Título: Por enquanto, só ameaças
Autor: Cristino, Vânia
Fonte: Correio Braziliense, 11/03/2011, Economia, p. 11

A fim de evitar que o valor da moeda norte-americana derreta em relação ao real já supervalorizado, o Banco Central ultrapassou as 100 intervenções no mercado de câmbio este ano. Apesar disso, o preço do dólar permanece entre R$ 1,60 e R$ 1,65. À primeira vista, pode parecer que a atuação do BC não surtiu o efeito desejado. Mas, aos olhos dos especialistas, isso não é verdade. Em pouco mais de 60 dias, a autoridade monetária comprou quase US$ 20 bilhões, evitando, com isso, uma queda vertiginosa da cotação da divisa e prejuízos ainda maiores aos exportadores e à indústria nacional.

¿Se o Banco Central não estivesse comprando pesado no mercado à vista, o dólar certamente estaria em torno de R$ 1,40¿, estimou o economista-chefe da Prosper Corretora, Eduardo Velho. Ciente de que somente as intervenções diárias não serão suficientes para conter a enxurrada de dólares, o BC segue firme na definição de um pacote de medidas para reverter a valorização exagerada do real. No início da noite de ontem, dois diretores da instituição, Aldo Mendes (Política Monetária) e Luiz Awazu Pereira (Normas) ¿ justamente os que comandam as áreas que deverão implementar as mudanças ¿, tiveram uma reunião técnica no Ministério da Fazenda. A expectativa é de um anúncio até a próxima semana.

Taxação Para Velho, o forte ingresso de moeda estrangeira no país ¿ do início de janeiro a 4 de março, entraram US$ 24,43 bilhões, quase o montante de todo o ano passado (US$ 26 bilhões) ¿ tem relação com as medidas intervencionistas em estudo pelo governo. ¿O mercado também está aproveitando para captar o máximo possível agora, porque, no futuro, a expectativa é de juros mais elevados no mercado internacional¿, opinou. O mercado aposta numa puxada do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF), podendo a taxação atingir o mercado de ações (renda variável). O tributo, que hoje chega a 6% sobre as aplicações externas em renda fixa e derivativos, pode, em tese, ser elevado até o limite de 25%.

Também é aguardada a compra de dólar pelo Fundo Soberano. Já a quarentena ¿ prazo definido para o dinheiro deixar o país ¿ é vista com reservas. ¿O IOF substitui a quarentena e tem qualidade superior¿, avaliou o ex-diretor do BC, Carlos Eduardo de Freitas. Professor da Fundação Getulio Vargas, ele defende que o BC mude de atitude em relação às compras à vista, feitas sucessivamente no mercado. ¿O Banco Central poderia deixar o real valorizar, ou seja, não comprar nada no mercado à vista. Com essa atitude, deixaria o mercado perdido¿, observou.

Desde o início do ano, as compras de dólar do BC chegam a US$19,69 bilhões ¿ uma soma elevada de dinheiro para um espaço de tempo tão curto. A compra tem um forte impacto fiscal. Os dólares adquiridos pelo BC vão para as reservas internacionais, que rendem muito pouco. Além da compra à vista, o BC também vem atuando no mercado a termo ¿ aquisições com data marcada para o pagamento. Há pouco tempo, a instituição voltou a atuar no swap reverso, operação nas quais se paga a diferença entre a variação cambial e a da Selic.

Dólar vai a R$ 1,661 Vera Batista As ameaças do governo de impor novas medidas para conter a todo custo a valorização do real fez o dólar subir 0,24%, ontem, pelo segundo dia consecutivo, cotado a R$ 1,661. Boatos apontam que um pacote com novas regras está pronto desde o carnaval. Dele, comenta-se, poderão sair mudanças como a elevação do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) sobre o capital estrangeiro, recolhimento ainda mais severo do depósito compulsório dos bancos (início em 6 de abril, a partir de R$ 3 bilhões) ou até mesmo decretação de quarentena (retenção de valores no país por período predeterminado).

O Banco Central fez dois leilões de compra no mercado à vista, para o dólar registrar essa leve reação. ¿Só de 28 de fevereiro a 4 de março, o BC fez 15 intervenções no mercado de câmbio¿, lembrou Mario Paiva, economista da Corretora BGC Liquidez. O problema é que ¿os remédios estão matando o doente¿, segundo Sidnei Nehme, diretor da NGO Corretora. A seu ver, é mais inteligente lidar com a ideia de que não é possível elevar muito o câmbio; admitir que o Brasil, pelo seu deficit em transações correntes, precisa de capital estrangeiro; e, para manter a inflação dentro da meta, incentivar a indústria por meio da desoneração das exportações.

O BC tem também a alternativa de reduzir a posição vendida dos bancos de R$ 3 bilhões para R$ 2 bilhões. ¿Quanto menor o valor, menos irá para o consumo¿, observou Nehme. Mas, com os juros nas alturas, o país ainda continuará atrativo aos estrangeiros.