Título: Meio século de uma revolução bem-sucedida
Autor: Salles, Gabriel De
Fonte: Gazeta Mercantil, 09/01/2009, Opinião, p. A3

9 de Janeiro de 2009 - Convalescentes de graves traumatismos causados por "investimentos exóticos", ainda chocados com alguns "circuit brakers", tentando se equilibrar em meio a sufocos provocados por "ativos tóxicos", idólatras do liberalismo econômico - os mesmos que renegam o Estado, mas veneram os cofres públicos - não perderam de todo a pose e se dedicaram neste fim de ano a criticar Cuba, aproveitando-se das comemorações dos 50 anos da vitoriosa revolução liderada por Fidel Castro.

Com poucas exceções, nos meios de comunicação, repetiu-se argumentação velha e enfadonha sobre as mazelas do socialismo, o sofrimento de um povo sem liberdade, falta de perspectivas dos jovens, e por aí afora. "Um país em frangalhos", alguém escreveu. Foram poucos os comentários isentos, mostrando, por exemplo, aspectos positivos do dia-a-dia dos cubanos e suas conquistas neste meio século. Não se repetiu, na maioria das análises, a extrema dedicação de seus autores quando se trata de louvar práticas como as que levaram à crise do subprime. E até que não seria necessário muito esforço. Bastaria uma consulta a sites de organismos isentos como a Unesco, Organização Mundial da Saúde e a Comissão Econômica para a América Latina e Caribe (Cepal), entre outros.

Num relatório preliminar sobre o desempenho das economias da América Latina e Caribe, divulgado pouco antes do Natal, a Cepal situa Cuba com um crescimento econômico de 4,3% em 2008, modesto se comparado com os líderes Uruguai, Peru e Panamá, cujo crescimento previsto é de 11,5%, 9,4% e 9,2%, respectivamente, mas superior, por exemplo, ao México, que crescerá apenas 1,8%. Assolada impiedosamente pelos furacões Gustav e Ike, Cuba arcou com perdas superiores a US$ 10 bilhões, em 2008, o que comprometeu os resultados da economia do país, que não repetiu os bons desempenhos de 2006, quando liderou o crescimento entre os latinos com 12,1%, e de 2007, ano em que, mesmo sem liderar, apresentou o bom índice de 7,3%. Apesar das catástrofes climáticas, o índice preliminar de 4,3% também está acima de países como o Chile (3,8%) e Colômbia (3,0%).

Nas projeções para 2009, quando os países da América Latina poderão ser fortemente atingidos pela retração das economias desenvolvidas, a Cepal anuncia índices bem mais modestos que em 2008, colocando o Peru como o líder, com 5%. Cuba volta a ocupar posição de destaque, com crescimento previsto de 4,0%, dividindo o terceiro lugar com o Uruguai e um pouco abaixo do Panamá, que é o segundo colocado com 4,5%. O Brasil, classificado com 5,3% em 2008, ficará com modestos 2,1%, sempre segundo a Cepal, que novamente não poupa o México, relegando-o à ultima colocação com 0,5%. O país que há pouco tempo era usado como exemplo das vantagens de se aderir ao Nafta, o bloco comercial comandado pelos Estados Unidos, deverá crescer menos que o Haiti (1,5%) e El Salvador (1%).

O pessimismo reinante nos países de economia "aberta", como é o caso brasileiro, a julgar pelo que prevê a Cepal, não se aplica a Cuba. Ao completar meio século de processo revolucionário, a ilha caribenha registra o segundo mais baixo índice de mortalidade infantil das Américas, com 5,3 mortes por mil nascidos vivos, atrás apenas do Canadá. No plano econômico, o governo cubano anuncia uma política de estímulo a pequenos e médios empreendedores rurais, enquanto continua diversificando a pauta de exportações, que deixou de depender dos derivados da cana-de-açúcar. Abrange agora, além de matérias-primas como o níquel, produtos de ponta, onde se destacam os medicamentos, insumos e serviços de saúde. Os profissionais cubanos dessa área distribuem-se hoje por cerca de 40 países.

Avaliações recentes de autoridades do setor de turismo minimizam os efeitos da crise global, mantendo a projeção de novamente bater o recorde de turistas estrangeiros na ilha, que deverá se aproximar dos três milhões de pessoas, oriundas principalmente do Canadá e União Européia.

São números renegados pelos neoliberais, mas que testemunham que nem tudo é tragédia entre os cubanos

kicker: Cuba deverá crescer 4% em 2009, um dos maiores índices do continente

(Gazeta Mercantil/Caderno A - Pág. 3) GABRIEL DE SALLES* - Editor E-mail: gsalles@gazetamercantil.com.br)