Título: Brasil não está imune à crise, afirma Strauss-Kahn, do FMI
Autor: Hessel, Rosana
Fonte: Gazeta Mercantil, 10/10/2008, Internacional, p. A13

Washington, 10 de Outubro de 2008 - O Brasil será atingido pela turbulência financeira que está se espalhando rapidamente pelo globo, afirmou ontem o diretor-gerente do Fundo Monetário Inter-nacional (FMI), Dominique Strauss-Kahn, de forma enfática. "O Brasil tem uma situação confortável, mas não está imune à atual crise financeira", afirmou o chefe do Fundo em entrevista a jornalistas na sede da instituição. "O Brasil tem fundamentos econômicos fortes. Nos últimos anos, as políticas monetárias deixaram o País com uma boa estrutura", avaliou o presidente do Fundo lembrando que uma previsão de expansão do Produto Interno Bruto (PIB) nacional de 3,5% calculada pelo FMI para 2009 não é ruim, mas está abaixo da média atual de 5% que o País deverá alcançar. "Assim como o Brasil, o impacto nos mercados emergentes ainda será menos intenso do que nos países desenvolvidos", alertou. Crise já é global Para o diretor do FMI, "a crise financeira já está globalizada". Ao fazer uma analogia da crise com o aquecimento global, Strauss-Kahn lembrou que a temperatura da crise financeira tem aumentado nos últimos dois anos. Aumentou desde 2007 e estava normal em 2006. "O que podemos ver agora é que a crise já se espalhou e envolveu todas as regiões do globo", disse Strauss-Kahn. "Em 2007, muitos economistas falavam em descolamento de alguns países diante da crise de crédito imobiliário dos Estados Unidos, mas hoje essas teorias já estão sendo abandonadas. Agora os diferentes países vão sentir as conseqüências dessa crise em suas taxas de crescimento econômico", afirmou Strauss-Kahn. Perdas maiores As perdas dos Estados Unidos com a crise financeira, de acordo com o ex-ministro das finanças da França, poderão estar acima dos US$ 1,4 trilhão em prejuízos previstos inicialmente pelo FMI - dados divulgados na terça-feira e que superam as estimativas de US$ 1 trilhão feitas pelo Fundo em julho. "É óbvio que há mais perdas a caminho, e nós não devemos nos surpreender com isso", lembrando dos US$ 200 bilhões já comprometidos inicialmente no resgate das financiado-ras imobiliárias Fannie Mae e Freddie Mac. "Será necessário uma ação coordenada entre os países Europeus para que possamos enfrentar essa crise e ajudar a capitalização do mercado financeiro nos dois lados do Atlântico. "Não há solução doméstica" Não há solução doméstica para essa crise", afirmou Strauss-Kahn, defendendo como um novo mantra dos executivos do FMI o lema: cooperação. Aliás, esta foi a palavra mais utilizada desde o início dessa semana aqui em Washington, depois das intervenções dos bancos centrais no mercado e do socorro dos governos para instituições financeiras em estado praticamente falimentar tanto nos Estados Unidos quanto no Velho Continente. Apesar de prever uma forte queda no crescimento mundial neste ano, Strauss-Kahn demonstrou uma dose pequena de otimismo para 2009, especialmente para os países em desenvolvimento. "A partir do próximo ano, o crescimento mundial virá das economias emergentes. Ao mesmo tempo, os mercados emergentes serão afetados pela crise em devido à desaceleração econômica dos países desenvolvidos, e uma das conseqüências será a queda na oferta de crédito, principalmente para as trocas comerciais", disse. Cenário ameaçador O presidente do Banco Mundial (Bird), Robert Zoellick, também traçou um cenário sombrio para economia global. "Em julho, durante a cúpula do G8 eu disse que os países desenvolvidos estavam diante de um duplo risco: o impacto da alta dos preços da comida e dos combustíveis. Mas hoje vejo que o risco agora é triplo: comida, combustível e financeiro. E ameaçador não somente porque atinge os mais pobres, mas também os derrubam", disse Zoellick a jornalistas em entrevista na sede do FMI. Anteontem, inclusive, o secretário do Tesouro norte-americano, Henry Paulson, alertou para o risco de mais bancos quebrarem. O ex-representante de Comércio norte-americano também alertou que os últimos acontecimentos no mercado financeiro podem ser um ponto de virada para muitas economias em desenvolvimento e destacou que as previsões do Bird de crescimento para as economias em desenvolvimento deverão cair de 6,6%, estimados em abril, para perto de 4%. "Essas economias continuarão crescendo. Essa desaceleração não será brusca a ponto de provocar uma recessão", afirmou Zoellick, lembrando que 28 países estão fisicamente mais vulneráveis aos choques dos preços de comida e combustível e para essas nações, o Bird acionou em maio um programa de facilitação de financiamento de US$ 1,2 bilhão para ajudar para os países já atingidos pela crise de alimentos. Zoellick defende cooperação Zoellick, assim como Strauss-Kahn, defendeu a cooperação entre os países desenvolvidos. "Os países do G7 podem combater a crise dos ativos podres recapitalizando os bancos e promovendo maior liquidez no mercado. Eles precisam trabalhar em conjunto para estabelecer regulamentações financeiras e supervisionar o sistema que está falido", disse. Na opinião do presidente do Bird, a crise financeira poderá ainda piorar se os países começarem a levantar barreiras para o comércio. "Os países precisam reconhecer o perigo do protecionismo, que pode exacerbar a queda dos mercados", afirmou ele acrescentando que tanto a Organização Mundial do Comércio (OMC) e quanto o Banco Mundial estão tentando uma forma de retomada da agenda da Rodada Doha , de negociações para a liberalização do comércio global. Ele chegou a comparar Doha como um paciente que é mantido vivo por meio de aparelhos. (Gazeta Mercantil/Caderno A - Pág. 13)(Rosana Hessel)