Título: Bancos de montadoras querem mais ajuda
Autor: Monteiro,Ricardo Rego
Fonte: Gazeta Mercantil, 17/11/2008, Finanças, p. B3

Rio de Janeiro, 17 de Novembro de 2008 - Instituições que nadaram de braçada nos últimos anos, turbinadas pelas vendas recordes de veículos, os bancos das montadoras se preparam para recorrer novamente ao governo, em janeiro, na busca de novas linhas de crédito. Recém-contemplados com um pacote de ajuda de R$ 8 bilhões, por intermédio de Banco do Brasil e Nossa Caixa, os bancos consideram o socorro insuficiente para sustentar a travessia da crise por um prazo superior a dois meses.

Presidente da Associação Nacional das Empresas Financeiras das Montadoras (Anef), Luiz Horácio Montenegro, foi um dos negociadores do pacote com o governo. O executivo confirma que o montante total, tomado a taxas de mercado, contribuirá para mitigar a situação das instituições nos dois últimos meses do ano, quando tradicionalmente as montadoras subsidiam as taxas de venda dos veículos.

Apesar da crise, o executivo projeta um 2008 como o melhor ano da história do setor. Justifica que, embora tenha assistido a um crescimento de vendas de 24,2% na comparação com 2007 -inferior aos 27,9% do ano passado frente a 2006 -, em números absolutos, as vendas deste ano, de mais de 3 milhões de veículos, vão superar as do ano anterior.De acordo com a Associação Nacional de Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea), o crédito é essencial para o setor automotivo brasileiro, uma vez que 70% das vendas aos clientes são fechadas a prazo.

Pelas regras já reveladas do pacote de ajuda, o Banco do Brasil receberá como garantia as carteiras de crédito dos bancos das montadoras. A fonte dos R$ 4 bilhões que caberão ao BB será o compulsório liberado pelo Banco Central (BC). Os juros serão os cobrados nas linhas interbancárias (CDIs), com base no perfil de risco de cada banco tomador.

Já a Nossa Caixa, de São Paulo, vai destinar outros R$ 4 bilhões para cerca de 15 financeiras de montadoras. Os recursos terão como destino a compra financiada de veículos pelos consumidores, por meio de operações com prazo de até 18 meses. Os recursos terão como garantia, para a Nossa Caixa, os recebíveis dos empréstimos para a compra de veículos originados pelos bancos das montadoras.

Especialistas do setor advertem que, muito mais do que uma operação de socorro oficial, os empréstimos aos bancos das montadoras embutem uma oportunidade aguardada pelo Banco do Brasil. Não por coincidência, o anúncio do pacote ocorreu apenas uma semana antes da aprovação da Medida Provisória 443. Aprovada pela Câmara na última quarta-feira, a MP autoriza os bancos oficiais federais a incorporar outras instituições financeiras, sem licitação e mediante pagamento em dinheiro.

A aquisição desse tipo de banco, na avaliação de especialistas do setor, reforçaria a posição do BB no segmento automotivo. Em agosto, os empréstimos da instituição para aquisição de veículos somavam R$ 5 bilhões.

Procurado pela reportagem, o banco GMAC, pertencente à montadora americana General Motors, não quis se pronunciar. Por intermédio de sua assessoria de imprensa, no entanto, revelou que, de uma certa forma, o pacote de ajuda já surtiu efeito, ao contribuir para a flexibilização das condições de financiamento, nos últimos dias. Depois de baixar o prazo médio de pagamento para 48 meses, o banco o elevou para 60 meses. Nada que se compare aos 80 meses dos bons tempos de vacas gordas do setor, mas uma ligeira melhora em um cenário de turbulência.

O Banco Guanabara, especializado no financiamento de ônibus e caminhões da marca Mercedes, parece representar exceção na atual conjuntura financeira global. Pelo menos no que depender das palavras do superintendente financeiro da instituição, Roberto Leonardo Moreira, que revela um aumento da procura por financiamentos em outubro, em plena quebradeira dos mercados.

Fundado pelo empresário paraense Jacob Barata, detentor de 25% da frota rodoviária no Estado do Rio de Janeiro, o Guanabara opera há 21 anos no mercado. Com R$ 750 milhões em ativos, o Guanabara tem crescido nos últimos cinco anos a uma média de 17% ao ano. Com foco voltado para clientes corporativos -empresas de transporte rodoviário ¿, o banco tem conseguido minimizar o impacto da crise, de acordo com Moreira. "À medida que a crise recrudesceu, maior tem sido o número de passageiros que têm procurado viajar menos de avião e mais de ônibus", revela Moreira. "Isso tem gerado um impacto positivo sobre as empresas do setor, que têm sido obrigadas a investir no aumento da frota."

Apesar do discurso triunfal, o superintendente do Guanabara admite uma piora nas condições de financiamento, como conseqüência da crise, nos últimos dois meses. Se antes o rol de exigências incluía o equivalente a 70% de garantias e até 12 meses de prazo, hoje prevê até 100% de garantias e seis meses de prazo para amortização dos financiamentos.

Caro ou não, o atual custo do financiamento, de acordo com Montenegro, da Anef, permanecerá nesse patamar ainda por um bom tempo. Como reflexo da crise, justifica, o mercado tenderá ao maior conservadorismo nos próximos meses - quiçá anos. Palavras como seletividade e cautela deverão ser ouvidas com mais freqüência por quem se arriscar a tomar empréstimos na atual conjuntura.

"Essa é uma situação que nada tem a ver com a saúde dos bancos brasileiros", ressalta o presidente da Anef. "Nenhuma instituição daqui adquiriu os chamados ativos tóxicos (títulos lastreados em hipotecas concedidas sem garantias, muito popular nos Estados Unidos e na Europa). Comparado com os bancos estrangeiros, os daqui encontram-se em situação bem diferente."

O que tanto Montenegro quanto Moreira, do Guanabara, não admitem, no entanto, é que os bancos das montadoras se encontram hoje na condição de caça. Montenegro argumenta que as montadoras vão precisar dessas mesmas instituições para financiar suas vendas no mercado brasileiro. "Os bancos hoje são estratégicos para as montadoras", afirma o executivo, ao contrariar os prognósticos de boa parte do setor.

(Gazeta Mercantil/Finanças & Mercados - Pág. 3)(Ricardo Rego Monteiro)