Título: Crise reduz exportação de manufaturados
Autor: Salgueiro, Sônia
Fonte: Gazeta Mercantil, 04/11/2008, Nacional, p. A4

São Paulo, 4 de Novembro de 2008 - A crise financeira internacional já começa a afetar as exportações brasileiras de manufaturados. Dados divulgados ontem pelo Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior indicam que, apesar de o segmento ainda registrar crescimento acumulado no ano, no mês de outubro a média diária dos embarques de manufaturados foi 14,1% inferior à média do mês anterior. No mesmo período de comparação, a média diária das exportações totais do País ficou só 7,5% abaixo da marca de setembro.

"O maior problema do exportador é a falta de crédito", avalia André Sacconato, economista da Tendências Consultoria Integrada. Felizmente, diz ele, o Banco Central já deu mostras de que abrirá rapidamente novas linhas de Adiantamento sobre Contrato de Câmbio (ACC) e de Adiantamento sobre Cambiais Entregues (ACE), uma vez que a razão da falta de recursos é mais técnica do que política. "O empresário precisa de crédito rápido, até para aproveitar um fator positivo, que é o câmbio, afinal é melhor receber R$ 2,10 a R$ 2,20 por dólar do que R$ 1,50 ou R$ 1,60."

Outro fator que ameaça as exportações de manufaturados é a redução da renda mundial, anota Sacconato. "Os países vão importar menos e o Brasil exportará menos, principalmente para alguns de seus principais parceiros, como Estados Unidos, União Européia e Argentina." Diante de um cenário tão turbulento, a Tendências está revendo todas as suas projeções para o comércio exterior em 2008 e 2009. "Esperávamos um superávit de US$ 11,5 bilhões para o ano que vem. Agora achamos que dificilmente o saldo chegará aos US$ 11 bilhões", diz Sacconato.

Do seu lado, os exportadores de manufaturados fazem uma verdadeira ginástica para continuar embarcando mercadorias para o exterior. O crédito é um problema sério para todo mundo, mas também há companhias enfrentando dificuldades na hora de definir preços, por causa da alta volatilidade do câmbio, e tendo que negociar descontos com a clientela. Há ainda empresas brasileiras trabalhando dobrado, para atender compradores que parcelaram os embarques para não ficar estocados.

"Há uma preocupação muito grande dos clientes em relação a 2009", afirma Rolf Buddemeyer, presidente da empresa que leva seu sobrenome, fabricante de roupas de banho que obtém cerca de 20% de seu faturamento líquido no exterior. O empresário explica que não teve pedidos suspensos, mas que sua clientela reduziu a quantidade de produtos por embarque. "Há gente que, em vez de comprar a cada quatro meses, como antes, está encomendando lotes menores, embarcados a cada dois meses.

Os custos logísticos para o cliente são maiores, mas ele se sente mais seguro porque sabe que não ficará estocado se a situação piorar." Por conta disso, a Buddemeyer é obrigada a fazer ajustes na escala de produção, reduzindo algumas margens na exportação.

Como a paridade dólar-real está mais favorável ao exportador brasileiro, esse problema é contornável, mas Buddemeyer acha que essa vantagem está com os dias contados, afinal mercados importadores importantes também tiveram suas moedas desvalorizadas em relação ao dólar. Nos últimos 40 dias o dólar australiano desvalorizou quase 23% em relação ao dólar americano. No caso do dólar canadense, a perda foi de quase 13%. "Fatalmente vamos ser pressionados a baixar preço, afinal o mercado está desaquecido lá fora. Em sete ou oito meses, nossos preços externos podem ser menores que os atuais."

A pressão dos descontos já é realidade na Riclan, empresa paulista que exporta em torno de 20% de sua produção de balas, gomas de mascar e pirulitos. "Mal conseguimos repor a margem da exportação, que estava corroída por causa do real valorizado, e os clientes já começam a pedir desconto. Como normalmente temos três meses em carteira, o cliente quer repactuar o contrato", relata Antonio Romualdo Silva, gerente de exportação da empresa.

Mas o maior problema da indústria alimentícia é mesmo a dificuldade de acesso às linhas de crédito à exportação. "Elas estão escassas e muito mais caras. Taxas que antes da crise estavam em 6% hoje chegam a 14%." A saída, conta Silva, foi negociar a antecipação dos pagamentos.

Diante da grande volatilidade do mercado, a Riclan sofre para definir um preço para seu produto. "Com o dólar oscilando tanto, ficamos sem parâmetro para negociar embarques que vão acontecer em dezembro." Também não dá para traçar cenários para 2009. "Se repetirmos os números deste ano, já estará bom."

Na fabricante de cadernos Credeal, de Serafina Corrêa (RS), a torcida é para que a crise seja passageira. "Quase 95% de nossa exportação está concentrada no primeiro semestre. Por isso não sentimos muito o reflexo da crise", diz Alexandre Girardi, diretor financeiro da companhia, que produz cerca de 40 mil toneladas e deve exportar US$ 8,5 milhões neste ano. Segundo ele, a maior dificuldade é o alto custo das linhas de crédito. "Tudo que existe para financiar a exportação está muito claro. O ACC, que é uma operação quase de prateleira e que tinha taxas de 7%, hoje tem taxas na faixa dos 20%."

(Gazeta Mercantil/Caderno A - Pág. 4)(Sônia Salgueiro)