Título: Crise afeta pesquisas das mineradoras
Autor: Lorenzi,Sabrina
Fonte: Gazeta Mercantil, 12/01/2009, Empresas, p. C1

Rio de Janeiro, 12 de Janeiro de 2009 - Sem caixa para tocar projetos novos, as mineradoras desistiram de explorar mais de três mil áreas desde o começo da crise econômica. O número é dez vezes maior que o total de devoluções e desistências registradas no mesmo período do ano passado, antes de a bolha financeira e mineral estourar.

As empresas devolveram à União 1.523 áreas de exploração desde o começo de outubro ao início de janeiro. No mesmo período do ano anterior, as mineradoras renunciaram a apenas 188 áreas, chamadas tecnicamente de alvarás de pesquisa. Além de a devolução de terras ter crescido oito vezes, as desistências por novos direitos de pesquisa saltaram de 138 para 2.126, conforme o levantamento da Diretoria de Outorga do Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM) para a Gazeta Mercantil.

"Os números dão medo de não termos as jazidas que precisaremos ter daqui a dez anos", comenta o diretor-geral-adjunto do DNPM, João César Pinheiro. Em reunião no mês passado, cerca de 70 empresas procuraram o órgão para pedir medidas de apoio ao setor, como a criação de linhas de crédito pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e o fim de taxas cobradas para a realização de pesquisas minerais. O setor de mineração é dos primeiros a refletir o freio no consumo dos chineses. E a China está reduzindo produção de aço por causa da demanda mais fraca por bens em todo o mundo, a começar pelos Estados Unidos.

"A bolha mineral estourou. Muitas empresas desistiram de investir em novas áreas porque não têm como bancar nem os custos do que já está em andamento", avalia Airton Nogueira, chefe do DNPM em Rondônia, um dos estados castigados por causa do abandono de projetos.

A fuga de investidores das bolsas de valores derrubou os planos da Canameira, subsidiária da canadense Sola Resources. Mesmo diante de importantes descobertas de diamante primário - do tipo mais valioso -, a empresa suspendeu projeto. E, pior: demitiu 50 dos 55 funcionários por falta de recursos. A subsidiária da Sola no Brasil vai devolver de 60% a 70% das áreas que possui hoje. Para cada hectare licenciado para pesquisa, pagam R$ 2. E reclamam.

"Dependemos de investimentos e não temos receita. Vamos caminhar para outras substâncias, materiais que sejam viáveis, com retorno mais rápido que o diamante, como o ferro", revela Rory MacGregor, um dos sócios da empresa canadense.A devolução de áreas afetou a pesquisa de várias substâncias listadas pelo DNPM. Os metais e pedras preciosas são os que mais aparecem na lista do abandono: minério de ferro, cobre, níquel, manganês, zinco, ouro, diamantes. Materiais para construção e fertilizantes são os menos devolvidos, como areia, cascalho, fosfato, argila e mármore. Potássio não está lista de desistência.

"Diamantes e pedras preciosas são dispensáveis, os metais também foram muito afetados. Mas não vivemos sem feijão e isso se reflete na manutenção de áreas de pesquisa de fosfato e potássio", afirma Pinheiro.

A Vaaldiam, maior produtora de diamantes no Brasil, também cogita a possibilidade de ampliar o leque de atividades. "Se há dificuldade com uma substância, é bom diversificar. É uma possibilidade migrar para outras substâncias", afirma Alfredo Perin, executivo responsável pela empresa no Brasil.

"Estamos vivendo um momento de muita dificuldade de caixa e estamos estudando o que fazer. Pode haver venda, joint venture, diversificação", resume Perin. A Vaaldiam já demitiu empregados e devolveu áreas de pesquisa ao DNPM.

A produção foi mais afetada que a pesquisa em Mato Grosso. Das 21 permissões de lavra com mecanização, apenas seis estão funcionando. Mais de 200 pedidos de desistência ou renúncia do alvará de pesquisa, num universo de 1.200, chamaram atenção chefe do DNPM do estado, Jocy Miranda. "Pesquisa mineral é investimento de risco e os investidores correm do risco no momento de crise", lamenta Miranda.

Com atividades no Mato Grosso, a Iciena Resources, por meio da subsidiária Sucunduri Mineração, suspendeu atividades. Prestes a iniciar a sondagens em Paranatinga, a empresa foi pega pela crise. Faltou financiamento para continuar, mas a expectativa é de retomar o projeto ainda neste ano. "Veio essa turbulência e demos um tempo. O plano é recomeçar em 2009", conta o gerente-geral da empresa no Brasil, Oscar Yokoi.

Em Minas Gerais, estado responsável por metade da produção mineral de todo o País, as solicitações por áreas de pesquisa foram reduzidas a um terço após a crise. De janeiro a setembro, o DNPM recebeu das empresas, 35 requerimentos por dia. No último trimestre, a média diária de pedidos caiu para 12, relata o chefe do órgão em Minas, Sérgio Damazo. "Há dez anos também houve um momento muito ruim e, de repente, veio um crescimento acima do limite, que não era real: as empresas vendiam papel. Esta queda vai levar à realidade", avalia.

Damazo lembra que a Vale reduziu produção. A maioria das demissões da empresa no País atingiu os mineiros. Foram 1,3 mil pessoas desligadas da mineradora. O corte na produção de milhões de toneladas de minério de ferro refletiu o freio no consumo de minério de ferro pelo chineses. Pinheiro destacou que dos 38 alto-fornos de ferro-gusa em Minas Gerais, apenas quatro estão funcionando. Uma crise sem precedentes no emprego do povo mineiro.

"Estamos numa crise parecida com a do anos 70, mas que não vai afetar tanto os setores agrícola e de manufatura no Brasil, mas sim a de mineração, de commodities, que depende do consumo do resto do mundo", concluiu Pinheiro.(Gazeta Mercantil/Caderno C - Pág. 1)(Sabrina Lorenzi)