Título: Commodity leva Ibovespa a cair 7,34%
Autor: Carvalho, Jiane
Fonte: Gazeta Mercantil, 03/10/2008, Finanças, p. B1

São Paulo, 3 de Outubro de 2008 - A Bolsa de Valores de São Paulo (Bovespa) esteve ontem muito perto de disparar o segundo circuit breaker na semana. O pregão chegou a cair 9,4%, bem próximo dos 10% que acionam a parada técnica, mas desacelerou o movimento de baixa no final do dia. O Ibovespa desabou 7,34%, a 46.145 pontos, pressionado pelo movimento global de aversão ao risco, constantemente realimentado pelo medo de uma recessão. O giro financeiro da bolsa ficou em R$ 5,59 bilhões. A semana tem sido uma das piores para a bolsa brasileira desde que a crise das hipotecas subprimes se agravou. Na última segunda-feira, quando o circuit breaker foi acionado após nove anos inativo, o Ibovespa recuou 9,36%. No acumulado da semana, a baixa no principal índice da Bovespa chega a 9,13% e no ano é de 25,59%. A quinta-feira, comprimida entre a aprovação do pacote de socorro ao setor financeiro pelo Senado e sua votação na Câmara, foi particularmente ruim para os mercados acionários globais. Investidores ainda digeriam as mudanças feitas na proposta original de ajuda e que elevaram o socorro proposto pelo Tesouro de US$ 700 bilhões para US$ 850 bilhões e já se preocupavam com os desdobramentos na Câmara. "Teve todo tipo de boato circulando no mercado, uma hora os deputados iriam rejeitar a proposta em represália à sua aprovação no Senado, depois diziam que metade do pacote iria cair", comenta Alexandre Póvoa, sócio-diretor da Modal Asset. "E quanto mais tempo eles demorarem para aprovar o pacote, a tendência é de o nervosismo se acentuar causando ainda mais volatilidade." As incertezas do ponto de vista político também derrubaram os mercados acionários norte-americanos. O índice Dow Jones, da Bolsa de Nova York, fechou em queda de 3,2%, enquanto o S&P 500 recuou 4,5%. A queda das ações na Bovespa foi mais acentuada quando comparada a Wall Street por conta de fatores particulares. Como as ações de empresas ligadas a commodities representam aproximadamente 60% do Ibovespa, o movimento de recuo nos preços de produtos como petróleo, soja, milho e trigo potencializa a queda na bolsa brasileira. O preço do barril de petróleo tipo WTI, com vencimento em novembro, caiu 4,6% em Nova York, cotado a US$ 94. As ações PN da Petrobras recuaram 7,70% e a Vale PN fechou em queda de 10,09% A alta na cotação do dólar, que ontem chegou a R$ 2,021, também estimula a saída da bolsa brasileira. "O desmonte de posições na bolsa e em real é muito grande. A incerteza leva todos a buscarem proteção", explica Póvoa. "Com o cenário incerto e o receio de que o dólar suba ainda mais, investidores tendem a antecipar sua saída da Bovespa enquanto a cotação ainda não é tão alta." Quanto maior o dólar, maior o custo para o estrangeiro deixar a bolsa e remeter os recursos ao exterior, por isso a tendência de antecipação do movimento. A quinta-feira também foi marcada por um discurso considerado pessimista por parte do presidente do Banco Central Europeu (BCE), Jean-Claude Trichet, ao comentar a manutenção dos juros em 4,25% ao ano. Os comentários de Trichet após a reunião foram entendidos como sinalizadores de um corte mais à frente na taxa. "Ele praticamente preparou o mercado para uma queda na taxa mesmo antes da próxima reunião, o que indica uma situação econômica ruim na região", avalia Daniel Goraiebi, analista da corretora Spinelli. As declarações de Trichet fizeram o euro cair em relação ao dólar, o que também pressiona o preço das commodities. "Um movimento leva a outro e, no fundo, tudo está ligado a uma provável recessão global." O atual nível do Ibovespa, em 46.145pontos, embora considerado exageradamente baixo pelos analistas, não deve subir muito este ano. "O que está ocorrendo não tem muito a ver com fundamento, mas com desmonte de posições por conta da aversão ao risco", diz Póvoa, da Modal Asset. Mesmo que o pacote de ajuda aos bancos seja aprovado pela Câmara norte-americana, dificilmente provocará uma recuperação forte das bolsas globais. "De imediato, o pacote diminuirá o problema da falta de liquidez e pode reduzir a volatilidade dos mercados, mas o temor de uma recessão seguirá afetando os negócios", diz Goraiebi, da Spinelli. Para o analista, hoje o preço justo do Ibovespa, levando em consideração uma alta real no lucro das empresas e descontada a queda no preço das commodities, seria em torno dos 65 mil pontos, mas isso não deve ocorrer tão cedo. "Isso daria um potencial de valorização de 40%, o que é improvável. Se o índice tirar os exageros da queda, deve chegar a, no máximo, uns 53 mil pontos." Póvoa, da Modal, também não está muito otimista. "É claro que os preços estão baixos e não é o fundamento que explica isso, mas tem de olhar para a frente, para comprar agora precisa ser para um horizonte de dois ou três anos", diz ele. (Gazeta Mercantil/Finanças & Mercados - Pág. 1)(Jiane Carvalho)