Título: Lula endurece com Equador e chama embaixador ao País
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Fonte: Gazeta Mercantil, 24/11/2008, Internacional, p. A16
24 de Novembro de 2008 - O embaixador do Brasil no Equador, Antonino Marques Porto, retornou ao País e no último sábado esteve reunido com o ministro das Relações Exteriores (MRE), Celso Amorim, em Brasília, na busca de saídas para solucionar o problema relacionado à decisão do governo equatoriano de aplicar calote na dívida com o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), no valor de US$ 243 milhões. Os assessores do Itamaraty informaram que as duas autoridades voltarão a se reunir nos próximos dias para "avaliar tal situação e definir os próximos passos".
Brasília convocou o embaixador após a decisão do presidente do Equador, Rafael Correa, de iniciar um processo internacional para não pagar o empréstimo tomado junto ao BNDES para a construção da hidrelétrica de San Francisco. A convocação de um embaixador é considerada medida hostil, uma advertência sobre a possibilidade de interrupção das relações, decisão poucas vezes tomada pelo governo brasileiro na América Latina. Em 2006, o ministro Amorim ameaçou chamar de volta o embaixador em La Paz, quando recrudeceu a crise do governo boliviano com a estatal Petrobras, mas optou por solucionar o problema por meio do diálogo. Esta é, portanto, a primeira vez no governo Lula em que uma decisão desse porte é tomada.
Correa disse, também no sábado, que está "sentido" com a decisão do Brasil de chamar Porto para consultas. Após algumas tentativas, o presidente equatoriano conseguiu conversar por telefone na manhã de sábado com o presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, e reafirmou que "independentemente do carinho que tem pelo Brasil", não desisitirá do processo. "O Brasil nos retira seu embaixador e esta medida nos entristece muito, como dissemos ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Ele tem nosso respeito, compartilhamos isto, mas não vamos recuar na defesa dos interesses do país, custe o que custar", disse Correa em seu programa nacional de rádio e TV. "Não entendemos o motivo deste incidente diplomático por algo que é um problema claramente comercial e financeiro (...) Não há que brigar com o Brasil, mas se este é o caso, que cada um assuma a sua responsabilidade."
Na conversa curta, Lula confirmou sua insatisfação em relação à forma com que o governo equatoriano conduziu a questão, anunciando a decisão em público e sem antes comunicar o Brasil, e condicionou uma tomada de posição a futuras conversas com o embaixador e com a diretoria do BNDES. Segundo informações da assessoria de imprensa do Palácio do Planalto, Correa disse ainda que não teve a intenção de gerar desconforto nas relações bilaterais, ao anunciar que recorrerá à Corte Internacional de Arbitragem da Câmara de Comércio Internacional contra o pagamento do empréstimo.
O processo jurídico para denunciar o crédito foi anunciado por Correa na última quinta-feira, durante a divulgação de resultados de uma auditoria sobre a dívida externa equatoriana. O Equador questiona a legalidade da dívida por terem sido constatadas irregularidades na obra, executada por um consórcio integrado pela construtora brasileira Norberto Odebrecht. O BNDES financiou a construção da hidrelétrica de San Francisco, que interrompeu suas operações por falhas técnicas apenas um ano depois da conclusão da obra. Devido ao problema, Correa decidiu expulsar a Odebrecht do país. Segundo o governo do Equador, o dinheiro foi fornecido à construtora pelo BNDES, e Quito considera que a dívida não é de sua responsabilidade. Correa disse que "diante da polêmica, recorreu à arbitragem em Paris", mas destacou que "não houve uma suspensão de pagamento".
Durante a semana passada, autoridades brasileiras, como o assessor de Assuntos Internacionais da Presidência da República, Marco Aurélio Garcia, demonstraram preocupação com a atitude, classificada por Garcia como um "erro". Na sexta-feira, a chancelaria equatoriana deplorou a decisão do Brasil de chamar seu embaixador e defendeu que a polêmica seja "resolvida pelos canais jurídicos (...) sem que esta situação afete as excelentes relações existentes" entre os dois países. Além de chamar seu embaixador em Quito, o ministro Amorim disse que o Brasil analisará outras ações e vai examinar a cooperação com o Equador.
Todas as exigências previstas na legislação tanto do Equador quanto do Brasil foram rigorosamente cumpridas na assinatura do contrato para a concessão do empréstimo, informou o BNDES. A instituição ressaltou, inclusive, que o contrato, firmado com a Hidropastaza, em abril de 2000, foi aprovado pelo Congresso Nacional do Equador.
(Gazeta Mercantil/Caderno A - Pág. 16)(Viviane Monteiro, Agência Bra sil e AFP)