Título: Modelo atual de bancos de investimento entra em crise
Autor: Nascimento, Iolanda
Fonte: Gazeta Mercantil, 23/09/2008, Finanças, p. B2

São Paulo, 23 de Setembro de 2008 - A rápida aprovação do Federal Reserve para que o Goldman Sachs e o Morgan Stanley possam operar como banco comercial e o anúncio ontem de que o Morgan fechou acordo para vender uma participação ao Mitsubishi não revelam apenas que essas centenárias companhias dos Estados Unidos precisam urgentemente de liquidez para sobreviver. Conforme especialistas, não foram apenas as marcas, e os caixas, dessas instituições que sofreram com a crise do subprime, mas o próprio modelo de negócio em que atuam: o de banco de investimento, atualmente desacreditado pelo investidor. Principal protagonista e também um dos segmentos mais afetados pelo colapso do mercado de hipotecas de alto risco dos Estados Unidos, os bancos de investimento da maneira como estão hoje deverão desaparecer e poucos devem sobreviver somente como tal, particularmente nos Estados Unidos, opinam os analistas. A semana passada foi marcada pelo derretimento de duas tradicionais instituições norte-americanas desse segmento: o Lehman Brothers, em processo de concordata, e o Merrill Lynch, comprado a preço de ocasião pelo Bank of America, assim como foi adquirido o também tradicional Bear Stearns em março último pelo J.P. Morgan. Resta ainda a expectativa de um desfecho para os outros dois últimos grandes sobreviventes desse mercado, o Goldman e o Morgan, vistos como possíveis próximas vítimas, se as últimas medidas não trouxerem resultados a contento. Os últimos números mostram que o Morgan Stanley já registrou baixas contáveis e prejuízos de US$ 14,4 bilhões desde o início do problema, tendo conseguido US$ 5,6 bilhões em novo capital. Já o Goldman Sachs computou perdas de US$ 3,8 bilhões, ante uma injeção de recursos de US$ 600 milhões. Com o pedido de concordata, o Lehman anunciou um rombo de mais de US$ 600 bilhões. A maior parte dos similares europeus também contabiliza perdas astronômicas, bem como alguns asiáticos. Os suíços UBS e Credit Suisse Group, por exemplos, perderam até agora US$ 44,2 bilhões e US$ 10 bilhões, respectivamente. Isso tudo é resultado de um desvirtuamento da atuação, afirma Luís Miguel Santacreu, analista de instituições financeiras da Austin Rating. Os bancos mais envolvidos na crise do subprime perderam sua identidade mais clássica e positiva, vinculada à prestação de serviços de corretagem, de negociação no mercado primário de ações e de renda fixa, de assessoria e financiamento em fusões e aquisições. "Esse modelo de negócio de captar recursos de curto prazo e alavancar ativos para operações de crédito fabricadas é equivocado e não vai sobreviver, nem deveria ter existido, ainda mais fora do controle das autoridades", diz Santacreu, explicando que instrumentos financeiros, que permitem maior alavancagem como os derivativos de crédito, devem também desaparecer. "O derivativo é positivo quando tem a função de mitigação de risco. Quando se torna instrumento de alavancagem desmesurada e sai do controle das bolsas de valores, é um grande risco, como mostrou o subprime", diz Santacreu, observando que acredita na sobrevivência de bancos de investimentos como tal somente com muita disciplina. Márcio Peppe, sócio-diretor da área de riscos de instituições financeiras da BDO Trevisan, diz que a imagem da atividade ficou bastante arranhada, o que gera receio dos investidores e poderá ameaçar a continuidade do negócio, já que os bancos de investimentos dependem exclusivamente desse capital. Para cobrir essa falta de liquidez e os prejuízos já registrados é que bancos como o Morgan e o Goldman buscam saídas como a ampliação da atuação para a área comercial, onde passam a ter acesso a depósitos e deixam de ter maiores dificuldades para a formação de funding, e a injeção de capital de terceiros, por meio de venda de participação ou associação. (Gazeta Mercantil/Finanças & Mercados - Pág. 2)(Iolanda Nascimento)