Título: Acordo é vítima da falta geral de autoridade
Autor: Jr, Osmar Freitas
Fonte: Gazeta Mercantil, 01/10/2008, Internacional, p. A14
Nova York, 1 de Outubro de 2008 - No domingo, 28, cerca de duas mil pessoas foram à Wall Street para protestar contra o pacote governamental de US$ 700 bilhões para a recuperação financeira. A multidão saiu de frente do prédio vazio da Bolsa e foi para o meio de Manhattan, em Times Square. Lá já haviam arregimentado mais dois mil manifestantes. As cenas de revolta se repetiam da Flórida a Ohio - dois estados considerados fundamentais e indefinidos nas eleições de 4 de novembro. A irritação do americano médio deu sinais claros de que se preparavam represálias eleitorais, não apenas aos candidatos presidenciais, mas também aos que concorrem a vagas na Câmara. A segunda chegou com a surpresa da rejeição do acordo. Naquela noite, depois dos noticiários explicarem melhor as implicações do fracasso da aprovação, a maré política começou a virar. Aprendia-se que o crédito, e empregos, do cidadão comum corriam riscos de evaporação. Cobrava-se, então, furiosamente uma atitude positiva de Washington. "É isso o que acontece quando se perde totalmente a liderança num país", sentenciou o ex-presidente Jimmy Carter. Ele sabe o que diz: perdeu o cargo devido à debacle econômica em seu governo. A falência de autoridade das lideranças político-econômicas, na terça feira após o choque, era tão palpável quanto os 778 pontos perdidos na Bolsa de Nova York. Os prejuízos somaram nada menos do que US$ 1 trilhão. Quantia muito acima dos US$ 700 bilhões esmolados pelo governo Bush, e que saiu em parte de fundos de pensão e portifólios de pequenos aplicadores. Wall Street recuperaria boa parte desta queda na terça-feira, com subida de 485 pontos, mas a escalada foi impulsionada por caçadores de barganhas que arremataram papéis desvalorizados, na espera de futuros lucros. O rombo financeiro não seria nivelado na casa do trilhão de dólares. No domingo e início da segunda-feira, lideranças bipartidárias, comemoraram frente às câmaras de TV, um suposto sucesso para o acordo. Imaginavam ter garantido os votos para a aprovar o pacote. Os candidatos presidenciais colocaram apoio mais definitivo ao acerto. O próprio presidente, em seu primeiro pronunciamento, saudou o compromisso. Seria, como se viu, uma queima antecipada de fogos. E após 40 minutos de votação na Câmara - tempo que excede o protocolo regulamentar - verificou-se que o chamado baixo clero estava amotinado. As lideranças, republicanas e democratas, mostravam ao mundo que não chefiam. "O presidente está desacreditado e não tem cacife para fazer pressão, nem mesmo em seu partido. Os líderes republicanos não conseguiram conter dissidências. E a maioria democrata não queria e não trabalhou para aprovar um pacote de salvamento para uma crise arquitetada pela presidência republicana. O que se viu foi a completa falta de autoridade", disse Carter. Bodes expiatórios não faltaram. O presidente Bush, é claro, encabeçava a lista de vilões. Mas desde a líder da maioria democrata no Senado, Nancy Pelosi, até o relativamente desimportante deputado republicano Darrell Issa ¿ que disse não ao pacote por achar que ofendia o legado liberalizante de Ronald Reagan - ninguém foi poupado dos respingos da culpabilidade pelo insucesso. O candidato republicano a herdar esta crise, John McCain, a princípio teve reação automática e acusou seu rival democrata Barack Obama pela derrota do pacote. "McCain é quem tem mais a perder com este fracasso. Ele tentou aparecer como salvador do acordo, interrompendo supostamente sua campanha, forçando uma reunião entre lideranças políticas, o presidente e seu concorrente em Washington, para, segundo disse, fechar o pacote. Não apresentou nenhuma alternativa, não conseguiu sequer convencer nenhum dos deputados de seu Estado, Arizona, a votar a favor (sete dos 11 deputados de Illinois, estado de Obama, votaram "Sim") e foi às televisões cantar vitória na manhã da derrota. As primeira pesquisas confirmam que ele perdeu, no mínimo, dois pontos percentuais para Obama neste episódio. Ainda é cedo para ver a quanto se estende esta perda", diz o analista independente de pesquisas da rede NBC, Chuck Todd. A maioria dos institutos de pesquisa dão média de 5 pontos percentuais de vantagem ao candidato Obama sobre McCain. Para o legislativo, a média aponta para 55,5% de eleitos democratas, contra 42,5% para republicanos. E os analistas acreditam que esta maioria deve aumentar ainda mais, nas novas pesquisas pós-catástrofe do pacote. "As pessoas estão começando a aprender que a ausência do plano de resgate atinge em cheio suas finanças, e a culpa do fracasso no acordo está sendo colocada mais sobre as costas de republicanos", diz Todd.Para remediar esta debacle e o medo de maiores prejuízos nas urnas, confirmado por fonte- que exigiu anonimato ao comentar política interna - da campanha McCain, o candidato lançou a idéia de aumentar o seguro governamental aos depósitos bancários ¿ garantidos até US$ 100 mil- para um patamar de US$ 250 mil. Chegou um pouco atrasado nesta proposta: Barack Obama fez a mesma sugestão uma hora antes do republicano. "A vantagem desta manobra é que ela dá mais confiança aos poupadores, de que seu dinheiro está garantido. Isso evitaria uma corrida aos bancos para saques e a piora catastrófica da crise. Os bancos também se sentem mais seguros. Não haveria com isso aumento do crédito, mas pelo menos forneceria um pouco mais de tranquilidade", diz o senador democratas nova-iorquino Charles Schumer. Esta idéia, segundo deputados dos dois partidos, deverá ser incorporada na seleção de medidas tomadas. Fora ela, segundo o senador Schumer, o novo pacote será muito parecido com o velho. Basicamente, dividirá os US$ 700 bilhões em parcelas: US$ 250 bilhões já, mais US$ 100 bilhões, caso o presidente ache necessário. Outros US$ 350 bilhões ficariam sob a guarda do Congresso, que pode segurar a liberação, caso não goste dos resultados do programa. Assim, o Legislativo limita o controle do Executivo. Some-se a este acordo, medidas populistas como: fixação de teto para a compensação de grandes executivos do mercado financeiro, possíveis renegociações de financiamentos aos compradores de imóveis inadimplentes, extensão do seguro desemprego, e cláusulas de segurança aos contribuintes ainda a serem estipuladas. E, em meio ao tormenta econômica, os democratas esperam um tsunami de votos a seu favor. (Gazeta Mercantil/Caderno A - Pág. 14)(Osmar Freitas Jr.)