Título: PSol exige investigação
Autor: Abreu, Diego
Fonte: Correio Braziliense, 11/03/2011, Cidades, p. 21

O Partido Socialismo e Liberdade (PSol) apresentou na tarde de ontem um pedido de abertura de investigação na Câmara dos Deputados contra a deputada federal Jaqueline Roriz (PMN-DF). No documento, o presidente regional da legenda, Toninho do PSol, e o líder da legenda na Casa, Chico Alencar (RJ), solicitam à Corregedoria que o episódio de suposto recebimento de propina pela parlamentar na campanha eleitoral de 2006 seja apurado. Jaqueline, então candidata a deputada distrital, foi flagrada em vídeo recebendo R$ 50 mil em maços de dinheiro do ex-secretário de Relações Institucionais do GDF Durval Barbosa, o delator do escândalo que originou a Operação Caixa de Pandora. A gravação em que a deputada aparece, no entanto, só foi divulgada na última sexta-feira.

Além de requerer a reavaliação da declaração de bens e renda de Jaqueline ao Fisco ¿ sob o argumento de que, caso haja omissão de informações no documento, a parlamentar pode ser enquadrada no Código de Ética e Decoro Parlamentar da Câmara, cuja punição máxima é a cassação do cargo ¿, os políticos do PSol solicitam que seja averiguada a situação da deputada no processo no qual é acusada de receber R$ 12 mil para aprovar o Plano Diretor de Ordenamento Territoral (Pdot) do Distrito Federal. A votação do projeto, cujo objetivo é planejar o crescimento urbano das cidades, ocorreu em 2008, na Câmara Legislativa. À época, Jaqueline foi investigada pela Polícia Federal e citada no relatório entregue ao Ministério Público local pelo envolvimento no suposto esquema.

Ao comentar as cenas protagonizadas por Jaqueline no vídeo gravado por Durval, Toninho foi incisivo ao defender a perda do mandato. ¿Uma parlamentar que foi pega num ato daquela natureza não pode estar aqui no convívio da Casa de representantes do povo brasileiro¿, criticou. Acompanhando o colega de partido, o senador Randolfe Rodrigues (AP) reiterou o discurso duro contra a conduta da deputada do DF. ¿Acredito que não temalternativa a não ser a cassação dela¿, afirmou.

Assim que o Conselho de Ética e Decoro Parlamentar for instaurado na Câmara dos Deputados, o que deve ocorrer na próxima quarta-feira, o PSol entrará com nova representação contra Jaqueline. Para Toninho, as decisão tomada pelo partido não invalida o andamento paralelo das investigações. ¿O PSol se junta a outras iniciativas para reforçar o pedido pela cassação imediata dela¿, declarou. ¿Estamos fazendo a provocação. É isso que importa¿, disse o senador Randolfe Rodrigues.

Tradição Tradicionalmente, o Conselho de Ética e Decoro Parlamentar da Câmara dos Deputados não tem considerado as denúncias contra deputados ocorridas antes do exercício do mandato. Em 2007, quando era deputado federal e membro do conselho, o atual ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, emitiu um parecer, acatado pelos colegas, definindo que a Casa só abriria processo contra atos parlamentares ocorridos após a posse na legislatura em curso.

O entendimento beneficiou os deputados Paulo Rocha (PT-PA) e Valdemar Costa Neto (PR-SP), réus no processo do Mensalão do PT, que escaparam de responder a processos por quebra de decoro. Ambos renunciaram aos mandatos em 2005, mas voltaram ao Congresso após serem eleitos no pleito do ano seguinte. Ainda em 2007, essa mesma tese ajudou o senador Gim Argello (PTB-DF) a se manter no cargo. Ele assumiu vaga no Senado após a renúncia do ex-governador Joaquim Roriz (PSC).

¿Quando o marginal é pego depois de ter cometido um crime, ele paga por isso, não importa o momento. Para o PSol é esse o entendimento. Se Jaqueline, em 2006, cometeu o delito flagrado no vídeo, ela não tem condição ética nem moral para permanecer como representante do povo do DF¿, argumentou Toninho.

Rigor Por meio de nota, divulgada no início da semana, o corregedor da Câmara, o deputado Eduardo da Fonte (PP-PE) afirmou que o órgão ¿será rigoroso¿ a respeito do caso. O corregedor disse ontem que tomará as providências quando ¿formalmente provocado¿ e ¿assim que estiver de posse de todas as informações a respeito do caso¿.

Passo a passo Veja quais são as fases para a análise de quebra de decoro na Câmara dos Deputados:

1 ¿ Qualquer pessoa pode representar contra um parlamentar diretamente na Mesa Diretora.

2 ¿ O presidente da Câmara encaminha a denúncia à Corregedoria da Casa, que é formada por quatro membros da Mesa e presidida pelo 2º vice-presidente (corregedor).

3 ¿ O corregedor tem o prazo de 20 sessões plenárias para investigar o processo, apurando fatos e ouvindo testemunhas. Depois, ele apresenta parecer à Mesa Diretora, que decide sobre a abertura ou não do processo no Conselho de Ética e Decoro Parlamentar.

4 ¿ Além da Mesa, somente os partidos podem enviar representação diretamente ao Conselho de Ética ¿ que é formado por 15 deputados. Depois de instaurado, o processo é designado ao relator e o acusado é notificado.

5 ¿ O deputado investigado tem prazo de cinco sessões para apresentar a defesa. As evidências são avaliadas pelo relator. Caso seja necessário, ele pode requerer a quebra dos sigilos bancário, fiscal e telefônico do investigado.

6 ¿ O Conselho de Ética pode aplicar punições em diversos níveis: censura verbal, suspensão do mandato e expulsão. Nos dois últimos casos, o processo deve ser votado em plenário. Para cassar o parlamentar, são necessários 257 votos. Caso contrário, o deputado é absolvido.

Marco Maia pede fim da delação de Durval O presidente da seccional DF da Ordem dos Advogados do Brasil, Francisco Caputo (E), foi recebido ontem pelo presidente da Câmara: pena máxima O presidente da Câmara dos Deputados, Marco Maia (PT-RS), defendeu ontem que a denúncia contra Jaqueline Roriz (PMN-DF) seja tratada de forma diferenciada caso chegue ao Conselho de Ética e Decoro Parlamentar da Casa. O petista disse que o caso não pode ser comparado ao de outros deputados que já foram alvo de investigações por condutas praticadas antes da posse na Câmara. ¿Vamos trabalhar com essa lógica e indicar que o tema seja debatido sob essa ótica¿, declarou. Maia sinalizou que o conselho poderá ser provocado, de forma direta, a investigar a denúncia contra Jaqueline assim que a Casa receber as informações do Ministério Público Federal (MPF). Dessa forma, não há necessidade de aguardar uma representação particular contra a deputada. A decisão do presidente, no entanto, dependerá do volume das informações a que terá acesso via MPF.

O caso de Jaqueline Roriz foi discutido, no início da tarde de ontem, por Marco Maia e pelo presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-DF), seccional DF, Francisco Caputo.

O advogado encontrou-se com o petista para reforçar o pedido de apuração da denúncia contra a parlamentar. O benefício da delação premiada concedida a Durval Barbosa foi colocado em xeque ontem por Caputo e Maia. O princípio da concessão pressupõe que todas as informações do processo venham à tona. ¿Estranha o fato de que essas gravações cheguem somente agora. Não é possível que se permaneça essa situação em que, a cada semana, mês ou ano, se divulgue uma fita nova. Há expectativa de que existam mais de 200 fitas de vídeo e esta é a 31ª a ser divulgada¿, afirmou Marco Maia. ¿Temos que cogitar, inclusive, que seja cassada esta condição de delação premiada de Durval, pois parece que vão sendo divulgadas imagens de forma aleatória¿, criticou.

Caputo pediu a ampla divulgação dos vídeos, numa declarada pressão ao Ministério Público Federal e ao Judiciário, que concedeu a delação ao ex-secretário. ¿Não é razoável que um delator, que tem obrigação de entregar todas as provas e dizer toda a verdade, use o benefício de acordo com as suas conveniências pessoais. A sociedade de Brasília e do Brasil tem o direito de saber toda a verdade que envolveu esse nebuloso escândalo¿, afirmou o presidente da OAB-DF.

Elementos suficientes Na opinião do presidente da OAB-DF, a Câmara já tem elementos suficientes para processá-la e julgá-la. ¿Por mais que o vídeo tenha sido gravado em 2006, o fato político aconteceu agora. É isso que deve ser considerado pelo Conselho de Ética¿, apostou.

Para Caputo, episódios idênticos ocorridos com deputados distritais, como Leonardo Prudente (sem partido), Júnior Brunelli (sem partido) e Eurides Brito (PMDB), que também foram flagrados em gravações recebendo dinheiro das mãos do ex-secretário de Relações Institucionais do GDF Durval Barbosa, revelam que a situação de Jaqueline é a mesma. ¿Temos que ouvir as explicações, mas, pelo que já conhecemos, ou ela (Jaqueline) vai dizer que é uma contribuição não declarada de campanha, e isso para nós também é um ilícito, ou é fruto de compra de apoio parlamentar. O vídeo é tão constrangedor que deve merecer a pena máxima de cassação¿, afirmou o presidente da OAB-DF. Mais ponderado, Maia disse que a Casa ainda aguarda informações para abrir investigação contra a deputada.

Pedida alteração no Código de Ética O deputado federal José Antônio Reguffe (PDT-DF) protocolou ontem no plenário da Câmara dos Deputados projeto de resolução para alterar o Código de Ética e Decoro Parlamentar da Casa. Ele defende a inclusão de artigo prevendo a investigação de condutas parlamentares no período que antecede o exercício do mandato. A proposta de Reguffe estabelece que atos ilegais cometidos para facilitar a vitória nas urnas devem ser alvo de investigação pela Corregedoria e de análise no Conselho de Ética.