Título: Enquadrados pela presidente
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Fonte: Correio Braziliense, 11/03/2011, Política, p. 2

¿Não aceito que um cartão de segurança cause uma pane dessas. Simplesmente, isso não existe. Quero que refaçam as investigações e levem à população o que realmente ocorreu, de forma didática. Nem que precisemos ficar sem dormir até ter a resposta¿. A frase é da presidente Dilma Rousseff. Foi dita a uma plateia masculina repleta de integrantes do setor elétrico, capitaneado pelo ministro Edison Lobão, durante reunião de emergência para tratar do apagão que deixou oito estados do Nordeste às escuras por cinco horas em 3 de fevereiro.

O episódio foi, segundo assessores, a maior descompostura que Dilma passou em sua equipe. Quem acompanhou de perto garante que poucas vezes ela ficou tão irritada desde que assumiu a Presidência. Mas as broncas da presidente na equipe não são raridade. Elas têm feito, inclusive, integrantes do primeiro escalão do Executivo e até do Legislativo adotarem postura recatada. Desde que a petista assumiu o Planalto, é difícil encontrar ministro que dê entrevistas com declarações que vão além do protocolar ou lavando roupa suja em público. A indicação é clara: menos é mais.

Há duas semanas, por exemplo, a reportagem do Correio ligou para o Ministério da Justiça pedindo entrevista com a secretária Nacional de Segurança Pública, Regina Miki. A solicitação foi negada sob a justificativa de que funcionários da pasta só poderiam dar declarações à imprensa depois de oficialmente empossados. O nome de Regina ainda não tinha sido publicado no Diário Oficial da União. A norma é novidade no órgão e foi decidida depois que a presidente Dilma Rousseff não gostou de uma entrevista dada por Pedro Abramovay ¿ que ainda aguardava os trâmites oficiais para assumir a Secretaria Nacional de Políticas Sobre Drogas ¿ e cobrou que o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, ¿desconvidasse¿ o futuro secretário. A ida de Abramovay para a secretaria não se concretizou.

Nem os militares, com quem presidentes civis costumam ter relação tensa, escaparam das cobranças. No terceiro dia de governo, logo após ter tomado posse como ministro-chefe do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), o general José Elito Siqueira falou aos repórteres sobre o que achava da Comissão da Verdade, projeto que tem a intenção de investigar abusos e crimes cometidos na ditadura militar. ¿Nós temos que ver o 31 de março de 1964 como dado histórico, com prós e contras. Da mesma forma, os desaparecidos são história da nação, e nós não temos que nos envergonhar ou nos vangloriar. Nós temos que enfrentar, discutir, estudar como fato histórico¿, ressaltou. A frase foi suficiente.

No dia seguinte, Elito foi chamado ao gabinete de Dilma Rousseff e, na presença do ministro-chefe da Casa Civil, Antonio Palocci, foi duramente cobrado pela presidente. A ditadura é tema delicado para ela, presa e torturada naquele período. O general voltou a público para dizer que foi mal interpretado pela imprensa e, desde então, só concede entrevistas em raras ocasiões.

Porta-voz Em alguns casos, quem tem feito as vezes de anteparo entre a presidente e o primeiro escalão é o ministro da Casa Civil, Antônio Palocci. Cabe a ele, em várias situações, fazer cobranças em nome da presidente. Foi assim que o ministro dos Esportes, Orlando Silva, acabou cobrado sobre a interferência nas negociações para a chefia da Autoridade Pública Olímpica e sobre as denúncias de irregularidades no programa Segundo Tempo.

Quando Dilma entra em campo, é para dar a palavra final. Foi assim, por exemplo, com Guido Mantega, quando dos cortes do Orçamento 2011 que atingiram o projeto Minha Casa, Minha Vida. Naqueles dias de anúncio, Dilma chamou Mantega e mandou que refizesse as contas para não atrasar ainda mais o programa. Geralmente, nessas conversas mais tensas, ela repete os bordões ¿não podemos errar¿ e ¿quero dados precisos¿.

Cada um na sua Se tem uma coisa que Dilma não aceita é perder tempo. Por isso, a presidente prefere reunir os ministros por grupos temáticos para deixar todas as áreas afins inteiradas do mesmo assunto de forma a evitar que um ministério que tem um pedaço de um projeto termine por atrasar sua implantação. No que se refere a aposentadorias e pensões, por exemplo, ela tem feito reuniões que envolvem os titulares da Previdência, da Fazenda e do Desenvolvimento Social, para elaboração de programas sociais.