Título: Crise não altera meta e investimento
Autor: Scrivano, Roberta
Fonte: Gazeta Mercantil, 06/11/2008, Infra-Estrutura, p. C4

São Paulo, 6 de Novembro de 2008 - O setor de saneamento básico brasileiro começa a dar os primeiros passos para sair da estagnação. Hoje, mais da metade dos brasileiros não tem acesso ao serviço, mas com o novo marco regulatório e recursos garantidos pelo Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), especialistas que participaram ontem do Congresso em Celebração ao Ano Internacional do Saneamento - CAIS 2008 esperam que o setor saia do marasmo.

"Em 2003, os investimentos em saneamento eram de cerca de R$ 3 bilhões, agora o PAC (anunciado em janeiro do ano passado pelo governo federal brasileiro) prevê R$ 40 bilhões para o setor até 2010", explica Élvio Gaspar, diretor da área social do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). O executivo diz que, com esse montante (R$ 40 bilhões) até 2010, o governo pretende atender 86% dos domicílios brasileiros com água potável, 55% com esgoto e 47% com destinação adequada do lixo. "Independentemente da crise, na área de infra-estrutura a decisão do governo é de manter os investimentos", garante Gaspar.

Rogério de Paula Tavares, superintendente nacional de saneamento da Caixa, afirma que o montante previsto para o saneamento no PAC é o maior volume de investimentos já feito no País desde o Plano Nacional de Saneamento (Planasa), instituído em 1988. "Os volume aplicados no setor foram insatisfatórios de 1990 até 2002", comenta Tavares. "Em 2003 a situação começou a melhorar porque houve a aplicação de política estável de financiamento", afirma. Para Tavares, a melhora nos processos de liberação dos financiamentos para o setor de saneamento, foi essencial para garantir a continuidade dos investimentos no segmento. "Os recursos do FGTS estão disponíveis e o montante do PAC está confirmado, sendo assim poderemos resgatar a dívida com a população brasileira nos setores de água e esgoto", afirma.

Paulo Cabral Furtado, secretário-executivo do conselho curador do FGTS, ressalta que nesta semana foram "aprovados, para 2009, a liberação de R$ 4 bilhões exclusivamente para o saneamento" (valor incluído no PAC). Além deste montante, já foram liberados R$ 12 bilhões do FGTS para o setor público aplicar em saneamento neste ano.

Dilma Pena, secretária de Saneamento e Energia do Estado de São Paulo destaca as condições do mercado atual no setor e a necessidade de um planejamento adequado à nova realidade sócio-econômica. "Apesar da pertinência do Planasa (que previa em duas décadas alcançar 80% do saneamento nacional) existe um novo cenário com uma nova realidade e os investimentos estão adaptados a isso", afirma. Para Tavares, da Caixa, "o caminho está aberto para a evolução do setor". "Para 2007 e 2008, a Caixa liberou mais de R$ 3 bilhões em cada ano para o segmento", calcula.

Gesner Oliveira, presidente da Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo (Sabesp), ressalta a importância de se investir continuamente no setor. Sobre os investimentos previstos no PAC, Gesner afirma que "o desafio da universalização é muito grande". "Os investimentos são relevantes e significativos, porém é preciso haver ainda mais locação de recursos para o saneamento", comenta.

Rogério Pilloto, do International Finance Corporation, braço do Banco Mundial, garantiu que o momento é de crescimento econômico apesar da crise financeira mundial. .

Marcelo Morgado, assessor de meio ambiente da Sabesp, ressalta a importância do debate de propostas para o setor de saneamento.

Pesquisa Trata Brasil

Nesta semana, o Instituto Trata Brasil apresentou, em parceria com a Fundação Getúlio Vargas (FGV), a pesquisa "Saneamento, Saúde e o Bolso do Consumidor". O estudo mostra que, com o atual ritmo de investimentos do Brasil em saneamento básico (de R$ 10 bilhões por ano), o País precisará de, no mínimo, 20 anos para conseguir universalizar o serviço. "Estimamos que serão necessários R$ 200 bilhões de investimentos para universalizar o saneamento no Brasil", comenta Raul Pinho, presidente do Trata Brasil, para lembrar que o montante de aportes no setor previsto no Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) é de R$ 40 bilhões. "Precisamos de quatro PACs", acrescenta.

Apesar da ressalva em relação ao volume de investimentos necessários, a pesquisa mostra que em 2007, ano de lançamento do PAC, o saneamento básico foi o serviço público que teve o maior crescimento no País, atingindo 49,44%. "Tivemos uma evolução de 5% em saneamento em relação ao ano de 2006", diz Pinho.

Segundo a Organização das Nações Unidas (ONU) o Brasil está em 67º lugar no ranking mundial de países com acesso a esgoto. "A regra no Brasil foi, até agora, um saneamento andando a passos de tartaruga", afirma Marcelo Néri, coordenador da pesquisa e chefe do Centro de Políticas Sociais da FGV. "O Brasil não estava fazendo seu dever de casa na área de saneamento. A taxa de redução do déficit de saneamento vinha andando a um quarto do ritmo de redução da pobreza, nos últimos 15 anos".

A pesquisa diz que o déficit de rede geral de esgoto, que era de 53,23% em 2006, caiu para 50,56% em 2007. Já o tratamento do esgoto coletado nas grandes cidades corresponde a pouco menos de um terço. "Como atualmente 80% da população brasileira vive em cidades, é nelas que deveriam ser feitos os investimentos", diz Pinho, do Trata Brasil. O estudo mostra que com o aumento da rede coletora de esgoto, as doenças infecciosas e parasitárias causaram menos mortes entre crianças de 1 a 4 anos. "Este índice crescia desde 1996, mas em 2007 teve uma queda de 14,1% em relação a 2006", explica Néri, da FGV.

O líder em saneamento é São Paulo, com déficit de 14,44%. Em seguida vem o Distrito Federal, com 19,83%, e Minas, com 25,1%. Na outra ponta está o Amapá, estado no qual o déficit chega a 97,36%. O estado que demonstrou a melhor evolução na redução do déficit foi o Rio , com queda de 17,38%.

(Gazeta Mercantil/Caderno C - Pág. 4)(Roberta Scrivano)