Título: Trichet defende cautela em socorro à economia real
Autor: Carvalho, Jiane
Fonte: Gazeta Mercantil, 11/11/2008, Finanças, p. B1

São Paulo, 11 de Novembro de 2008 - A ajuda dos governos à economia, na tentativa de conter a forte desaceleração, não pode ser a qualquer custo. Esta foi a principal mensagem do presidente do Banco Central Europeu (BCE), Jean-Claude Trichet, ao conceder entrevista ontem após participar da reunião bimestral do Banco para Compensações Internacionais, na sigla em inglês (BIS, o BC dos bancos centrais). Segundo Trichet, não é possível uma política monetária em comum e cada país deve buscar seu caminho para estimular a economia.

"Em vários países, nós observamos que as expectativas de inflação começam a cair, o que permite uma flexibilização da política monetária", afirmou Trichet. "Os países nessas condições, que possam flexibilizar a política monetária, devem fazê-lo, é uma ajuda bem-vinda neste momento de desaceleração." Trichet citou como exemplo a China, que anunciou um pacote de US$ 586 bilhões para investir em obras de infra-estrutura e bem-estar social até 2010. "A China foi pelo caminho correto", disse ele. "A ajuda, repito, é bem-vinda, mas não pode ser a qualquer custo, não pode comprometer a estabilidade."

O presidente do BC alertou que nem todos os governos podem sair em socorro da economia, ou por conta da persistência das pressões inflacionárias, como ocorre em alguns países do bloco emergente, ou ainda por falta de caixa. "Nos países que estão em boas condições fiscais, com baixo nível de déficit, é apropriado a utilização desta margem de manobra para amortecer o risco de recessão que existe", diz. Perguntado sobre qual seria a alternativa para os países que não têm esta folga para sair em socorro da economia, Trichet evitou citar as possibilidades, dizendo que cada país deve buscar suas alternativas de auxílio.

O movimento global de taxas de juros, desde que a crise se acentuou nos últimos 14 meses, já demonstra as limitações de alguns países em flexibilizar a política monetária. Nos Estados Unidos, epicentro da crise, o juro básico caiu de 5,25% em setembro do ano passado para o atual 1%. Na Europa de Trichet, nos últimos meses o juro básico chegou a ser elevado, por conta da inflação. Em julho deste ano, quando os mercados já tinham na conta uma forte desaceleração, o BCE subiu a taxa de 4% para 4,25%. A curva só se inverteu em outubro, com um corte para 3,75%, e outra redução em novembro, para os atuais 3,25%.

No Brasil, mesmo com a desaceleração no crédito que impacta no crescimento, a Selic subiu de 11,25% para 13,75% - sendo mantida estável na última reunião - na tentativa de conter a inflação. Mesmo assim, no relatório de mercado divulgado ontem, as expectativas seguem piorando. A previsão do IPCA subiu de 6,31% para 6,40% este ano, e de 5,06% para 5,20% em 2009, se aproximando do teto da meta, de 6,5%.

Sobre o fim dos ajustes no mercado financeiro, Trichet não foi muito animador. "No encontro do BIS não discutimos o tamanho deste ajuste, mas o que é certo é o fato de que ele ainda está em curso, não terminou."

(Gazeta Mercantil/Finanças & Mercados - Pág. 1)(Jiane Carvalho)