganharam as licitações para a construção de navios-sonda de perfuração de petróleo e plataformas semi-submersíveis já licitadas pela Petrobras: Odebrecht, Schahin, Delba, Petroserv e Etesco. A Queiroz Galvão também está com transação no mercado para reforma de casco de navio. Algumas dessas empresas já contrataram os fornecedores que vão construir os navios e plataformas e têm de seguir um cronograma de pagamentos. Os investimentos necessários são de US$ 7 bilhões a US$ 8 bilhões.

O Grupo Votorantim já conseguiu a certeza do JPMorgan de que vai ter o financiamento dos R$ 2,71 bilhões para aquisição da parte de 28% da Arapar na Aracruz Celulose, informa Luis Felipe Schiriak , diretor financeiro da Votorantim. "Em meio à crise, temos a garantia do crédito", afirmou Schiriak. Ele disse não poder revelar maiores detalhes da transação, nem os bancos interessados em participar. Segundo o Valor apurou, seriam o Santander, o HSBC e o Calyon. Os bancos também não quiseram se pronunciar.

Como a empresa resultante da fusão entre a Aracruz e a Votorantim Celulose e Papel será comandada por uma holding com participação de 50% do Grupo Safra e de 50% do Grupo Votorantim, há mudança no controle da VCP, hoje nas mãos do Grupo Votorantim. Nas cláusulas de empréstimos, há a determinação de que a mudança de controle da empresa provoca a antecipação do pagamento da dívida, que no caso da VCP chega ao total de US$ 1,3 bilhão. A VCP pediu o chamado "waiver" (autorização para o descumprimento da cláusula) aos bancos, confirmou Schiriak. Já conseguiu esse "waiver" de parte dos bancos, que acham que a empresa não terá problemas nesse sentido. Não é para menos: o caixa do Grupo Votorantim está em R$ 10 bilhões. "Estamos em uma situação comparativamente confortável para passar a crise, pois aproveitamos os bons momentos de mercado e alongamos nossa dívida", afirmou. "Não precisamos tomar qualquer linha a qualquer preço", disse.

A Companhia Siderúrgica Nacional também tem sobra de liquidez e optou por quitar eurobônus de US$ 350 milhões que venceu neste mês, informa Otávio Lazcano, diretor financeiro. A empresa permanece com caixa líquido de US$ 2 bilhões, diz ele. "Nosso lucro e geração de caixa operacional batem recorde após recorde e não precisamos ficar reféns do mercado nas condições atuais", diz ele. Segundo Lazcano, a empresa aproveitou os momentos favoráveis e melhorou seu perfil de endividamento e hoje não têm nenhum vencimento de dívida no curto prazo.