Título: Proposta vai enfrentar mais resistência em plenário
Autor: Seabra,Marcos
Fonte: Gazeta Mercantil, 21/11/2008, Política, p. A8

São Paulo, 21 de Novembro de 2008 - O projeto de reforma tributária, cujo relatório final foi aprovado na madrugada de ontem na Comissão Especial que analisa o tema na Câmara, vai sofrer forte resistência das bancadas lideradas pelos governadores. Ontem, o líder da minoria no Senado, José Agripino Maia (DEM-RN) deu uma prévia do que deve ser a próxima semana, quando o projeto já poderá ser votado. "Deixa chegar no plenário para ver uma coisa, veremos o que vai acontecer com a influência dos governadores e suas bancadas. Vai se repetir o que já aconteceu um tempo atrás: as influências vão se manifestar no plenário", previu Agripino.

Para o líder da minoria no Senado, do jeito que está, o projeto não será aprovado. "Se não se conseguiu aprovar a reforma tributária em uma época de normalidade da economia, com previsibilidade de receitas para estados e municípios, eu duvido que se consiga esse milagre agora, dentro de uma crise e quando os estados não sabem o que vai acontecer com as receitas dos próximos meses. Sou cético com essa aprovação", acrescentou.

O relator da proposta, o deputado Sandro Mabel (PR-GO), por sua vez acha que está tudo bem, mas ainda há muito a ser negociado. "A proposta principal não foi alterada, as emendas aceitas foram para acrescentar alguma coisa ou suprimir algo periférico do relatório. O grosso não foi alterado", disse. O relator considera normal negociar com os governadores e reconhece que os estados poderão perder arrecadação. "Negociar com os governadores é uma coisa normal, nós temos que respeitar pois eles tem medo das perdas, temos que ter compreensão nessa hora e nos colocarmos no lugar deles. De qualquer forma, foram negociações normais sem nenhum tipo de problemas", afirmou Mabel.

Na avaliação de Mabel, o projeto está pronto para ser votado em plenário já na próxima semana, mas serão necessários vários acertos. "Vamos ter que negociar ainda mais. Muita coisa ainda precisa ser acertada", acrescentou o relator do projeto, para quem as contas já começaram a ser feitas. Por se tratar de uma emenda constitucional, para a aprovação do projeto serão necessários 308 votos favoráveis. "O presidente Arlindo (Arlindo Chinaglia, do PT de São Paulo, presidente da Mesa da Câmara) quer medir como estão os partidos, mas já estamos e um trabalho de articulação para ver se colocamos a matéria em votação na próxima semana", prevê Mabel. "Mas temos que avaliar bem a situação, pois uma emenda constitucional, com 308 votos, não pode entrar na pauta de qualquer jeito, não é fácil de conseguir a aprovação", finaliza.

Desastre

Outro crítico do relatório aprovado na madrugada de ontem é o líder da minoria na Câmara, o deputado José Carlos Aleluia (DEM-BA). Para ele, o projeto é um desastre. "Para os estados do Nordeste foi um desastre. Os atuais governadores vão pagar no futuro pela omissão na aprovação da reforma tributária", profetizou Aleluia. Para ele, os estados perdem o controle sobre a arrecadação. "Eles perdem a capacidade de promover desenvolvimento, perdem receita e capacidade de gerir seus tributos, e, com isso, a autonomia. Logo vão estar com o pires na mão porque vão perder arrecadação e vão ficar na dependência de fundos", acrescentou o deputado.

Para o líder da minoria na Câmara, a aprovação da proposta de reforma tributária passou sim pela negociação política. "Esses governadores estão trocando a obediência ao Planalto pela independência do estado. Eles vão ser acusados por omissão, e é um crime que o eleitor não costuma perdoar", prevê.

No entender dos governistas no Congresso e do governo a reforma vai simplificar o sistema tributário brasileiro, que é um dos mais complexos do mundo, e acabar com a guerra fiscal entre os estados. "Ao racionalizar a cobrança de tributos, a reforma poderá contribuir, a médio e longo prazos, com a redução da carga tributária, que hoje é de aproximadamente 37% do PIB", defendeu o presidente da Comissão Especial da Reforma Tributária, o ex-ministro da Fazenda e deputado, Antonio Palocci (PT-SP).

Ontem, os partidos de oposição (DEM, PSDB, Psol, PV e PPS) votaram contra o texto-base da reforma. A proposta será enviada agora ao Plenário, onde precisa ser votada em dois turnos, para depois ser encaminhada ao Senado Federal.

Pilares

Um dos pilares da proposta do governo é a criação do Imposto sobre Valor Adicionado Federal (IVA-F), a partir da fusão do PIS/Pasep, da Cofins e da contribuição para o salário-educação. Se a arrecadação do novo tributo superar a soma dos anteriores, o governo será obrigado a reduzir alíquotas.

Já para acabar com a guerra fiscal, o texto prevê punições para os estados que insistirem nessa política, com a interrupção das transferências de recursos da União. Entretanto, para cancelar um incentivo fiscal que se caracteriza como guerra fiscal, será necessária a aprovação pela maioria dos integrantes do Conselho de Administração Fazendária (Confaz), com voto de representantes de todas as regiões do País. O quorum passou a ser de 4/5 dos votos. O relatório inicial mantinha o quorum atual, de maioria simples.

O texto deixa claro que a Previdência não perderá receitas com a desoneração da folha de pagamento dos empregados também incluída no projeto. Segundo o relatório, se no primeiro ano após a aprovação da reforma tributária não for aprovado um projeto sobre o assunto, a partir do segundo ano haverá redução de um ponto percentual por ano da contribuição previdenciária do empregador, por seis anos (de 20% para 14%). Com a redução, o INSS perderá R$ 4 bilhões ao ano.

Mabel fez uma série de concessões de última hora aos governos estaduais. Para atender aos estados do Nordeste, principalmente, ele ampliou os recursos do Fundo Nacional de Desenvolvimento Regional (FNDR), elevando-os de R$ 2,8 bilhões para R$ 3,5 bilhões. Esse fundo vai ajudar os estados a financiar projetos de investimento em infra-estrutura, para compensar a proibição de novos benefícios e incentivos fiscais de ICMS, como fator de atração de investimentos.

Foi mantido ainda o dispositivo que interessa ao Rio de Janeiro, que é produtor de petróleo: a taxação de 2% ou 3% do petróleo e da energia elétrica na alíquota que permanecerá nos estados de origem. Hoje, eles são taxados apenas nos estados de destino.

Uma das grandes preocupações dos estados era a desoneração de bens de uso e consumo das empresas, cujas aquisições passarão a gerar direito a crédito tributário de ICMS. Só o estado de São Paulo estima perdas de R$ 7 bilhões por ano, em valores atuais, com essa desoneração. Mabel propôs que o aproveitamento desses créditos se inicie somente no nono ano subseqüente ao da aprovação e promulgação da reforma.

Haverá também uma transição de 12 anos para ajuste dos incentivos fiscais dados pelos estados na cobrança do ICMS e que constarem dos orçamentos estaduais. Dessa forma, os estados ganham um tempo para estabelecer outros incentivos que não os ligados às atividades produtivas e sociais listadas pela reforma (dos setores industrial, agropecuário, cultural, social e esportivo, e de programas habitacionais).

(Gazeta Mercantil/Caderno A - Pág. 8)(Marcos Seabra)