Título: BC avisa que juros vão subir menos
Autor: Martins, Victor
Fonte: Correio Braziliense, 11/03/2011, Economia, p. 9

O Banco Central jogou no colo do ministro da Fazenda, Guido Mantega, os rumos que tomará a política de juros no Brasil. Por meio da ata do Comitê de Política Monetária (Copom), divulgada ontem, a instituição condicionou as suas ações a um superavit primário consistente (economia para pagar os juros da dívida) e à efetivação do corte de R$ 50 bilhões no Orçamento. Para o BC, chegou a hora de Mantega se desvencilhar de vez da fama de gastador e cumprir o que promete. Ou seja, se realmente quer uma alta mais branda da taxa básica (Selic), o ministro deve fazer a sua parte. A se confirmar esse quadro, as apostas são de apenas mais duas elevações dos juros de 0,25 ponto percentual cada ou apena uma alta de 0,5 ponto, o que levará a Selic para 12,25% ao ano. Em janeiro, a taxa estava em 10,75%.

Com o ajuste fiscal seguido à risca, a tendência do BC, que adotou uma abordagem ¿híbrida¿ no combate à inflação, é de reforçar as medidas prudenciais como alternativas à alta da Selic, menos desgastantes para o governo do ponto de vista político. A expectativa é de que o reforço no arrocho das regras de atuação do sistema financeiro comece pelo mercado de câmbio, com o intuito de conter a supervalorização do real. A expectativa é de que as novas medidas, antecipadas pelo Correio na edição do último sábado, sejam anunciadas, no máximo, até a próxima semana. Ontem, os detalhes foram fechados na Fazenda entre representantes da Pasta e diretores do BC (leia mais na página 11).

Apesar dos primeiros sinais de arrefecimento da inflação, o BC admitiu, na ata do Copom, que os riscos de o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) superar o teto da meta definido pelo governo, de 6,5%, ainda são grandes. No quadro traçado pela instituição, o movimento generalizado de reajustes, que se agravou entre as reuniões do Copom de janeiro e a da semana passada, só começará a se dissipar de forma evidente a partir do terceiro trimestre do ano. Portanto, a inflação só responderá ao aperto monetário ao longo de 2012, quando se espera que o IPCA encoste no centro da meta, de 4,5%.

Para o BC, a maior pressão sobre os índices de preços ao consumidor decorre da diferença entre o ritmo de consumo dos brasileiros e a oferta de bens. Esse descompasso facilita a remarcação dos preços pela indústria e pelo comércio, a despeito de o país estar sendo inundado por produtos importados. O que perturba o BC é que, com o governo gastando além da conta, os desequilíbrios se acentuam. E mais: a instituição avisa que o crescimento dos salários, principalmente no setor público, ainda contribuirão para manter a demanda além da capacidade de suprimento da economia ¿ o que, por consequência, significa inflação. Sendo assim, destacou o BC, o controle dos preços está atrelado à necessidade de superavits primários de pelo menos 3% do Produto Interno Bruto (PIB).

Os avisos do Copom vieram, porém, acompanhado de um voto de confiança a Mantega. Foi o que disse o economista-chefe do Itaú Unibanco, Ilan Goldfajn. ¿A ata reconhece os avanços da consolidação fiscal (cortes no Orçamento) e as medidas macroprudenciais como elementos de contenção da demanda agregada.¿ Para ele, no entanto, o documento do Copom ¿não cita o impacto dos recentes estímulos concedidos pela capitalização e empréstimos concedidos aos bancos governamentais¿. Foi uma clara referência aos R$ 55 bilhões recentemente injetados pelo Tesouro Nacional no Banco Nacional de Desenvolvimento Social (BNDES) ¿ medida, segundo os críticos, inflacionária.

Reação imediata As novas medidas prudenciais, que devem atingir o mercado de câmbio, são sugeridas na ata como alternativas à ferramenta tradicional no combate à inflação: o aperto na Selic. Em um trecho do documento, o Copom afirmou que elas têm a capacidade de mudar a atual estratégia monetária. ¿A eventual introdução de ações macroprudenciais pode ensejar oportunidades para que a estratégia de política monetária seja reavaliada¿, ressaltou. Com esse trecho, no entender de Flávio Combat, economista-chefe da Concórdia Corretora, ¿o BC sinalizou que poderá lançar mão de um novo conjunto de medidas para enxugar ainda mais o mercado de crédito¿.

Os efeitos dessa frase foram imediatos no mercado, que começa a apostar em um aperto menor na Selic de 2011. Tanto que as taxas dos contratos de juros futuros caíram. Os de maior liquidez, com vencimento em 2012, estavam pagando ontem 12,35% ao ano, 0,19 ponto percentual abaixo do fechamento de quarta-feira. ¿O BC está partindo do pressuposto que as medidas já implementadas, somadas às outras possíveis e ao atual ciclo de ajuste monetário, terão o impacto necessário para conter a inflação¿, avaliou Márcio Cardoso, diretor da Título Corretora de Valores.

IPC-S chega a 0,59% Diante do peso da ata do Comitê de Política Monetária (Copom), a divulgação do IPC-S, ontem, ficou em segundo plano no mercado financeiro. Isso, apesar de o Índice de Preços ao Consumidor Semanal (IPC-S) ter acelerado para 0,59% na primeira prévia de março, ante o 0,49% da última semana de fevereiro. Quatro das sete categorias que compõem o indicador registraram elevação.

LADRÃO DE SONHOS » O economista-chefe do Espírito Santo Investment Bank, Jankiel Santos, comparou a ata do Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central com a missão do personagem de Leonardo di Caprio no filme ¿A Origem¿, um ¿ladrão de sonhos¿ que é contratado para plantar uma ideia na mente de uma pessoa. ¿Assim como o personagem de di Caprio no filme, o conselho do Banco Central parece estar buscando uma maneira de inserir novas ideias nas mentes dos participantes do mercado em relação às perspectivas inflacionárias, uma vez que os pensamentos deles não o estão ajudando a cumprir sua tarefa adequadamente¿, afirmou. Para Santos, a autoridade monetária brasileira ¿plantou¿ dois novos parágrafos na ata da última reunião que, na sua visão, ¿soam como uma tentativa de amenizar as mentes preocupadas e sinalizar que um processo de aperto monetário agressivo não está no radar¿.