Título: Fundos buscam oportunidades na crise
Autor: Rosa,Silvia ; Feltrin, Luciano
Fonte: Gazeta Mercantil, 02/12/2008, Finanças, p. B2

São Paulo, 2 de Dezembro de 2008 - O agravamento da crise financeira no mercado internacional não foi capaz de frear o ânimo dos investidores institucionais. Os fundos de private equity e venture capital mantêm seus planos de investimento no País.

Durante o primeiro semestre deste ano, foram abertos 24 fundos, que captaram US$ 2,6 bilhões, somando US$ 26,6 bilhões em capital comprometido.

Os dados integram o levantamento realizado pelo Centro de Estudos de Private Equity da Fundação Getúlio Vargas (GVcepe) em parceria com o Instituto Endeavor, publicado pela revista GazetaInveste, publicada pela Gazeta Mercantil, cujo lançamento ocorreu ontem. "Há ainda cerca de US$ 8,6 bilhões em fundos que estão em fase de captação", lembrou Claúdio Furtado, diretor do GVcepe e um dos coordenadores do estudo, durante evento de divulgação da versão 2008 do Guia GVcepe-Endeavor.

Tradicionais incentivadores da indústria de private equity, os fundos de pensão brasileiros têm aumentado seus investimentos nesse setor, contribuindo atualmente com 24% do volume total do capital comprometido, atingiram participação de 50% nas captações fechadas neste ano.

Só o Petros, fundo de pensão dos funcionários da Petrobras, tem R$ 2,4 bilhões aprovados para investimento em private equity e venture capital. Do montante, R$ 800 milhões já foram liberados. O limite de investimento é de até 10% do patrimônio da fundação, que soma R$ 39 bilhões, para alocação em fundos de private equity e de até 1% para venture capital. "A alocação em fundos de private equity e venture capital casa com nosso perfil de investimento de buscar rentabilidade no médio e longo prazo", afirma Luís Carlos Afonso, diretor de investimentos da Petros.

Segundo Afonso, cerca de 26% da carteira da fundação está alocado em renda variável. A maior parte em participações diretas e em fundos de participação. "Já investimos em cerca de 20 fundos, sendo 14 de private equity e seis de venture capital", afirma.

Afonso ressalta que, com a queda do valor dos ativos em bolsa, a fundação também estuda a possibilidade de investir em empresas de capital aberto. "Alguns ativos estão tão descontados que o preço atual fica abaixo do valor projetado para um cenário de estresse do mercado", explica.

Já a Previ, maior investidor institucional da América Latina, tem cerca de R$ 420 milhões de capital comprometido para private equity e venture capital. "Hoje estamos sobrealocados em renda variável de acordo com a resolução 3.456 do Conselho Monetário Nacional (CMN) - que limita em 50% a alocação em renda variável - com cerca de 60% de nosso patrimônio, hoje em R$ 130 bilhões, alocados em renda variável. Por isso estamos mais limitados para ampliar nossos investimentos nos segmentos", diz o diretor da Previ, Antônio Luiz Benevides Xavier.

Com a retração do mercado acionário, outras categorias de investidores, caso dos "family offices", firmas especializadas na gestão de fortunas, começam a ganhar espaço no Brasil.

A TMG Capital acaba de captar cerca de US$ 200 milhões com investidores estrangeiros para seu segundo fundo de private equity. Segundo o sócio e presidente da gestora, Luiz Francisco Novelli Viana, a maior parte dos recursos foi captado com family offices e "endowments". Trata-se de fundos de doações à universidades e fundações. A gestora inicia agora a fase de captação no mercado doméstico e espera fechar o fundo com cerca de US$ 400 milhões. "O aumento do interesse das family offices e das pessoas físicas de alta renda no setor de private equity é um fenômeno novo, que deve crescer no Brasil com a queda da taxa de juros", afirma.

O primeiro fundo da gestora, lançado em 1997, de US$ 100 milhões, tinha como foco os setores de saúde, teleserviços, mídia e BPO (processamento de cartões) e investiu em quatro empresas: Softway, TaxiMania, Conductot e Odontoprev. Esta última já passou pelo processo de abertura de capital. "Alcançamos nesse fundo uma taxa de retorno de 47% ao ano, devolvendo para nossos acionistas cerca de 15 vezes o capital investido", destaca Viana.

A estratégia do fundo é adquirir empresas plataformas, que sejam atrativas, seguida por aquisições complementares para vitaminá-las. O novo fundo deverá aplicar entre US$ 30 milhões a R$ 70 milhões por empresa.

Viana ressalta que, apesar do crescimento dos investimentos dos investidores estrangeiros no Brasil, o capital direcionado para os mercados da Índia e da China ainda é cerca de dez vezes maior que o alocado para o País. "O número de gestores no Brasil ainda é muito pequeno perto do tamanho da nossa economia. Além disso, falta maior divulgação das melhorias institucionais e do ambiente regulatório do Brasil, que nos dá uma condição mais avançada que o ambiente de negócios dos países asiáticos", diz.

Os fundos de private e venture capital contavam , até o primeiro semestre, com 481 empresas em carteira.

O mercado brasileiro ainda tem grande potencial para ser explorado. Hoje existem cerca de 600 mil empresas com potencial para receber investimentos de fundo de capital semente (seed capital), 21 mil empresas em estágio avançado e outras 13 mil em fase de expansão, além de 8 mil consolidadas.

Melhorar o ambiente

O desenvolvimento da indústria de private equity no País deverá fazer com que, em pouco tempo, investidores institucionais e gestores de recursos possam definir com clareza o papel de cada um na hora de entrar e sair de uma companhia. Atualmente, os fundos de pensão locais - principais fontes para levantar capital em ativos interessantes - participam dos comitês de investimento dos fundos. O modelo é visto como imperfeito por profissionais, uma vez que torna menos dinâmica a atuação do gestor. Um exemplo desse "engessamento" pode ser visto na prática. As carteiras precisam da aprovação dos fundos de pensão para entrar em novos investimentos. "Ainda estamos na fase de ajustar os papéis do gestor e do detentor do capital. Isso limita a atividade do gestor e cria algumas responsabilidades para o detentor dos recursos", exemplifica o sócio do TMG Capital, Luiz Francisco Viana.

Segundo o executivo, ao alinhar esses papéis, o País tenderá a tornar-se ainda mais atrativo para investidores de diferentes perfis da cadeia de capital empreendedor. E aproximar-se de outros países emergentes. "Quando nos comparamos com mercados como China e Índia, vemos que ainda temos a necessidade de estruturar nossa indústria", afirma.

Para a Petros, investidor institucional cujo principal patrocinador é a Petrobras, a elevação dos níveis de governança corporativa entre fundos de private equity e de pensão só ocorrerá com o aprimoramento do modelo vigente. "A participação dos institucionais nos comitês de investimentos ainda são necessárias ao nosso ver. Temos de construir uma relação que se ajuste às particularidades do mercado local", afirma o diretor de investimentos da Petros, Luís Carlos Afonso.

As oportunidades dos fundos na crise também atingem as empresas de capital aberto. Fundos com perfil financeiro ou estratégico começam a comprar participações relevantes nas empresas com ações em bolsa.

(Gazeta Mercantil/Finanças & Mercados - Pág. 3)(Silvia Rosa e Luciano Feltrin)