Título: Calote equatoriano afeta os países da região, diz Amorim
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Fonte: Gazeta Mercantil, 25/11/2008, Internacional, p. A13

Brasília, 25 de Novembro de 2008 - O calote no pagamento da dívida ao Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) pelo Equador deve aumentar o custo de operações de empréstimos para investimentos em países vizinhos, porque eleva o prêmio de risco, disse o Ministro das Relações Exteriores do Brasil, embaixador Celso Amorim. "Isso não é ameaça, é uma conseqüência provável", enfatizou o ministro brasileiro.

A decisão terá efeitos negativos sobre os 12 países integrantes da Associação Latino-Americana de Integração (Aladi). "Qualquer inadimplência vai além das relações Brasil-Equador", avaliou ontem Amorim, referindo-se ao fato de que a operação está sob o guarda-chuva do Convênio de Pagamentos e Créditos Recíprocos, o CCR.

O CCR é um antigo mecanismo de compensação firmado entre os países da Aladi, que facilita as negociações comerciais entre os participantes. Se o presidente Rafael Correa não mudar de opinião, a credibilidade do CCR fica afetada. Integram a Aladi a Argentina, Bolívia, Brasil, Chile, Colômbia, Cuba, Equador, México, Paraguai, Peru, Uruguai e Venezuela.

Segundo Amorim, as empresas perceberão o aumento de dificuldades para obter crédito para fazer projetos em países vizinhos. "Ao deixar claro que a garantia do CCR não é tão boa quanto se pensava, vai prejudicar outros países", afirmou Amorim. O ministro disse que a crise com o Equador é diferente do que houve na invasão de unidades da Petrobras na Bolívia. Segundo Amorim, não houve qualquer pré-notificação equatoriana sobre intenções de suspender pagamentos ao BNDES. "Na véspera do evento, nosso embaixador esteve com o vice-ministro das relações exteriores do Equador e não ouviu nada", declarou.

A obra que gera o impasse atual é o de construção da hidrelétrica de San Francisco, que contou com financiamento de US$ 243 milhões do BNDES e foi desenvolvida pela Odebrecht. Correa questiona o pagamento na Corte Internacional de Arbitragem da Câmara de Comércio Internacional (CCI), que tem sede em Paris.

Havendo ou não recuo de Rafael Correa quanto ao pagamento ao BNDES, a postura brasileira na avaliação de novos projetos no Equador já foi prejudicada. Segundo Amorim, o Brasil não vai fazer nada que prejudique o povo equatoriano, referindo-se a acordos de natureza social. O certo é que projetos empresariais no Equador passarão por um crivo bem mais rígido. "Não por retaliação, mas por precaução", disse o ministro brasileiro, "os projetos que envolvem financiamentos terão que ser muito bem avaliados". "Não fazemos isso com coração leve, com prazer ou satisfação", declarou Amorim.

O chanceler informou que um diplomata brasileiro já está trabalhando em parceria com o BNDES para verificar como será tratado o impasse com o Equador. "Uma coisa parece certa. O empréstimo do BNDES é irrevogável e independente. Está garantido pelo CCR", disse Amorim. O ministro disse que Itamaraty e BNDES estão fazendo análises sobre os aspectos técnicos e jurídicos, verificando inclusive se é procedente que a CCI seja acionado na reclamação movida por Correa.

O presidente equatoriano alega problemas na obra para justificar o corte de pagamentos ao banco público brasileiro. O BNDES financia projetos em outros países latino-americanos, como o metrô de Caracas, capital da Venezuela; e gasoduto na Argentina. Correa, entretanto, não ameaça deixar de pagar somente o BNDES. Em meados de novembro, o presidente do Equador ameaçou deixar de honrar pagamentos referentes ao bônus global 2012, de cerca de US$ 31 milhões. Segundo Correa, a decisão pelo pagamento ficou adiada para 15 de dezembro e, até lá, haverá decisão por abrir "uma batalha judicial" contra o que foi chamado "um verdadeiro assalto contra o país".

Ontem, em meio à crise com o Equador, o Itamaraty realizou a I Reunião Ministerial Mercosul-Asean (Associação das Nações do Sudeste Asiático). Tais países tem uma população total de 575 milhões de habitantes, PIB de US$ 1,28 trilhão em 2007 e corrente global de comércio exterior um pouco a baixo de US$ 1,6 trilhão nesse período. Ou seja, se parcerias com vizinhos está sendo algo difícil para administrar, o Brasil está incentivando o Mercosul a buscar parcerias no outro lado do mundo. Amorim e o ministro das Relações Exteriores da Tailândia e atual presidente da Asean, Sompong Amornvivat, indicaram intenções de ampliar trocas comerciais e avançar rumo a negociações de aberturas de mercados. Técnicos dos dois blocos realizam reunião na Malásia em março, em preparativa para reunião de ministros a ser realizada paralelamente à próxima Assembléia-Geral da ONU. Segundo o Itamaraty, a reunião ministerial Mercosul-Asean marca o início de diálogo estruturado entre duas das mais importantes regiões do mundo em desenvolvimento.

(Gazeta Mercantil/Caderno A - Pág. 13)(Ayr Aliski)