Título: Lula e Raúl afinam discurso e defendem o fim do embargo
Autor: Correia,Karla
Fonte: Gazeta Mercantil, 19/12/2008, Internacional, p. A14

Brasília, 19 de Dezembro de 2008 - Já distante da fase de abalo diplomático nas relações entre Cuba e Brasil por conta das duras críticas tecidas pelo governo daquele país à política brasileira de biocombustíveis, os presidentes cubano, Raúl Castro, e Luiz Inácio Lula da Silva defenderam ontem o fim do embargo econômico à ilha caribenha.

Raúl chegou a mencionar a possibilidade de libertação de presos políticos como um gesto do governo cubano para permitir o diálogo com o futuro governo norte-americano, na administração do presidente eleito dos Estados Unidos, Barack Obama.

Contudo, aproveitou para cobrar gestos semelhantes do governo norte-americano. "Os prisioneiros de que tanto se fala, querem soltá-los? Nos digam amanhã e vamos mandá-los com família e tudo", disse o presidente cubano que, depois, fez referência aos cinco cidadãos cubanos mantidos presos nos EUA por acusação de espionagem e conspiração desde 1998. Os cinco são tratados como heróis pelo regime cubano.

"Devolvam nossos heróis", cobrou Raúl, "este precisa ser um gesto de ambas as partes".

Em discurso durante almoço oferecido em Brasília ao chefe de Estado cubano, Lula defendeu a revogação do ato que, em 1962, expulsou Cuba da Organização dos Estados Americanos (OEA) e disse esperar a adesão de outros países em uma campanha pela suspensão do embargo ao país caribenho.

"Em algum momento alguém tem de pedir desculpas pela injustiça histórica que se cometeu contra Cuba. Eu não tive vergonha de ir à África me desculpar pelos 300 anos de escravidão dos negros no Brasil", disse Lula depois do evento. Segundo o presidente brasileiro, a expectativa é que com o governo de Barack Obama, a política externa dos EUA seja mais flexível. Na fase de transição entre governos, Obama, que toma posse em 20 de janeiro, já mencionou a intenção de "aliviar" restrições a viagens e remessas de dinheiro à ilha. Condiciona o fim do embargo, entretanto, a um processo de democratização em Cuba.

Mesmo já tendo sinalizado boa vontade em retomar diálogo com os EUA, Raúl questionou a necessidade de gestos políticos do governo cubano em direção aos EUA. "Há que se perguntar por que e para que ainda existe o embargo a Cuba, no cenário internacional de hoje", ponderou.

Voz própria

O presidente cubano apoiou a criação de um organismo multilateral unindo países da América Latina e do Caribe como forma de fortalecer o relacionamento político e comercial entre essas nações. O encontro entre os países latino-americanos realizado esta semana na Costa do Sauípe (BA) foi considerado como o primeiro passo para a implantação desse organismo.

"Nós, os latino-americanos, somos maiores de idade, já podemos ter voz própria e dizer aos nossos vizinhos do Norte, do nosso continente, como a Europa, a Ásia e ao mundo inteiro, que podemos dar passos que conduzam a essa situação", disse o chefe de Estado cubano, agradecendo o apoio brasileiro ao fim do embargo imposto à ilha.

Fala curta

Foi breve o discurso de Raúl no almoço oferecido pelo governo brasileiro no Palácio do Itamaraty. O presidente brincou com o fato de não falar tanto quanto o irmão, Fidel Castro, conhecido pelas longas falas.

"Costumam dizer que os discursos de Fidel são muito longos, não tanto quanto os de Chávez, mas eu tenho fama de ser mais concreto, menos inteligente, e não posso falar de tantas coisas, muito menos improvisar", disse Raúl, em referência ao presidente venezuelano, Hugo Chávez.

(Gazeta Mercantil/Caderno A - Pág. 14)(Karla Correia)