Título: MP do governo pode gerar efeito negativo para bancos estatais
Autor: Rosa, Silvia
Fonte: Gazeta Mercantil, 23/10/2008, Finanças, p. B3

São Paulo, 23 de Outubro de 2008 - A Medida Provisória nº 443 edita ontem pelo governo federal, que autoriza o Banco do Brasil e a Caixa Econômica Federal a comprarem participações em instituições financeiras privadas, apesar de reforçar as garantias para se evitar um risco sistêmico, podem surtir efeito negativo para os bancos estatais, despertando a desconfiança dos investidores de possível ingerência política nessas instituições.

Para o diretor-executivo da Fitch Ratings, Rafael Guedes, a medida visa criar instrumentos para o Banco Central e para o governo atuarem no resgate de alguma instituição, caso isso venha a ser necessário, e evitar os riscos de contágio para o sistema financeiro. "No momento o que há são bancos com problemas de liquidez e não de solvência, com o aumento da dificuldade para captar recursos no mercado. Porém, é difícil de prever o quanto essa crise no mercado de crédito vai durar e o BC está buscando se prevenir para intervir se necessário."

A medida segue as atuações que o Banco Central e o governo vem tomando para aumentar a liquidez para as instituições financeiras de pequeno e médio porte, como a liberação de compulsório para bancos que adquirem carteira de crédito dessas instituições. O BB e a Caixa Econômica Federal estão entre as contrapartes mais ativas nestas vendas, embora transações também tenham sido fechadas entre bancos do setor privado. Para Guedes a interferência do governo na atuação dos bancos públicos pode não ser bem recebida pelos investidores, na medida que essas instituições possam ter que assumir, eventualmente, a compra de bancos com problemas.

O economista da consultoria Lopes Filho, João Augusto Frota Salles, destaca que a desconfiança do mercado em relação ao risco de ingerência política nessas instituições tem impactado as ações do BB, que só ontem registraram queda de 15,36%.

Salles ressalta ainda que a medida editada ontem pelo governo pode ter efeito contrário do desejado, provocando um aumento da desconfiança dos investidores sobre o risco de quebra de instituições financeiras, podendo gerar maior dificuldade para os bancos pequenos e médios captarem recursos. "O governo tem atuado no sentido de dar tranqüilidade e minimizar o problema de liquidez. No entanto, os bancos médios têm enfrentado dificuldade para captar recursos via emissões de Certificados de Depósito Bancário (CDBs) o que pode levar a um descasamento entre seus ativos e passivos", afirma.

Ele afirma que as medidas anteriores tomadas pelo BC ainda não surtiram efeito no mercado e não foram suficientes para amenizar a falta de crédito. "Os bancos grandes estão nesse momento privilegiando a liquidez e não devem comprar grande volume de carteiras enquanto o ambiente estiver turvo", diz.

De acordo com relatório divulgado pela Fitch, os bancos médios adotaram metas agressivas de crescimento, suportados pela capitalização com a abertura de capital e alta liquidez no mercado doméstico e externo, e que agora começam a ser revistos. Com a contração no mercado de crédito, essas instituições começaram a ter dificuldade para emitir CDBs, altamente concentrados entre os investidores institucionais. "No momento que o mercado retrai, os investidores passam a buscar ativos mais líquidos como títulos públicos e papéis de grandes bancos. O risco é de que, com o agravamento da crise, os clientes passem também a migrar seus depósitos para instituições de maior estabilidade", diz Guedes.

(Gazeta Mercantil/Finanças & Mercados - Pág. 3)(Silvia Rosa)