Título: Aneel vai à SDE contra Petrobras
Autor: Morais, Márcio de
Fonte: Gazeta Mercantil, 06/10/2008, Infra-Estrutura, p. C6

Brasília, 6 de Outubro de 2008 - A Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) levou o caso dos subsídios da Conta de Consumo de Combustíveis Fósseis (CCC), que garante a geração mais barata de energia às populações de regiões remotas do País, para a Secretaria de Direito Econômico (SDE) do Ministério da Justiça. A agência considera que há prática abusiva e anticompetitiva da Petrobras nos preços que cobra pelos combustíveis e isso provoca uma sangria, estimada em R$ 946 milhões este ano. "O descolamento entre o preço praticado no varejo e aquele imposto à CCC acarreta ônus excessivo e injustificável aos consumidores", queixa-se a agência, na nota técnica que propõe o corte. O problema, segundo a Aneel, está no preço pago pela Eletrobrás de R$ 1,381 por um litro de óleo combustível. A Agência Nacional de Petróleo (ANP) cota em sua página na internet o mesmo litro por R$ 0,80. A diferença de 73% é custeada pelos 60 milhões de consumidores de energia do País, para baratear a geração de luz das usinas termelétricas de seis estados do Norte (Acre, Amazonas, Amapá, Pará, Rondônia, e Roraima) , um do Centro-Oeste (Mato Grosso) e dois do Nordeste (Pernambuco e Bahia). Gastos de US$ 3 bilhões Esse sobrepreço é ainda maior no óleo combustível leve, que, ao preço de R$ 1,486 cobrado pela Petrobras Distribuidora, é 86% mais caro que a cotação da ANP, sem contestação da Eletrobrás. E se repete no óleo diesel, que também tem sobrepreços significativos, de 4% a 42% (no tipo comum) e 10% (tipo leve). A luz elétrica gerada com a queima desses quatro tipos de combustíveis (óleo combustível, óleo combustível leve, óleo diesel e óleo diesel leve) beneficia 348 áreas geográficas e seus municípios, não atendidos pelo Sistema Interligado Nacional (SIN). No centro de tudo isso, há uma Conta de Consumo de Combustíveis Fósseis (CCC), que é administrada pela Eletrobrás para intermediar a arrecadação e o repasse do subsídio às usinas termelétricas. Para este ano, a Aneel autorizou gastos de R$ 3 bilhões para compra de combustíveis pela CCC, mas a proposta da Eletrobrás pedia R$ 3,79 bilhões, dos quais foram retirados, ainda na fase de discussão, no início do ano, R$ 794 milhões. Divergências sobre preço A Eletrobrás previa reajuste de 15,1% sobre os valores de 2007. O argumento da Eletrobrás para tal reajuste é que houve elevação nos preços dos combustíveis e elevação do consumo do diesel leve, usado para dar melhor desempenho aos equipamentos com vida útil comprometida. "Com esses argumentos, prontamente rebatidos e não acatados pela Aneel, a Eletrobrás buscou justificar a elevação de 15,1%", informa a documentação sobre o assunto. Relatório da Aneel informa, no entanto, que não houve desgaste tão perceptível do parque gerador que justificasse o aumento do dispêndio com aquele tipo de óleo (diesel leve). Após analisar os dados disponíveis sobre preços de combustíveis, na página da ANP na internet, a Aneel só reconheceu um aumento de 4,6%. Depois desse episódio, a Aneel ainda identificou a sangria provocada pelo descolamento entre os preços de mercado e os efetivamente pagos à Petrobras. Desconto de R$ 1 bilhão A Aneel, agora, se recusa a autorizar o repasse de quase um terço do valor da CCC. A agência quer abater quase R$ 1 bilhão da conta no exercício de 2009, já que a falta de norma que permitisse a exclusão desse valor impediu que aplicasse tal redução no atual exercício. Para corrigir a ausência de regra, a Aneel discute no momento a edição da norma para aperfeiçoar o mecanismo de subsídio, atualmente regulado pela Resolução 350/99. Uma proposta da agência nesse sentido está em consulta pública e, ao ser submetida a uma audiência pública na semana passada, não obteve qualquer contribuição do público. Prática abusiva Sem fornecer maiores detalhes, a SDE confirmou a abertura de processo para apurar as denúncias da Aneel contra a Petrobras. Em nota, informou à Gazeta Mercantil, que, no momento, tudo não passa de suposição. "Há averiguação preliminar que trata do suposto abuso de posição dominante da Petrobras em relação à venda de combustível para usinas termelétricas que compram tal combustível com recursos da Conta CCC", informou a SDE, por meio da assessoria de imprensa. A Petrobras não respondeu às solicitações para posicionar-se sobre o assunto, encaminhadas pela reportagem na quinta e sexta-feira últimas. "A CCC desembolsará R$ 964 milhões apenas para subsidiar a diferença entre os preços de mercado da região Norte e os preços praticados à conta (CCC)", diz o documento interno da Aneel, que integra o conjunto de conclusões que ajudou a formatar a denúncia na SDE. Como funciona Um pequeno valor, embutido na fatura mensal de luz, é recolhido pelas distribuidoras de energia do consumidor e destinado à Conta de Consumo de Combustíveis Fósseis (CCC). A Eletrobrás recolhe o que é arrecadado e repassa às usinas térmicas. Os valores citados acima são os pagos pela Manaus Energia (Mesa), mas variam de uma para outra usina. Para a usina Jari, por exemplo, o mesmo combustível custa apenas 11% mais caro. Uma lei de 2002 (10.438) deu poderes à Aneel para adotar mecanismos que induzam a eficiência econômica e energética das geradoras que se beneficiam da CCC, bem como a utilização de recursos energéticos locais dos sistemas isolados. O objetivo da medida é permitir que a geração de energia com cobertura da CCC atinja a sustentabilidade econômica ao término de 20 anos. Reembolso dos custos Com base numa análise dos preços de geração hidráulica que resultaram do leilão de energia realizado em 2004 (para entrega em 2006), a Aneel concluiu que teria de promover uma atualização de 59,60% no valor da Tarifa de Energia Hidráulica Equivalente (TEH), criada para aproximar o custo de geração dos sistemas isolados da média de geração hidráulica do sistema nacional interligado (SIN). A aplicação desse reajuste termina este ano e, por isso, a partir de 2009 só será permitido o reembolso do custo incorrido na aquisição de combustíveis. Caso os valores cobrados à CCC pelas distribuidoras forem maior que as cotações de preço da Agência Nacional do Petróleo, a concessionária terá de se justificar à Agência Nacional de Energia Elétrica no prazo de 15 dias após o reembolso. Os reembolsos subseqüentes estão limitados aos preços de referência publicados pela ANP, até que a reguladora elétrica acate as justificativas. (Gazeta Mercantil/Caderno C - Pág. 6)(Márcio de Morais)