Título: É um começo promissor
Autor: Craveiro, Rodrigo
Fonte: Correio Braziliense, 19/03/2011, Política, p. 11

A Visita de Obama Atento observador da sociedade brasileira, o pesquisador inglês Kenneth Maxwell se mostra otimista com a agenda política e comercial a ser tratada entre os países

O historiador britânico Kenneth Robert Maxwell, 70 anos, fundou em 2006 o Programa de Estudos sobre o Brasil do Centro David Rockefeller para Estudos Latino-Americanos da Universidade de Harvard. O renomado brasilianista vê a visita de Barack Obama ao Brasil como um bom presságio, mas admite que tanto ele quanto Dilma Rousseff terão de trabalhar duro e enfrentar negociações difíceis para balancear as relações entre os dois países. Em entrevista exclusiva ao Correio, por e-mail, ele lembrou que a vinda do democrata também é uma oportunidade de estreitar os laços pessoais entre os dois chefes de Estado. Maxwell admite que Dilma atravessa um momento político menos tortuoso que Obama ¿ obrigado a lidar com as revoltas no Oriente Médio, com a possível recessão japonesa e com a crise econômica em seu próprio país e na Europa.

Ponto a ponto

INTERESSES EM COMUM O encontro entre Obama e Dilma Rousseff já será histórico pelo fato de o primeiro presidente negro dos EUA se reunir com a primeira mulher presidente do Brasil. É bom que Obama visite o país, ainda que tardiamente, em um momento importante para o governo Dilma. O encontro também é positivo no sentido de que é uma oportunidade para se estabelecer um laço pessoal mais forte entre os dois presidentes e isso não deve ser subestimado. Obama também estará levando sua mulher, Michelle, e as filhas, Sasha e Malia. Aparentemente, ele pretende se concentrar em assuntos de economia. Mas aqui há problemas mais complicados. Os Estados Unidos gozam de uma balança comercial substancial com o Brasil, apesar do fato de que os chineses já substituíram os norte-americanos como principais parceiros de negócios dos brasileiros. A balança comercial positiva dos EUA é favorecida pela supervalorização do real em relação ao dólar.

RELAÇÕES BILATERAIS É um começo promissor. O Brasil e os EUA precisam enfrentar um trabalho duro e negociações difíceis para que uma relação mais balanceada ocorra. Mas, no geral, eu penso que há uma imensa boa vontade da opinião pública norte-americana em relação ao Brasil. Uma excessiva concentração no mercado e nas negociações comerciais não é o quadro que as pessoas precisam tirar dessa relação. A realidade é muito mais ampla e mais robusta que isso. Uma nova relação envolve uma imensa gama de pessoas, instituições e interesses, da música ao cinema, passando por turismo, pesquisa acadêmica, negócios e política.

MOMENTO POLÍTICO Os problemas não cessarão de uma hora para outra. As consequências econômicas da crise no Japão estão apenas começando e serão graves. Há uma revolução e uma contrarrevolução em andamento no Oriente Médio, que potencialmente terá profundo impacto sobre a economia mundial, sobre o mercado e os preços do petróleo. Sem mencionar as alianças duradouras entre o Ocidente ¿ os EUA, em particular ¿ e as monarquias autocratas da Arábia Saudita e do Golfo Pérsico. As crises na Líbia e no Barein continuarão a piorar e não podem ser facilmente contidas ou resolvidas. A Europa e os Estados Unidos, enquanto isso, ainda enfrentam imensos problemas em resolver sua situação financeira. Muitas das economias desenvolvidas estão se esforçando para cortar deficits do governo e para promover o crescimento econômico. Em face dos imensos problemas na agenda de Obama, Dilma tem uma perspectiva muito melhor.

DIFÍCIL MUDANÇA A mensagem de Obama na campanha foi poderosa. Muitos acreditavam, especialmente os jovens, que ele representava uma nova voz. Essa promessa de ¿mudança¿ também levou-o a vencer as primárias do Partido Democrata contra a formidável Hillary Clinton. A verdade é que Barack Obama tinha limitada experiência em Washington. Faltou-lhe tato para lidar com a batalha diária dentro do sistema político norte-americano. O Partido Republicano inicialmente se opôs a qualquer medida que ele tomasse. Obama foi forçado a dedicar uma grande quantidade de capital político para levar adiante a reforma do sistema de saúde. Precisou enfrentar as consequências da grande crise financeira. Mas, para gerir sua política econômica, voltou-se para muitos daqueles observadores independentes considerados como a causa do problema. Timothy Geithner, secretário do Tesouro, por exemplo, era o presidente do New York Federal Reserve Bank ¿ um dos mais importantes componentes do Banco Central dos EUA ¿ durante o derretimento financeiro. Lawrence Summers, ex-presidente da Universidade de Harvard, tinha servido anteriormente como secretário do Tesouro no governo Bill Clinton, quando muitas das restrições impostas sobre os bancos por Franklin Roosevelt na década de 1930, como resultado da Grande Depressão, foram enfraquecidas ou removidas. Sim, Obama prometeu a mudança. Mas fazê-la tem sido muito problemático.

OPINIÃO PÚBLICA A popularidade de Obama tem permanecido estável, no patamar dos 51%, comparado aos 53% em 2009. Seu índice de desaprovação também se estabilizou ¿ 45% em 2010 contra 43% em 2009. De qualquer modo, isso representa uma dramática mudança em relação à pesquisa realizada imediatamente após sua eleição, em 2009, quando 68% dos norte-americanos o aprovaram e apenas 25% o rejeitaram. A população está muito preocupada com a habilidade do governo Obama de trabalhar, e aqueles que são pessimistas já somam 72%. O público americano tem oscilado dramaticamente contra compromissos externos da Casa Branca. Pelo menos 64% dos cidadãos, por exemplo, pensam que a guerra no Afeganistão não vale a pena.