Título: Juristas querem aperfeiçoar a Constituição
Autor: Queiroga, Andrezza ; Bompan, Fernanda
Fonte: Gazeta Mercantil, 01/10/2008, Direito Corporativo, p. A12

1 de Outubro de 2008 - "Esta Constituição terá cheiro de amanhã e não de mofo." A frase, de Ulisses Guimarães, foi usada pelo relator constituinte e jurista Bernardo Cabral, para resumir o significado da Carta 20 anos depois. Criticada pela sua extensão, com 245 artigos, ele relembra que, inicialmente, havia 2.500 artigos. Para ele, o maior mérito da Constituição "é a consagração do respeito aos direitos humanos como princípio fundamental". Entre outras virtudes citadas pelo jurista estão a garantia da ampla defesa e o fortalecimento do Ministério Público e do Judiciário no combate à corrupção. Cabral questionou, ainda, a acusação de ingovernabilidade que a Carta teria para alguns. "Como o País ficou ingovernável com esta Constituição, se foi ela que permitiu a passagem democrática dos governos entre Fernando Collor de Mello e Itamar Franco", disse no segundo e último dia do Congresso Vinte Anos de Constituição, da Academia Internacional de Direito e Economia, no Espaço Cultural do Centro de Integração Empresa-Escola (CIEE), em São Paulo. O evento teve da Gazeta Mercantil e do Jornal do Brasil, que integram a Companhia Brasileira de Multimídia (CBM). Sistema tributário O jurista, apesar de ter sido o relator, não se eximiu de criticar o sistema tributário, a reforma agrária e a manutenção e existência da medida provisória, já que ela foi elaborada para um sistema parlamentarista e não presidencialista. "Hoje qualquer que seja o presidente usurpa o poder do Congresso e legisla", justifica. Entretanto, mesmo admitindo os problemas, ele cita Fernando Pessoa para resumir sua experiência: "Ó mar salgado, quanto do teu sal/ são lágrimas de Portugal!/ Por ti cruzarmos, quantas mães choraram,/ Quantos filhos em vão rezaram!/ Quantas noivas ficaram por casar/ para que fosses nossos, ó mar!/ Valeu a pena? Tudo vale a pena/ se a alma não é pequena..." Direitos "A Constituição garante direitos, como da propriedade, que são, muitas vezes, infringidos por movimentos sociais, os quais se julgam vítimas do Estado de direito", afirmou o professor e filósofo Denis Lerrer Rosenfield. Ele acredita que órgãos do Estado, como Incra e Funai, dão força e legitimidade para abusos de movimentos sociais. Através de estudo, ele explica que sua afirmação tem por base dados dos órgãos, como por exemplo, o fato de existir mais de 320 mil índios - sendo que, a maioria, mora nas cidades - para 108 milhões de hectares de terra. Para ele, os direitos humanos são usados para cometer abusos. Críticas O advogado Antônio Carlos Mariz de Oliveira criticou a mídia no que se refere à divulgação de presos como criminosos já julgados. Para ele, a Constituição tem pontos progressistas e aspectos nos quais ainda "engatinha". O caso do grampo telefônico foi lembrado pelo ministro aposentado do Supremo Tribunal Federal (STF), Francisco Rezek. "Os que fazem grampo hoje, a qualquer momento passarão para o calabouço e para a tortura, não tenham dúvidas." Para a presidente do Tribunal Regional Federal da Terceira Região (SP), Marli Ferreira, "o Brasil não tem uma política ambiental efetiva e sofre de uma crise ética". Também foram citados os problemas com os planos de saúde. "A Carta não define o que seria público e o que seria privado", alfineta o ex-ministro da Previdência e Assistência Social do governo de Fernando Henrique Cardoso, José Cechin. Trabalho A Constituição sofreu repreensões do advogado Wagner Balera, que lembrou, também, ser preciso estabelecer uma idade mínima para a aposentadoria. Entretanto, afirmou que a Carta trouxe a isonomia entre os trabalhadores urbanos e rurais. O advogado Estevão Mallet e o ministro aposentado do Tribunal Superior do Trabalho (TST), Almir Pazzianotto Pinto, também abordaram a questão trabalhista, mas criticaram a terceirização e a utilização da pessoa jurídica. Pazzianotto foi além e disse que o aspecto mais problemático e a marca registrada das relações de trabalho "é a insegurança do trabalhador". O advogado Antonio Carlos Rodrigues do Amaral levantou a questão sobre a moralidade atrelada à aplicação da Constituição, com exemplos como o aborto e as células-tronco. Ele disse que os assuntos têm que ser discutidos amplamente, com ética e não somente pela lei. (Gazeta Mercantil/Caderno A - Pág. 12)(Andrezza Queiroga, Fernanda Bompan e Leda Rosa)