Título: Caso do algodão servirá de base para processo da soja
Autor: Assis Moreira e Tatiana Bautzer
Fonte: Valor Econômico, 21/02/2005, Agronegócios, p. B9

A decisão final do processo aberto pelo Brasil na OMC contra os subsídios dos EUA ao algodão, que sairá em duas semanas (3 de março), servirá de base para um eventual confronto brasileiro contra os subsídios americanos à soja. A expectativa é que o Órgão de Apelação da OMC não mude substancialmente a decisão parcial, confirmando a vitória brasileira. Mas analistas alertam que o Brasil terá mais dificuldade para provar que os subsídios dos EUA causam prejuízos aos sojicultores brasileiros. Os americanos citam o enorme avanço da produção de soja no Brasil e da fatia de mercado do país, comparado à produção estagnada (exceto na safra 2004/05, recorde) e à perda de mercado dos EUA. A vitória no algodão, em todo caso, é importante para o mundo inteiro. Não se questiona a concessão dos subsídios em si, mas o efeito dessa prática, como queda de preços e obtenção de maior fatia de comércio dos produtos subsidiados. Na prática, os árbitros da OMC dirão quais as regras de subsídios aplicáveis ao comércio agrícola e como se determinará "prejuízo sério" a exportadores concorrentes quando um país subsidia. Na primeira fase, o painel (comitê de arbitragem) do algodão deu um enorme passo. Estabelecer que, se um subsídio superar o teto que um país se comprometeu a respeitar pelo Acordo Agrícola da OMC, significa que começam a valer as regras do Acordo de Subsídios e Medidas compensatórias. E essas disciplinas são mais rígidas que o Acordo Agrícola, favorecendo os países que não subsidiam. Mas, como normalmente acontece no Órgão de Apelação, pode haver revisões. Que podem não mudar a vitória geral, mas atenuar a derrota do acusado. Em reunião hoje com o ministro da Agricultura, Roberto Rodrigues, o subsecretário de assuntos econômicos do Itamaraty, Clodoaldo Hugueney, não poderá fugir dessa evidência. Mesmo em caso de a vitória brasileira ser ratificada na íntegra pela OMC, não quer dizer que as determinações serão cumpridas. Existe a possibilidade de os EUA esperarem até o fim da Rodada de Doha para acatá-las. O argumento para isso seria uma mudança abrangente na legislação de subsídios agrícolas do país, a "Farm Bill". Ela trata das várias culturas subsidiadas, e os EUA preferem fazer toda a mudança necessária na lei de uma só vez. Confrontado com essa hipótese em seminário recente, o coordenador de disputas de comércio do Itamaraty, Roberto Azevedo, disse que os países em desenvolvimento não vão "pagar duas vezes" pela redução de subsídios nos casos do algodão e do açúcar (contra a União Européia), os dois casos de maior distorção provocada por subsídios.