Título: Usinas já vislumbram tempos difíceis
Autor: Riveras, Inaê
Fonte: Gazeta Mercantil, 29/10/2008, Agronegócio, p. B11

São Paulo, 29 de Outubro de 2008 - O aperto de crédito resultante da crise financeira global é o mais novo golpe sofrido pela indústria de álcool e açúcar do Brasil, que sofre com a queda de margens de lucro nos últimos dois anos.

As perspectivas brilhantes vistas há alguns anos parecem ter sido deixadas para trás de acordo com produtores e analistas que participam da Conferência Internacional Datagro sobre Açúcar e Álcool. Eles ainda acreditam no potencial do setor para o longo prazo, mas estimam que as dificuldades vão se aprofundar no curto prazo.

"O setor já estava em sua própria crise antes dos distúrbios de crédito, devido à oferta excessiva (de açúcar), à queda dos preços e à elevação dos custos dos insumos", disse José Pessoa de Queiroz Bisneto, presidente da Companhia Brasileira de Açúcar e Álcool.

O grupo negocia a venda de sua participação de 50% em uma usina de Penápolis (SP), mas considera a operação improvável devido aos problemas financeiros.

"No momento existem mais pessoas que querem vender (empresas), e menos pessoas que querem comprar", disse ele, explicando que a chegada de grandes grupos ao setor elevou os preços de equipamentos, terras e insumos, consumindo a maior parte das margens de lucro dos grupos.

A Cosan, uma das maiores do setor do Brasil, pode ser um dos grupos interessados em oportunidades de aquisições durante a crise, afirmou o diretor vice-presidente geral, Pedro Mizutani. "A Cosan sempre cresceu em crises", disse ele. Mas também essa empresa enfrenta dificuldade com financiamentos. E os planos de investimento para 2010, incluindo a entrada em operação de duas novas usinas em Goiás, podem ser adiados ou até mesmo cancelados.

Fusões e aquisições

A indústria de açúcar e álcool do Brasil passou por um boom nos últimos anos, e as empresas têm feito alavancagens com força para investir em expansão futura.

Muitas delas também estão enfrentando perdas devido à depreciação do real contra o dólar por causa de suas dívidas, já que a maior parte delas é em dólar.

"É um momento complicado. A indústria investiu muito para financiar os estoques e para lidar com a crescente demanda no exterior. Além disso, elas acreditam que os ganhos em escala são uma maneira de assegurar a sobrevivência a longo prazo", disse o presidente da Datagro, Plínio Nastari.

"Elas fizeram alavancagem para investir. Os investimentos eram maiores do que o fluxo de caixa delas", disse ele. Agora, com o aperto de crédito, os produtores que estão mais fracos financeiramente podem ser forçados a vender seu produto a qualquer preço para fazer dinheiro, provocando o aumento da volatilidade de preços, disse.

Isso já aconteceu no mercado local de álcool, onde os preços caíram recentemente apesar da perspectiva de baixa oferta no período de entressafra, entre janeiro e março de 2009.

Apesar de uma falta generalizada de crédito no curto prazo, é quase um consenso entre analistas e produtores que o setor verá um forte aumento de fusões e aquisições, já que empresas mais fracas viram alvo de aquisições de grupos maiores.

Eles também estimam um ritmo mais lento de investimentos em expansão. "A maior conseqüência da crise financeira é a consolidação, substituir a expansão", disse o diretor da Organização Internacional de Açúcar (OIA), Peter Baron, destacando que isso pode não ser prejudicial por um tempo.

"No geral as pessoas estão mais cautelosas sobre onde vão investir dinheiro, não querem arriscar muito", disse Baron.

A expectativa é de que o investimento em novas usinas no Brasil alcance 33 bilhões de dólares até 2012, de acordo com a União da Indústria de Cana-de-Açúcar.

(Gazeta Mercantil/Finanças & Mercados - Pág. 11)(Inaê Riveras/Reuters)