Título: BC eleva ativos de bancos menores passíveis de compra
Autor: Aliski, Ayr
Fonte: Gazeta Mercantil, 17/10/2008, Finanças, p. B1

17 de Outubro de 2008 - O Banco Central fez ontem sua terceira tentativa de acabar com o empoçamento de recursos que reduziu a liquidez para bancos de pequeno e médio portes. Depois de autorizar o uso do compulsório para a compra de carteiras de crédito de instituições menores, agora elevou o número de ativos passíveis de serem adquiridos. O BC passa a aceitar também transações com títulos de renda fixa, adiantamentos e outros créditos de pessoas físicas e jurídicas não-financeiras. Agora, os bancos podem abater do recolhimento do compulsório ativos comprados de instituições menores como Certificado de Depósito Bancário (CDB), Certificado de Depósito Interfinanceiro (CDI) e os chamados Fundos de Investimento em Direitos Creditórios, os Fidcs.

A ampliação dos ativos passíveis de serem adquiridos, com abatimento do compulsório, foi elogiada. "A compra de uma carteira de crédito é algo mais complexo, demora mais porque há inúmeros riscos envolvidos, agora a aquisição de ativos de renda fixa é muito rápida", diz Luís Miguel Santacreu, analista da Austin Rating. "Se a idéia é facilitar as negociações entre os bancos, garantindo liquidez a instituições de menor porte, o BC agiu corretamente com a decisão de ontem."

Negociação em bloco

Frente a tamanho incentivo à compra de ativos, por meio da liberação de compulsório dos depósitos a prazo e flexibilização das regras, as operações nesse segmento continuam tímidas. Já anunciaram a compra de carteiras os bancos Itaú, Bradesco, Unibanco, Banco do Brasil (BB) e Santander. Para o economista Carlos Eduardo Tadeu de Freitas, ex-diretor do Banco Central, a resposta é simples: as instituições estão com medo. "Há um estigma que tem que ser quebrado. Hoje, se o banco `A¿ libera compulsório para comprar carteira do banco `B¿, o mercado pode dizer que o banco `B¿ está com problemas. É preciso romper esse tabu", diz Freitas.

Para Freitas, o Banco Central deveria ir além de apenas conceder o benefício da liberação do compulsório e promover a aproximação entre os potenciais compradores e os virtuais vendedores de carteiras, promovendo negociações em bloco. Ao BC caberia, portanto, promover o "start" dessas negociações, "quebrando o gelo" entre os agentes financeiros.

Freitas destaca que o sistema financeiro nacional não tem problemas de solvência, mas pontualmente dificuldades momentâneas de liquidez, fruto do enxugamento das linhas internacionais e da posição mais conservadora interna. O mecanismo de compra de carteiras proposto pelo BC, "financiado" pelo compulsório, seria eficiente para reduzir o empoçamento da liquidez. O que falta é aproximar os pretendentes.

Efeito no crédito

O economista Caio Megale, da Mauá Investimentos, concorda que o mercado brasileiro mantém, nos últimos dias, extrema retenção da liquidez. "Não há linhas externas, e há cautela na concessão de crédito externo." Ele alerta que a proposta do BC de promover a compra de carteiras de bancos pequenos por instituições maiores serve somente para compensar a falta de linhas do mercado internacional, mas alerta que não haverá imediato reforço na oferta de crédito. Megale considera oportunas as medidas do BC e concorda que o Brasil enfrenta problemas de liquidez e não de solvência. Ou seja, não há "bancos quebrados", alerta o economista da Mauá, mas eventualmente instituições com dificuldades de liquidez imediata. Megale ressalta ainda que a adesão ao novo mecanismo de compra de carteiras atrelada à liberação de compulsórios não é imediata, ou seja, exige maturação entre os agentes de mercado.

Sintonia com o mercado

Francisco Pessoa, economista da LCA Consultoria, considera positivo que o BC esteja ampliando o rol de papéis que podem integrar as carteiras a serem negociadas entre os bancos. Segundo ele, as mudanças indicam que o BC está realizando uma sintonia fina com as necessidades do mercado, ou seja, ajustando suas medidas ao perfil das carteiras que têm potencial de serem negociadas. Pessoa defende que no Brasil as instituições trabalham com baixa alavancagem e posições mais conservadoras, descartando, assim, hipóteses de quebras de bancos pequenos. Para o economista da LCA, as medidas do BC estão corretas, pois atendem problemas pontuais de liquidez das instituições menores, mantendo firme a confiança do mercado.

Quando anunciada a regra anterior, que ampliou pela primeira a lista de papéis que poderiam integrar as carteiras compradas, o economista Bruno Rocha, da Tendências Consultoria, já havia considerada positiva a decisão do Banco Central. Para Rocha, tais alterações não indicam comportamento hesitante do BC, mas sim ajuste às necessidades do mercado, na tentativa de promover justamente a reativação da liquidez. Santacreu, da Austin Rating, faz coro. "O processo é dinâmico, vai avançando na medida em que os efeitos são percebidos ou não pelo BC."

Histórico

A primeira ação do BC para reduzir o empoçamento de recursos, causada pela crise global de confiança, foi anunciada no começo deste mês. Em 2 de outubro, o BC estabeleceu as primeiras regras que tratavam da compra de carteiras de bancos pequenos por bancos maiores, argumentando que a medida poderia liberar até R$ 23,5 bilhões no mercado. Na ocasião, foi liberado até 40% do compulsório dos depósitos a prazo.

No dia 15 de outubro, o BC alterou as regras desse tipo de operação, ao editar outra circular, incluindo novos tipos de papéis que poderiam integrar as carteiras em negociação. Também foi elevado o patrimônio de referência da instituição vendedora, de R$ 2,5 bilhões para R$ 7 bilhões, assim como a disponibilidade de uso do compulsório dos depósitos a prazo que foi de 40% para 70%. Por fim, ontem, a autoridade monetária incluiu outros ativos passíveis de serem comprados.

A estratégia do BC de ir gradualmente atualizando as medidas de auxílio ao sistema financeiro também foi elogiada: "O BC precisa observar o resultado do remédio adotado e ir ajustando a dose é, portanto, correta a adoção paulatina de medidas que garantam a liquidez do sistema" avalia o professor doutor José Carlos Luxo, do Laboratório de Financias da FIA. Para o professor, a inclusão de ativos de renda fixa como passíveis de compra também foi acertada. "O problema da medida anterior, que autorizava a compra de carteiras de crédito, é que há um limite para que as instituições elevem sua exposição a determinado tipo de crédito", diz. "Para alguns bancos pode não ser interessante elevar sua exposição em crédito pessoa física ou de veículos."

A sucessiva flexibilização das regras para a compra de carteiras de bancos está sendo assimilada lentamente pelo mercado. Nos dez primeiros dias do mês foi verificada pequena redução da soma de todos os compulsórios. O total, de R$ 275,498 bilhões no dia 1º de outubro, chegou até mesmo a subir, atingindo R$ 277,535 em 7 de outubro. O recuo foi recente, com queda para R$ 273,553 bilhões, no dia 10 (posição mais recente divulgada pelo Banco Central).

Ver também página B3(Gazeta Mercantil/Finanças & Mercados - Pág. 1)(Ayr Aliski e Jiane Carvalho)