Título: Fraga prevê novos desdobramentos
Autor: Safatle, Claudia
Fonte: Valor Econômico, 16/09/2008, Finanças, p. C3
"A situação é bem dramática", comentou Arminio Fraga, sócio da Gávea Investimentos e ex-presidente do Banco Central, ao final do dia de ontem, com mais um "round" da crise financeira americana e suas conseqüências pelo resto do mundo. "Essa é uma crise enorme, com ramificações espalhadas pelo mundo e que acontece no centro e não na periferia (da economia internacional)". Não há previsão para o desfecho final dessa crise, que começou em agosto do ano passado e ainda deverá ter vários desdobramentos.
Pela posição do governo americano, que se recusou a financiar os potenciais compradores do Lehman Brothers, quarto maior banco de investimento dos Estados Unidos, que ontem pediu concordata, "está difícil extrair algum sinal de que vai tudo se resolver, salvo com uma medida muito drástica do governo dos EUA, na linha de garantir tudo ou coisa do gênero", disse Fraga. "Os sinais, no fim de semana, vieram em outra direção".
Excluindo uma extensão das garantias com assunção e administração das dívidas pelo governo americano, restariam apenas duas outras possibilidades para se chegar ao fim dessa turbulência: uma crise financeira ainda maior; ou o surgimento de soluções mais naturais no caminho, "que seriam mais polares e mais custosas", na avaliação do ex-presidente do Banco Central.
A decisão do governo dos EUA de não salvar o Lehman, depois de ter resgatado o Bear Stearn, a Fannie Mae e o Freddie Mac, pode ser vista como uma questão de princípios, de que "não dá para socorrer todo mundo e tem que ficar claro que quem fizer bobagem vai perder", avaliou, o que é uma postura até louvável no longo prazo, mas que no curto prazo implicará em pesados custos para o sistema.
Ontem, em meio à tentativas de assimilação desse novo capítulo da crise iniciada com os créditos hipotecários de alto risco (subprimes), e a absorção da Merrill Lynch pelo Bank of America, as preocupações ontem se voltavam para a gigante dos seguros, a American International Group (AIG), que buscava um empréstimo emergencial junto ao Federal Reserve (Fed). A principal seguradora americana, que valia cerca de US$ 250 bilhões e chegou a ter suas ações cotadas à US$ 73, ontem estava valendo apenas US$ 13 bilhões e suas ações caíram, em relação ao pico, 94%, passando a apenas US$ 4,70. Ao mesmo tempo, segundo Fraga, os "spreads" bancários subiram, na esmagadora maioria das instituições, entre 50 pontos base e 200 pontos base ao longo do dia.
No Brasil, embora os efeitos da crise apareçam com maior vigor no mercado de ações - ontem Ibovespa teve queda de 7,59%, seguindo o que aconteceu com as demais bolsas do mundo - a economia deverá ter uma desaceleração como resultado da desaceleração também das economias centrais. Não será nada drástico, acredita Fraga, "salvo alguma surpresa interna, alguma falha na condução da política econômico, que não creio que vá ocorrer". Os preços das principais commodities em queda, retração do mercado de capitais e um desaquecimento da oferta de crédito bancário vão resultar em menor taxa de crescimento. É isso que o governo também espera. "No geral, se olharmos a nossa história, entramos nessa crise com as variáveis econômicas bem posicionadas, e isso já está aí há uma década", concluiu.